segunda-feira, 25 de abril de 2011

Debate Violência Contra as Mulheres



Debate sobre a violência contra as mulheres


Gerhard Erich Boehme


Nota: Esta mensagem foi inicialmente direcionada ao Deputado Mauro Moraes (e-mail mauromoraes@mauromoraes.com.br), que se tem destacado na área da Segurança Pública e da Justiça, fato raro, quando temos políticos somente gerindo ou mesmo lembrando destes temas quando em campanha. Como o texto apresenta assuntos polêmicos, com os quais você poderá não concordar, ou que veja como necessário acrescentar informações ou dados que julgar importante, como as realizadas em sua cidade ou bairro da Capital, peço que envie para um dos endereços acima e com cópia ao Deputado a sua contribuição. A questão é que vivemos uma triste realidade e ela passa a ser mais triste ainda quando não nos damos conta de que recursos escassos, como os púbicos, devem ser alocados com competência. E mais importante que isso, o processo deve ser bem analisado para que haja a celeridade e não torne a mulher ainda mais uma vez vítima, não apenas no lar, mas também refém da qualidade do serviço público.



Prezado Sr. Deputado Mauro Moraes,

tenho acompanhado seu empenho frente às questões da justiça e da segurança pública, que como sabemos exige de todos uma compreensão clara das limitações, em especial o descaso com que entidades públicas gerenciam a questão neste nosso vasto Brasil. A começar pela confusão entre a justiça e a prevenção, muitos de forma irresponsável se posicionando pela unificação das polícias, pela desmilitarização e o que é mais grave, propondo ações de combate aos criminosos.

Entendo como irresponsável por diversas razões, dentre elas destaco:

i.                   A unificação irá promover a centralização do poder e a consequente corrupção dela decorrente – não podemos desconsiderar que as polícias são instrumentos do poder de coerção do Estado, assim como a tributação, e portanto são muitas vezes mal vistas quando não são disponibilizados recursos adequados;
ii.                O risco com desmilitarização das Brigadas ou Polícias Militares, quando se pode ter a perda dos valores que lhe são próprias, em especial a ordem, disciplina e eficácia;
iii.              Com a integração das polícias deixamos de ter a pluralidade dos órgãos policiais voltados à segurança, pois a pluralidade retira sua força de pressão interna, já que, como temos, separadas se estabelece um sistema de vasos comunicantes que permite um melhor sigilo das investigações e uma barreira eficaz à corrupção, sempre possível e temível num serviço policial;
iv.              Evita-se a sobreposição de processos voltados à justiça - os realizados pela polícia judiciária -  com os processos de ordem pública e de prevenção, que são subsidiários ao cidadão e à iniciativa privada.


A prevenção está no campo em que o Estado entra com o papel subsidiário, pois a prevenção ao crime é de atribuição inicial do cidadão – começa com ele colocando a tranca na porta de casa, educando seus filhos de forma exemplar, etc. e a prevenção tem sua atuação mais forte no campo privado, como junto às famílias e empresas, onde temos a atuação das entidades de segurança patrimonial, vigilância comunitária, escolta, proteção a executivos, etc. E na impossibilidade destes agentes atuarem ou quando não é interessante que a iniciativa privada atue, deve entrar o Estado, o que deve ocorrer subsidiariamente, com destaque a participação comunitária através dos chamados CONSEG - Conselhos Comunitários de Segurança, para os quais, no meu entender, deveria contemplar um Guia para sua formação, implementação e manutenção e assim os CONSEGs serem certificados segundo a conformidade com os requisitos da ABNT NBR ISO 9001:2008. A prevenção, esta realizada pela Brigada Militar ou Polícia Militar, além da ordem pública, também deve realizar o policiamento ostensivo e assim assegurar a proteção ao cidadão, a sua vida, liberdade e seu patrimônio.

A atuação do Estado através das Guardas Municipais e da Brigada ou Polícia Militar é subsidiária e assim deve ser, mas cabe a sociedade atuar em todas as frentes não contra o crime, mas na prevenção ao crime e neste ponto passa a ser fundamental entendermos as falhas, os erros e vícios  de nossa sociedade que estão concorrendo para a escalada da violência, que assim leva o Brasil a ocupar as primeiras posições no mundo como um dos países mais violentos, sem contar a perda de recursos, que segundo o IPEA, isto subestimado, representa 5% do PIB, segundo o Banco Mundial 7,5% e eu estimo seguramente em mais de 10%. Uma prova disso é como a violência afasta o turista de um Brasil com enorme potencial.
Uma delas é a perda do direito de defesa, que retira responsabilidades do cidadão e as transfere ao Estado, que infelizmente se mostra incompetente.

As principais causas da violência são decorrentes:
1.       da discriminação espacial (veja textos anexos sobre favella e a escalada da violência);
2.       do baixo investimento, baixa qualidade e falhas na gestão pública da educação fundamental;
3.       da pouca valorização da família dentro da sociedade brasileira – em muitos Estados brasileiros a grande maioria tem hoje as famílias sustentadas por mulheres, sendo a Bahia o caso mais triste, pois supera 60% dos lares – desconsidera-se lá a paternidade responsável, uma sociedade formada por homens que não honram as calças que vestem;
4.       da condução política-ideológica de nossa política externa que privilegiou o narcotráfico, estas decorrentes do apoio e submissão do Brasil ao Foro San Pablo (Veja as perguntas que deveríamos ter feito aos candidatos no texto anexo);
5.       vulgarização da violência, em especial junto a mídia devido a programas policiais ou documentários fora do horário e os desenhos animados e programas infantis que apresentam normalmente a violência como tema central, os quais funcionam no Brasil como babá eletrônica;
6.       da falta do entendimento, valorização e recursos às polícias judiciárias e àquelas que se dedicam à prevenção ao crime e a ordem pública, a remuneração de seus profissionais em especial.

E é bom que se diga que a escalada da violência não tem como causa a pobreza ou as diferenças de classes como querem nos fazer acreditar, os ideologicamente estressados em especial, pois assim dito justifica tão somente a desresponsabilização por parte do poder público, ou melhor, de toda a sociedade e passa a atribuir aos mais pobres a perda de valores, o que é obviamente falso. Assim nos afastamos das causas que levam a violência, a discriminação espacial principalmente.

Esta argumentação acima seguramente não invalida a questão de que os mais pobres ficam mais vulneráveis frente à violência, principalmente devido à discriminação espacial, o que é uma verdade. Neste ponto é importante a leitura dos textos em anexo, em especial para entendermos a questão da discriminação espacial, esta sim que se faz presente em nossa sociedade e necessita ser combatida.
Tivemos um presidente que foi irresponsável dividindo a sociedade segundo o sabor das etnias da qual descendemos, o fez buscando apoio político, mas deixou um triste legado.

Outra questão é o crime cometido ou sendo articulado, quando se requer a atuação do Estado, no sentido de se fazer justiça, quando se pune também para servir de referencial, o que muitas vezes é deixado de lado devido a “Síndrome do coitadinho” que é própria do brasileiro. A polícia judiciária (Polícia Federal, Polícia Civil e Polícia Técnica) deve exercer seu papel de forma exemplar, e esta é uma questão então pública, pois não cabe e nem se pode deixar que o cidadão venha a querer fazer justiça. Neste campo se requer a atuação forte e exemplar do Estado.
Isso não quer dizer que a justiça criminal também não possa ser privada, mas a questão é que estamos muito longe disso, a nossa sociedade teria que se livrar dos ranços ideológicos e ter muita maturidade para abraçar propostas como a de Bruce L. Benson apresentadas em seu livro “To serve and protect” (http://www.institutoliberal.org.br/revista.asp?cds=113) . Entendo que estamos muito longe disso, ainda mais quando, passados mais de 30 anos, ainda encontramos pessoas doutrinadas berrando “Abaixo a Ditadura!” e assim tomando parte de uma “democracia” que na realidade é uma oclocracia e não se dão conta disso.

As Guardas Municipais, a Polícia Militar ou Brigada Militar, estas atuam subsidiariamente no campo da prevenção e devem observar o princípio da subsidiariedade para sua melhor atuação. A policia judiciária (Polícia Civil, Polícia Técnica e Polícia Federal) atua no campo da justiça. Este campo é privativo da justiça, que é pública. É um bem público e assim deve ser entendido por todos nós. E neste ponto poderíamos ter uma solução similar a que foi dada ao Ministério Público, quando este saiu da esfera dos executivos estaduais e Federal, que normalmente relegam funções de Estado e privilegiam o clientelismo político, com seu capitalismo de comparsas e seu socialismo de privilegiados, longe das leis de mercado e do compromissos com os bens e serviços públicos.


"Bens e serviços públicos têm como característica essencial a impossibilidade de limitar o seu uso àqueles que pagam por ele ou a impossibilidade de limitar o acesso a eles através de restrições seletivas, com uma única exceção eticamente aceitável: o privilégio ou benefício dado aos portadores de  deficiência física ou mental, incluindo as  advindas com a idade ou aquelas resultantes de sequelas de acidentes ou fruto da violência." (Gerhard Erich Boehme)


Neste texto para o debate trato da questão do descaso frente a violência contra as mulheres e é neste sentido que solicito o empenho do Deputado, pois a  Lei 11.340/2006, Lei Maria da Penha - LMP, a lei de combate à violência contra a mulher, é defendida como uma lei que trouxe  grandes avanços, mas é uma lei que ainda não pegou ou que enfrenta muita resistência, ainda mais em uma sociedade machista como a brasileira.

Para outros ainda constitui um entrave devido aos erros na sua concepção e falta de recursos apropriados à sua consecução. Criou-se uma dicotomia e ela tem impactos no trabalho policial, principalmente no trabalho pericial, mas mais que isso, a sua eficácia depende de um efetivo trabalho pericial, não apenas do Médico Legista, mas também do Perito Criminal e neste sentido se fazem necessárias orientações na formulação de quesitos específicos, pois os manuais da Polícia Judiciária, muito embora em alguns estados tenham sido editados após a referida lei, não contemplam orientações para a formulação dos quesitos recomendados para os exames de locais onde houve a violência doméstica. O presente texto visa abordar esta dicotomia e apresentar quesitos que possam servir de ponto de partida para um amplo debate no sentido de recomendar os quesitos necessários e cobrar das autoridades policiais a formulação clara, objetiva e detalhada de tais quesitos.

Acaso o senhor já se deu conta de como é requisitado o trabalho pericial? Infelizmente ou raramente a autoridade policial formula quesitos que venham a orientar o trabalho da polícia técnica visando sua eficácia. Muito embora as provas materiais sejam as determinantes para se fazer punir, como também para inocentar. Não seria o caso do senhor verificar como esta atividade é feita e como pode ser melhorada no Paraná? Acredito que este é um ponto importante para podermos melhorar a segurança pública, em especial no seu ponto mais frágil, o da violência contra as mulheres, pois teremos assim melhores provas materiais, e com elas a certeza de diminuirmos significativamente impunidade.


Recomendo que visite algumas Delegacias, tanto da Capital quando do interior, e veja como as denuncias de violência contra as mulheres é apresentada, como a vítima é ouvida, como é o trabalho interno nas Delegacias e como o trabalho pericial é requisitado. Veja se é adequadamente orientado. Acompanhe o “passo-a-passo” desde apresentação da denúncia e elaboração do "B.O.", até a realização dos exames periciais.


1.      A realidade atual frente a Lei Maria da Penha (LMP)

Com a nova lei muitas mudanças ocorreram, a começar pelo fato de acabar com o calvário das mulheres que, depois de registrar queixa na polícia, precisavam ir para as filas da defensoria para só então conseguir, por exemplo, afastar o agressor da casa e obter alimentos, o que invariavelmente dava continuidade à violência. Com a Lei Maria da Penha - LMP se criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal e da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher. A referida lei dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal e dá outras providências.

Com ela agora, registrada a ocorrência perante a autoridade policial, a vítima é ouvida, sendo tomada a termo a representação. A polícia judiciária tem que lhe garantir proteção e acompanhá-la ao hospital ou posto de saúde e para submeter-se ao exame de corpo de delito (Médico Legista). Quando aplicável, se faz necessário ainda o exame pericial do local dos fatos onde se deu a violência e o exame dos materiais relacionados aos fatos, incluindo as vestimentas que venham a evidenciar a violência. A autoridade policial deve fornecer transporte para lugar seguro após a retirada de seus pertences de casa. Ao ser informada de seus direitos, requerendo a mulher a aplicação de alguma medida protetiva, o expediente deve ser encaminhado à justiça no prazo de 48 horas.

Outra questão polêmica com o advento da nova lei são as decisões conflitantes  do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que versam sobre em que fase pode ocorrer a desistência da representação. Esta é uma questão que não deveria deixar dúvidas, segundo especialistas este impaasse mostra a incompetência do Judiciário.

A dicotomia se dá entre os que a defendem, até mesmo de forma veemente, e os que os que entendem que a referida lei não se fazia necessária, pois a legislação existente já assegurava a devida proteção à mulher, a qual não era aplicada, principalmente por falta de recursos e uma legislação no seu todo notadamente conflitante e dissociada da realidade, a qual concorre para a impunidade criminal no Brasil. Em especial a decorrente da Síndrome do Preso Político da qual nossa Constituição ficou refém.

Outra importante justificativa é alegada quanto ao fato dela ofender dispositivos constitucionais, em especial os que asseguram a igualdade de todos perante a lei e também pelo fato dela colocar o Estado como agente de coerção acima de seus limites, não observando o princípio da subsidiariedade, quando invade o relacionamento íntimo de um casal ou a ele juridicamente comparado. Na irresponsabilidade o tema passa então a ser motivo de piada, como a de se ter a Lei “João da Lapa”, em contraposição à Lei Maria da Penha - LMP.

Soma-se aos erros desta dicotomia entre pontos de vista o fato de que desde a aprovação da lei o Governo, principalmente o Federal, cortou verbas de assistência às mulheres e as vítimas de violência não contam com uma efetiva proteção. Faltam delegacias de mulheres, casas abrigo, atendimento jurídico e psicológico e psiquiátrico adequados. E as polícias judiciárias não contarem com recursos necessários para fazer frente a estas novas atribuições, as que se somaram às atribuições até então existentes, onde a falta de recursos tem sido uma constante face ao descaso de nossos Governadores e Presidente, uma vez que a polícia judiciária no Brasil não tem sido função de Estado, mas dos políticos de plantão. Mas o que esperar se nem mesmo a nossa sociedade entende o verdadeiro papel que cabe à polícia judiciária, como apresentei inicialmente.

A questão que se coloca de fato é que nenhuma lei é suficiente para resolver um problema estrutural. A esta se soma uma realidade onde o machismo se faz presente.

A Lei Maria da Penha – LMP é uma lei que reconhecidamente já nasceu incompleta e insuficiente e até com pouca aplicabilidade porque não prevê recursos adequados para sua implementação, também não pune devidamente os agressores e não prevê construção de casas-abrigo para as mulheres. Se compararmos a realidade anterior é possível dizer que houve uma importante adequação dos crimes contra a violência à mulher que não existiam antes da Maria da Penha - LMP. Agora, se for passada uma régua, e olharmos as estatísticas, poderemos ver que, de fato a Lei não está sendo aplicada e mesmo que fosse seria insuficiente. Reconhece-se entre os especialistas no tema de que ela necessita ser revisada e mesmo ampliada. Afinal, a violência produz entre as mulheres uma triste realidade.

Sob esta ótica, criou-se mais uma lei que praticamente não pode ser cumprida. Como é dito no Brasil: “Mais uma lei que não pegou”. Que como a jabuticaba, a saúva e o descaso com a educação fundamental são próprias dos brasileiros, estes mais afetos a dar as costas ao Brasil, como bem deixo claro no texto anexo.
Outro problema que é apresentado, principalmente pelas mulheres, é a interpretação machista que algumas vezes é feita da lei, como no caso de Elisa Samúdio, onde a juíza que a atendeu interpretou que a lei não se aplicaria ao caso dela, pois se tratava de uma relação eventual. A realidade é que a lei deve proteger a todas as mulheres que a ela recorrerem, mas isso não ocorre, o que resulta ainda em uma triste realidade, muito embora apresente evolução.
Segundo estudos e pesquisa publicado em 21/02/2011 pelo SESC¹ e pela Fundação Perceu Abramo, os dados revelam que 1,3 milhões de brasileiras apanham dentro de casa a cada ano. Por dia, são mais de 3,5 mil agressões que deixam marcas, cortes ou fraturas, sem levar em conta a questão psicológica e os profundos traumas acarretados por situação tão vexatória. O estudo mostra ainda que 2,7 milhões de mulheres levaram tapas, empurrões e apertões, nos 12 meses anteriores à pesquisa. E ainda segundo informações dos pesquisadores existe uma grande possibilidade de dedução de que o número de homens que admitem agredir sua parceira está subestimado, aumentando ainda mais o drama dessas mulheres. Consta no relatório, que metade conhece alguém que bate na companheira; 48% conhecem ou são amigos de alguém que bateu em mulher, e 8% admitem ter batido em uma mulher. E este quadro é muito mais trágico, pois entre as causas de morte o número de homicídios de mulheres dentro de casa é o que lidera as estatísticas.

A Lei Maria da Penha - LMP, como marco de punição e referencia contra a violência doméstica, demonstra que a partir dela, houve redução no número de brasileiras agredidas. Há dez anos, era mais de 2 milhões de mulheres agredidas a cada ano, com a promulgação da lei, mas ainda assim os números assustam.
Outro entrave que deve ser reconhecido é de que há muita demora em efetivar a proteção à mulher. O caso de Maria Islaine foi emblemático. A cabeleireira denunciou seu ex-marido 8 vezes, mas isto não o impediu de assassiná-la. Defendemos a rápida proteção da mulher.

De outro lado, além de afastar o agressor da mulher, os méritos da lei não são somente esses. A vítima sempre estará acompanhada de defensor. A desistência da representação só pode ser feita perante o juiz em audiência designada para tal fim e com a presença do Ministério Público. Mas esta não é uma questão fechada ainda, o Judiciário patina em definir esta questão. Uma prova de idiotia, pois deixa-se de considerar a responsabilidade individual como ponto central para se colocar o Estado como “todo protetor”.  Com a nova lei foi criada mais uma hipótese de prisão preventiva, sempre que o agressor descumprir alguma medida protetiva concedida à vítima.
Outra vantagem é de que a pena pela violência praticada deixa de ser um dos grandes vexames da jurisprudência nacional, como quando pode ser aplicada a entrega de cestas básicas ou o pagamento de multa a título de condenação, o que com a nova legislação deixou de ser possível nos casos de violência contra as mulheres.
Mas certamente o grande ganho foi a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. De forma enfática foi afastada a aplicação da Lei dos Juizados Especiais, deixando muito clara a repulsa à forma de como a violência vinha sendo tratada – e mal tratada – pela justiça. Além das ameaças à vítima para desistir da representação, eram forçados acordos e a pena, quando aplicada, era a entrega de cestas básicas. A realidade era que a prática de violência contra a mulher passava impune na nossa sociedade.
Seguramente que a lei, na forma com que foi redigida, ao sabor dos chamados movimentos sociais, mais próximos de uma oclocracia que de uma verdadeira democracia, requer que a nova lei seja revisada para que então a sociedade brasileira possa de fato reconhecê-la como um ganho, aproximando-a de um instrumento que traga de fato eficácia e não seja mais um entrave à nossa justiça por força de fatores como sobreposição legal, com seus conflitos inerentes ou custos que são proibitivos à sociedade.

Vence a oclocracia quando os desejos e a ilusão se sobrepõem à razão e a capacidade dela efetivamente poder produzir resultados. E a revisão passa a ser fundamental quando a sociedade brasileira de fato vier a entender a importância da observação do princípio da subsidiariedade, o qual é fundamental para termos uma sociedade justa e que promova o desenvolvimento e melhor qualidade de vida. Uma sociedade justa em que a responsabilidade individual venha antes de direitos ou mesmo falsos direitos, muitas vezes inseridos na legislação ao sabor dos movimentos das massas em prejuízo dos direitos humanos e do bolso do contribuinte.

Outra grande falha na nova lei é que não foi determinada a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e impostos prazos para sua instalação.
Em face da dificuldade da justiça em criar esses juizados, em especial devido à falta de recursos, o fato é que desde a sua entrada em vigor foram instalados juizados em pouquíssimos estados e ainda assim, só nas capitais, o que também concorre para desacreditar a lei. E assim houve o deslocamento da competência para as varas criminais e não para as varas de família.
O resultado está sendo desastroso.  De um lado comprometendo ainda mais a nossa realidade face aos crimes contra a vida, a liberdade e o patrimônio, sem contar os crimes de direitos difusos, como os ambientais.
Não é sem razão que o Brasil está se posicionando entre um dos países mais violentos do mundo, somente sendo superado por alguns poucos na região do Caribe, como a Venezuela. E esta violência também acaba concorrendo para a escalada da violência doméstica.
A realidade é que os juízes acabam dando preferência aos processos de réus presos e estão mais afeitos a julgar ações criminais, não estão muitas vezes qualificados para aplicar medidas protetivas, que tem natureza familiar ou com os recursos necessários.
Diante desse quadro, é forçoso reconhecer que a violência doméstica está em situação muito pior do que estava antes do advento da lei que veio para coibi-la. A responsabilidade é do Poder Judiciário que continua condenando à invisibilidade a agressão contra a mulher, como se fosse uma questão privada, onde a justiça não precisa pôr a colher, o que de certa forma é correto, pois assim nos aproximamos do entendimento do principio da subsidiariedade, o qual e fundamental para se construir uma nação justa.
O triste deste quadro é que, embora seja uma legislação necessária, traz consigo custos, os quais devem ser absorvidos pela sociedade através de impostos, e necessidade de se reconhecer como fundamental e que promova as mudanças em nossa sociedade.

2.      O advento da Lei Maria da Penha - LMP

A Lei 11.340, a chamada Lei Maria da Penha - LMP, que cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar e garantir a integridade física, psíquica, sexual, moral e patrimonial está sendo alvo das mais ácidas críticas e dentre elas o fato de que o trabalho pericial não se faz presente ou é deficiente no que se refere ao exame dos locais de crime. 

Vale observar que o texto da Lei Maria da Penha - LMP deixa claro quanto ao trabalho pericial, pois além de citar em seu texto o Código Penal e o Código de Processo Penal, ter promovido alterações em ambos, apresenta em seu Artigo 12.  a obrigatoriedade de que em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, e sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal, colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias e determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida, o que é de responsabilidade do IML  - Instituto Médico Legal quando então emite laudo circunstanciado referindo-se às lesões, quando não a sua causa mortis, e requisitar outros exames periciais necessários, o que pode incluir o exame do local, quando aplicável, o que normalmente é.

Vale ressaltar que a partir da vigência da nova lei, a violência doméstica não guarda correspondência com quaisquer tipos penais. Primeiro é identificado o agir que configura violência doméstica ou familiar contra a mulher (art. 5º): qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.  Depois são definidos os espaços onde o agir configura violência doméstica (art. 5ª, incs. I, II e III): no âmbito da unidade doméstica, da família e em qualquer relação de afeto. E finalmente, de modo didático e bastante minucioso, são descritas as condutas que configuram a violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. As formas de violência elencadas deixam evidente a ausência de conteúdo exclusivamente criminal no agir do agressor. A simples leitura das hipóteses previstas em lei mostra que nem todas as ações que configuram violência doméstica constituem delitos. Além do mais, as ações descritas, para configurarem violência doméstica, precisam ser perpetradas no âmbito da unidade doméstica ou familiar ou em qualquer relação íntima de afeto.

Assim, é possível afirmar que a Lei Maria da Penha - LMP considera violência doméstica as ações que descreve (art. 7º) quando levadas a efeito no âmbito das relações familiares ou afetivas (art. 5). Estas condutas, no entanto, mesmo que sejam reconhecidas como violência doméstica, nem por isso configuram crimes que desencadeiam uma ação penal.

De qualquer modo, mesmo não havendo crime, mas tomando conhecimento a autoridade policial da prática de violência doméstica, deverá tomar as providências determinadas na lei (art. 11): garantir proteção à vítima, encaminhá-la a atendimento médico, conduzi-la a local seguro ou acompanhá-la para retirar seus pertences. Além disso, deverá a polícia proceder ao registro da ocorrência, tomar por termo a representação e remeter a juízo expediente quando a vítima solicitar alguma medida protetiva (art. 12).

Todas estas providências devem ser tomadas diante da denúncia da prática de violência doméstica, ainda que – cabe repetir – o agir do agressor não constitua infração penal que justifique a instauração do inquérito policial. Dita circunstância, no entanto, não afasta o dever da delegacia de polícia tomar as providências determinadas na lei. Isso porque, é a violência doméstica que autoriza a adoção de medidas protetivas, e não exclusivamente o cometimento de algum crime.

Este é o verdadeiro alcance da Lei Maria da Penha - LMP. Conceitua a violência doméstica divorciada da prática delitiva e não inibe a concessão das medidas protetivas tanto por parte da autoridade policial como pelo juiz.

Mas há outros avanços significativos. Cabe à autoridade policial, ao proceder o registro da ocorrência, tomar por termo a representação da vítima contra o ofendido. Quando houver necessidade da concessão de medidas protetivas de urgência, o expediente é remetido a juízo no prazo de 48 horas. Independentemente disso, processar-se-á a instauração do inquérito policial a ser encaminhado à Justiça em 10 dias.

Ao juiz cabe adotar não só as medidas requeridas pela vítima ou pelo Ministério Público, também lhe é facultado agir de ofício. Assim, pode determinar o afastamento do agressor e a recondução da ofendida e seus dependentes ao lar; impedir que ele se aproxime da casa, fixando limite mínimo de distância; vedar que se comunique com a família; suspender visitas; encaminhar a mulher e os filhos a abrigos seguros; fixar alimentos provisórios ou provisionais. Além disso, pode adotar medidas outras, como a restituição de bens indevidamente subtraídos da vítima ou danificados, suspender procuração outorgada ao agressor e proibir temporariamente a venda ou locação de bens comuns. Também o magistrado dispõe da prerrogativa de determinar a inclusão da vítima em programas assistenciais. Quando ela for servidora pública, tem acesso prioritário à remoção ou, se trabalhar na iniciativa privada, é assegurada a manutenção do vínculo empregatício, por até seis meses, se for necessário seu afastamento do local de trabalho. E este é mais um ônus que a sociedade não tem capacidade de assumir.

Ainda dentro desta dicotomia, certamente o maior de todos os avanços foi a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM), com competência cível e criminal.  Claro que o ideal seria que em todas as comarcas fosse instalado um JVDFM e que o juiz, o promotor, o defensor e os servidores fossem capacitados para atuar nessas varas e contassem com uma equipe de atendimento multidisciplinar. Mas, diante da realidade brasileira não há condições de promover o imediato funcionamento dos juizados com essa estrutura em todos os cantos deste país. Considerando o tamanho do bolso do contribuinte e a realidade da escalada da violência contra a vida, à liberdade e o patrimônio, seguramente teremos que pensar em uma solução que de fato seja viável. Mas isso, infelizmente, não tem sido a preocupação de nossos legisladores.

Uma coisa é certa, a violência doméstica está fora do âmbito dos Juizados Especiais, e estes não poderão mais apreciar tal matéria. Esta alteração de competência justifica-se, porquanto de modo expresso – e em boa hora – foi afastada a aplicação da Lei 9.099/95 quando o crime é praticado com violência doméstica e familiar contra a mulher.

Muito se tem discutido se a lesão corporal cometida no âmbito doméstico, persiste condicionada à representação, uma vez a Lei dos Juizados Especiais considerou de pequeno potencial ofensivo o delito de lesão leve ou culposa (LJE, art. 88). A doutrina não tem posição uniforme e a jurisprudência vem adotando soluções díspares, o que mais uma vez concorre para a perda da credibilidade da Lei.

De primeiro cabe atentar que o dispositivo que condicionada o delito de lesões corporais à representação, não se encontra no bojo da Lei, mas entre as disposições finais, onde se situam regras que refogem ao tema objeto da lei. Assim, excluída a incidência da Lei dos Juizados Especiais em sede de violência doméstica, tal não implica no afastamento de disposições de natureza outra que acabou por alterar dispositivo do Código Penal, ainda que não lhe tenha emprestado nova redação.

O propósito da Lei Maria da Penha - LMP é dar um basta à violência doméstica, o que nem sempre é alcançado ao perpetuar-se a situação de conflito mediante a instauração de processo criminal, quando já solvidas todas as questões que lhe serviam de causa. Ao depois, subtrair a possibilidade da desistência da representação vai inibir a denúncia por parte da vítima que, ao registrar a ocorrência, não deseja nem se separar do agressor e nem que ele acabe na cadeia. Ela vai a busca de ajuda para que a violência cesse. Obtido este resultado no incidente de aplicação de medida protetiva, nada justifica o prosseguimento da ação penal que se desencadeou quando do registro da ocorrência.

Fora disso, de modo expresso, há referência na Lei Maria da Penha - LMP à representação da vítima (LMP, art. 12) e à possibilidade de renúncia à representação em juízo (LMP, art. 16). Assim, é urgente reconhecer que, logrando o magistrado compor de forma consensual  as causas geradoras da violência, bem como assegurar à vítima a possibilidade de desistir da representação que havia formalizado na polícia. Para evitar a repetição das desastrosas situações a que as mulheres foram submetidas nos juizados especiais, agora para desistir da representação deve comparecer perante o juiz e o Ministério Público, acompanhada de advogado.

A representação é feita quando do registro da ocorrência, que enseja o desencadeamento do inquérito policial. No entanto, havendo composição perante o juiz, e solvendo-se a situação de conflito entre as partes, impositivo reconhecer a possibilidade de obstar o prosseguimento da demanda penal. Composto o conflito, imperioso garantir à vítima o direito de desistir, pois tal lhe confere poder de barganha.

A questão é que pela vez primeira o agressor vê a vítima com mais poder do que ele, pois está nas mãos dela a possibilidade dele responder ou não a processo criminal. Claro que este empoderamento da mulher é importante, pois, temendo o prosseguimento da ação o agressor pode fazer concessões à mulher e aos filhos, quer quanto ao valor dos alimentos, quer quanto a partilha de bens.

3.      A criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher

Apesar destas profundas mudanças, o que se observa na prática é que infelizmente há que se reconhecer que os avanços foram pequenos, até porque a aplicação da lei, em face de sua natureza,  exige a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher. Só um juiz especializado pode atentar à dúplice natureza da violência doméstica, a exigir providências muito mais no âmbito do direito das famílias do que no âmbito criminal.

Assim, se a atribuição da competência às Varas Criminais buscou marcar o repúdio à forma de como a violência doméstica vinha sendo tratada no âmbito dos Juizados Especiais, a delegação das demandas às varas criminais não lhes concedeu melhor tratamento.

4.      O trabalho pericial

Com a Lei Maria da Penha - LMP se padroniza atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica, mas deixa uma lacuna importante, senão fundamental. Esqueceram que para se fazer justiça é fundamental termos boas provas materiais. A questão que coloco em debate é a Lei Maria da Penha - LMP e o trabalho pericial, dos Peritos Criminais.





"O sucesso de uma organização não é alcançado por meio de uma brilhante estratégia. É alcançado por meio de uma brilhante execução da estratégia. Na verdade, a execução da estratégia é mais importante do que a estratégia em si." (Robert Kaplan & David Norton)



A questão é que os legisladores se voltaram, como lhes é próprio, a querer impressionar a sociedade com uma nova lei, a questão é que a competência deles é limitada, pois desconsideram o colocar em curso, com todas as deficiência que temos, em especial a baixa remuneração que se observa junto a polícia judiciária e os recursos que lhes são escassos.

Se temos hoje de um lado muito a comemorar, porém muito a fazer. Quatro anos após a sanção da Lei Maria da Penha - LMP (Lei nº 11.340/2006), o Ministério da Justiça e a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) lançaram no dia 13 de setembro de 2010, em Brasília uma nova edição das normas técnicas para a padronização de procedimentos nas delegacias especializadas de atendimento à mulher. Mas com lacunas.

A norma técnica revisada tenta incorporar os procedimentos de atendimento, encaminhamento e investigação estabelecidos na lei, mas não contempla orientações relativas, pr exemplo, ao trabalho das Polícias Técnicas ou Polícias Técnico-científicas.

Há no Brasil pouco mais de 500 delegacias especializadas de atendimento às mulheres. A primeira surgiu em São Paulo há 25 anos. Orientações e denúncias quanto às agressões físicas e qualquer forma de violência contra as mulheres podem ser feitas junto à Central de Atendimento à Mulher ou através do Ligue 180.

A Lei 11.340/2006, Lei Maria da Penha - LMP foi recepcionada pelo Código Penal, assim como pelo Código de Processo Penal. A questão que colocamos é um vácuo existente, ou um potencial de melhoria, no que se refere ao trabalho pericial, tanto por parte dos Peritos Criminais, como dos Médicos Legistas.  No caso dos Legistas a situação, a nosso ver, pouco mudou, pois os requisitos de violência física são aplicáveis.

Ocorre, porém que as requisições de exames emitidas pela autoridade policial (Delegados de Polícia), estas encaminhadas aos Peritos Criminais, aos Institutos de Criminalística, são na sua quase totalidade, genéricas no que se refere aos quesitos, procedimento comum neste nosso vasto Brasil, sendo comum a autoridade policial se restringir a solicitar como objetivo da perícia: "Exame do local" ou somente "Local”, ficando a cargo do Perito Criminal e de sua competência, ou mesmo falta dela, o julgamento do que deve ser examinado, estudado e relatado. E vale lembrar que competência deve ser sempre entendida como a conjugação da educação (formação acadêmica), formação profissional – dentro de uma realidade de uma formação continuada, habilidade e experiência, longe de uma realidade onde deveríamos ter algo próximo ou mesmo melhor que as chamadas Universidades Corporativas.

A educação neste sentido é falha, somente agora o tema é trazido aos bancos universitários, a formação profissional é incipiente, nos cursos de formação observa-se boas iniciativas, mas seguramente muito falta em termos de habilidade e principalmente experiência.

Sabemos que as provas materiais nos casos criminais são fundamentais e prevalecem à prova testemunhal. Mas não fazemos bom uso deste recurso fundamental para justiça, na área criminal. Ocorre que os Manuais das Polícias Judiciárias, na sua quase totalidade são anteriores à aprovação e entrada em vigor da  Lei 11.340/2006, Lei Maria da Penha - LMP e não contemplam orientações para o uso de quesitos específicos, como nos demais crimes, o mesmo se verifica também na área ambiental na maioria dos casos, em que pese a Lei de Crimes Ambientais ter sido aprovada em 1995. A realidade é de que não há a orientação sobre os quesitos mínimos adequados a estas leis.

Vale lembrar que os peritos criminais somente nas Capitais atuam através de equipes exclusivas, em parceria com os Departamentos de Homicídios e Proteção à Pessoa - DHPP, mas no geral as perícias são realizadas por uma equipe, normalmente formada por plantonistas, integradas por um Perito Criminal e um Fotógrafo Técnico-pericial, que atendem todos tipos de crimes, desde acidente de trânsito, drogas, locais de crime contra a vida e o patrimônio, crimes ambientais, assaltos, documentoscopia, crimes contra consumo, etc. e etc... e também os locais onde tivemos a violência contra a mulher. Sem contar que uma gama enorme de exames ligados a crimes federais são realizados pelos peritos criminais das Polícias Científicas ou Técnico-científicas, seja por delegação ou mesmo omissão.

Entendemos que um amplo debate por todos que lutaram pela aprovação e implementação em nossa sociedade da Lei Maria da Penha - LMP devem refletir sobre a importância de se adequar, caso seja necessário, mas principalmente assegurar o cumprimento do disposto no Art. 6º do Código de Processo Penal, pois a nossa realidade está muito longe de vê-la sendo cumprida, em que pese termos uma legislação infinitas vezes revisada e inicialmente elaborada em 1940.



5.      O Exame do local

Temos problemas como o fato da autoridade policial muitas vezes não ir ao local de crime e/ou da violência doméstica, ou se fazer representar, sendo o local "preservado" pela própria vítima, quando não pela Polícia Militar ou Brigada Militar e não pela Polícia Judiciária. Sendo os Peritos Criminais os que em nome da justiça, no seu sentido amplo, os primeiros, senão os únicos, a irem aos locais dos fatos, portanto não sendo observado o que consta no Art. 6º do Código de Processo Penal, a saber:

I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862 , de 28.3.1994) (Vide Lei nº 5.970 , de 1973)
Comentário: É feito pela Polícia Militar ou, como ocorre em no RS, pela Brigada Militar, ou mesmo somente pela própria vítima, que por si só, por ser a parte frágil, não tem poder coercitivo algum.  Os Peritos Criminais, infelizmente, em muitos casos são os únicos a irem nos locais de crime. Onde há maior conscientização e estrutura, temos os investigador ou o escrivão no local, representando a autoridade policial, que nos casos de violência contra a mulher podem ser especializados. Na cena do crime realizam seus exames e colhem provas materiais, para posteriormente realizarem seus estudos, elaborarem o croqui (desenho) do local e emitirem o Laudo Pericial, com as respectivas fotos.

II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862 , de 28.3.1994)
Comentário: É feito pelo Perito Criminal, que os recolhe e entrega à autoridade policial, ou na sua falta à Polícia Militar, para posterior encaminhamento à Delegacia e esta, sob uma cadeia de custódia, ao Instituto de Criminalística quando são requeridos exames.

III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;
Comentário: É feito pelo Perito Criminal, que os recolhe e entrega à autoridade policial, ou na sua falta à Polícia Militar, para posterior encaminhamento à Delegacia.
...

VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;
Comentários: O procedimento adotado é padronizado, e conforme apresentado anteriormente, mediante encaminhamento da requisição, que muitas vezes é feito por comunicação por rádio ou mensagem eletrônica ou ainda Fax. A prática não acompanhou a entrada em vigor da Lei Maria da Penha - LMP.

A Lei 11.340/2006, Lei Maria da Penha - LMP, produziu uma verdadeira revolução no combate à violência doméstica, foram criadas as DDM - Delegacias de Defesa da Mulher, os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, etc., mas temos, como foi exposta, lacuna importante.

Como objetivo deste trabalho é apresentada uma série de quesitos, os quais podem servir de ponto de partida para um amplo debate e que este leve a mudança que neste campo se faz necessária, para que a autoridade policial tenha uma quesitação mínima e que esta possa então ser amplamente divulgados, em especial nos Manuais da Polícia Judiciária. Neste sentido propomos seguintes quesitos:

a)     Qual a natureza do local examinado?
b)     Trata-se de ambiente doméstico onde reside a vitima e seu agressor? Ou: O local examinado era espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, incluindo as esporadicamente agregadas?
c)     Existiam danos? Estes foram produzidos com uso de violência?
d)     O local examinado apresentava evidências de que por ação ou omissão houve violência doméstica e familiar contra a mulher, que esta ação ou omissão tenha concorrido ou dado causa à morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial?
e)     No local havia evidências destruição parcial ou total de objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades? Quais foram os danos evidenciados e seus valores?
f)      Havia pichação ou outra forma ostensiva de termos ou imagens que viessem a configurar calúnia, difamação ou injúria?
g)     Há vestígios ou a configuração do local indica ter havido emprego de qualquer  meio para reduzir a vítima à impossibilidade de resistência ou defesa?
h)     Houve o emprego de instrumentos? Quais?
i)       Houve emprego de substância ou instrumento que não se integre ao ambiente ou local examinado?

 
6.      Conclusão

 
A nossa sociedade é de mudanças, infelizmente muitas delas são reativas e temos a agravante dos erros e acertos no uso dos recursos públicos, a começar pelo fato de desconsideramos que eles têm origem no bolso do contribuinte e que ele, o contribuinte, é múltiplas vezes penalizado, para não dizer escravizado, pois para o pagamento dos impostos o trabalhador brasileiro dedica entre 142 a 157 dias de seu trabalho. O que per si configura uma quase escravidão, ou como mencionam os historiadores, são agora “dois quintos dos infernos”.
Uma triste realidade ainda mais quando se observam os entraves às ações necessárias na esfera pública que poderiam concorrer para uma diminuição significativa da violência e melhoria da qualidade de vida.

Antes da lei nº 11.340/06, os casos de violência contra a mulher eram tratados pela Justiça como crimes de menor potencial ofensivo, os quais eram amparados na lei nº 9099/95, que determinava aos agressores penas alternativas. Após a Lei Maria da Penha - LMP, os delitos cometidos contra a mulher passaram a ser tratados de maneira diferente. E medidas emergenciais e de proteção foram essenciais para segurança das vítimas, como por exemplo, o afastamento do lar, prisão do agressor, proibição de contato com a vítima e encaminhamento delas às casas de abrigo.


A Lei Maria da Penha foi criada para conter e prevenir casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. Dentre as diversas formas de brutalidade cometida contra as mulheres estão a omissão de socorro que cause morte; lesão; sofrimento físico, sexual ou psicológico; dano moral ou patrimonial à mulher, no âmbito familiar, ou em qualquer relação íntima de afeto. Como vimos são necessários recursos adequados e ao perito criminal, como vimos, não bastam apenas recursos, mas também orientações adequadas para que o trabalho possa de fato ser eficaz, o que requer que bons quesitos sejam formulados.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Sim