quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Senadores do PT

 
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Alguns senadores do pt e a direita unidos, aprovam no Senado lei antiterrorismo que abre caminho para a criminalização dos movimentos sociais

Após mais de quatro horas de discussão em que senadores divergiram sobre a criminalização dos movimentos sociais, o Senado aprovou nesta quarta-feira (28) o projeto de lei que tipifica o crime de terrorismo no Brasil e estabelece a pena de até 24 anos de prisão em regime fechado. Foram 34 votos favoráveis e 18 contrários.
A reportagem é de Mariana Haubert, publicada no portal do jornal Folha de S. Paulo e reproduzida, com o título acima, por Viomundo, 28-10-2015.
Como o texto foi alterado pelos senadores, ele terá que ser novamente analisado pela Câmara, que já o havia aprovado no início de agosto.
O projeto define como crime de terrorismo atos que atentem contra pessoa, mediante violência ou grave ameaça, motivado por extremismo político, intolerância religiosa ou preconceito racial, étnico, de gênero ou xenófobo, com o objetivo de provocar pânico generalizado.
Considera-se ainda terrorismo por extremismo político qualquer ato que atentar gravemente contra a estabilidade do Estado Democrático, com o fim de subverter o funcionamento de suas instituições.
A principal divergência entre os senadores se deu sobre a garantia de que movimentos sociais não possam ser enquadrados na nova lei. Na Câmara, os deputados incluíram um parágrafo em que se explicitava que a norma não se aplicaria à “conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou categoria profissional”.
O dispositivo, no entanto, foi retirado da proposta pelo relator, senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), por considerar que a medida criava exceções amplas que poderiam acabar por inviabilizar a punição de crimes de terrorismo de fato. O senador argumenta que, para ser considerado um terrorista, a pessoa passará por uma definição rigorosa sobre o seu ato, considerando a definição do crime de terrorismo.
“Se depois de passar por todas essas instâncias, a pessoa for considerada terrorista, é porque terrorista será”, disse. “Manifestações políticas, manifestações pacíficas, movimentos reivindicatórios não podem ser considerados terrorismo. Mesmo ações excessivas como depredar ônibus. Isso é dano. É atentado ao patrimônio, mas não é crime de terrorismo”, completou.
Com isso, partidos mais à esquerda, como o PT, PSB, PC do B, Rede e senadores de outras legendas se posicionaram contra o projeto por considerar que ele abre brechas para a criminalização dos movimentos sociais.
“Temos concordância com o projeto originalmente apresentado pelo governo, mas este projeto que aí está para votação, em que pese meus respeitos ao senador Aloysio Nunes, certamente, não atende às preocupações que temos todos nós”, afirmou o líder do PT, senador Humberto Costa (PE).
Para ele, ficou claro durante o debate a dificuldade em se estabelecer a definição do que é o crime de terrorismo. “Nossa preocupação, como dissemos, é de que qualquer subjetividade no tratamento de um tema como este pode permitir a criminalização das lutas sociais, dos movimentos sociais e a restrição à liberdade de expressão e de organização”, completou o petista.
“O que queremos é a ressalva aos movimentos sociais. Eu não acredito que o governo da presidente Dilma Rousseff irá votar contra os movimentos sociais. É uma cilada contra a própria base social do governo. Por que essa exclusão não está sendo aceita? Esse projeto vulnerabiliza a luta social no nosso país”, afirmou Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
“Esse país está caminhando para um acirramento das relações sociais. E aprovar isso agora é inoportuno porque nós estamos passando um recado para essa sociedade, que está em mobilização, em movimento, que vai aumentar muito se nós não encontrarmos um rumo para o País, e não vamos encontrar debatendo isso agora em vez de debatermos os grandes problemas, que não é esse, nós vamos passar um recado equivocado, pelo momento”, completou o senador Cristovam Buarque (PDT-DF).
Apesar da manifestação do próprio PT, o líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral (PT-MS), encaminhou a votação a favor da aprovação do projeto.
“Se há divergências ideológicas, de posicionamento, se há decisão do PT, isso não reflete o que o governo, através dos seus ministérios trabalhou para se chegar ao relatório do senador Aloysio Nunes. As coisas tramitaram aqui dentro da nossa rotina, do nosso ritual e o governo acompanhou isso”, disse.
A divergência entre o governo e o PT levou senadores, principalmente, da oposição a fazer provocações. “A coisa está tão estranha que até na hora que a oposição tenta ajudar o governo, em uma questão que é uma exigência internacional e pode levar o nosso país a sofrer penalidades, tem dificuldades”, ironizou o líder do PSDB, Cássio Cunha Lima (PB).
“Estou aqui há 20 anos e nunca presenciei o que estou vendo aqui. O líder do partido da presidente encaminha contra uma matéria com regime de urgência. Isso estarrece o cidadão brasileiro, está uma situação de vaca não conhecer bezerro”, completou o líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE).
Sanção econômica
O projeto foi encaminhado pelo Executivo, que tem pressionado o Congresso pela aprovação do projeto por estar sujeito a sanções de órgãos internacionais como o Gafi (Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo). Por isso, a proposta tramita com urgência constitucional, o que significa que ela tranca a pauta de votações da Casa.
O Gafi exige que o Brasil adote leis com punições específicas para o financiamento do terrorismo. Desde 2010, o Brasil se comprometeu a construir uma legislação neste sentido e, recentemente, o grupo começou a pressionar o país. No início do ano, os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e da Justiça, José Eduardo Cardozo, assinaram uma carta em que o país se comprometia a definir a punição para o financiamento do crime até o fim do ano.
Na semana passada, o Gafi realizou uma das suas três reuniões anuais. O Brasil participou mas não teve um resultado concreto para apresentar. Se o país não cumprir, pode entrar em uma espécie de lista negra do órgão, o que significa um alerta para outros países de que o Brasil não é um bom lugar para se investir.
Punições
Como foi aprovado, o projeto estabelece pena de 16 a 24 anos para quem for enquadrado no crime de terrorismo. Se o ato resultar em morte, a reclusão passa a ser de 24 a 30 anos. Há ainda a previsão de agravamento da pena com o aumento de um terço do período de prisão quando o ato for praticado com o auxílio de qualquer espécie, de governo estrangeiro ou organização criminosa internacional.
Também poderá ter a pena aumentada de um terço à metade se o crime for praticado contra o presidente e vice-presidente da República, presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, presidente do Supremo Tribunal Federal, chefe de Estado ou de governo estrangeiro, chefe de missão diplomática, consular ou de organização intergovernamental.
O projeto também estabelece uma pena de 10 a 16 anos de reclusão para quem recrutar, aliciar ou organizar e aparelhar pessoas para praticarem atos de terrorismo. Quem já integra uma organização reconhecida como terrorista, ou que fornecer ou receber treinamento com o propósito de praticar tal crime também será punido.
Qualquer apologia pública a um crime terrorista ou seu autor também poderá ser punido com a reclusão de três a oito anos. A proposta estabelece ainda uma pena de 12 a 20 anos, além de pagamento de multa, para quem financiar, manter em depósito ou investir recurso, direta ou indiretamente, a indivíduo ou grupo, para obtenção de recurso para o planejamento, a preparação ou a prática do crime.
A proposta ainda equipara a ato terrorista, a prática de condutas tais como causar explosão, incêndio, inundação, desabamento, desmoronamento ou usar gás tóxico, veneno, agente químico, biológico, radiológico ou nuclear, em prédio ou local de aglomeração ou circulação de pessoas.
Quem também destruir, danificar, ou apoderar-se de aeronave, embarcação ou trem de transporte de passageiros ou de carga poderá ser incluído no crime.
Segundo o projeto, todas as punições são inafiançáveis e não podem receber graça ou anistia. O julgamento do crime de terrorismo será feito pela Justiça Federal.

Lei de terrorismo, aprovada no Senado, visa evitar protestos sociais no Brasil

Moradores da periferia queimam um ônibus para protestar contra a morte de um jovem nas mãos da polícia. Durante uma manifestação de estudantes contra o fechamento de escolas estaduais, uma estação do metrô é apedrejada. Em passeata pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff, um rapaz que vestia camiseta vermelha é agredido com tapas e pontapés. De acordo com uma lei aprovada na noite desta quarta no Senado, todos os exemplos podem ser enquadrados como atos de terrorismo, e aqueles que os praticaram estão sujeitos a penas de 16 a 24 anos. Curiosamente, o relator da matéria na Casa é Aloysio Nunes (PSDB-SP), ele mesmo tachado de terrorista quando pegou em armas na luta contra a ditadura militar no país. A matéria agora volta para a Câmara, e caso seja aprovada, segue para sanção presidencial.
A reportagem é de Gil Alessi, publicada por El País, 29-10-2015.
O projeto de lei chega num momento em que o Brasil é sacudido por protestos de toda natureza, diante do aprofundamento da crise política e econômica: de professores que se queixam do fechamento de escolas, a movimentos sociais que protestam contra o ajuste fiscal, passando pelos movimento pró e contra impeachment da presidenta Dilma.
O avanço da lei no Senado é visto por entidades de defesa dos direitos humanos como extremamente nocivo, uma vez que tipifica o crime de terrorismo de forma a possivelmente enquadrar participantes de atos de rua que depredem patrimônio público ou privado. Diversas entidades assinaram um manifesto contra a lei. De acordo com o texto divulgado, "as condutas tipificadas são todas já previstas e, por isso, puníveis, na legislação penal em vigor no Brasil". O projeto é apontado como "desnecessário, redundante e desproporcional", além de ter "o potencial de agravar de modo dramático o quadro de restrição a direitos fundamentais e de censura à expressão ideológica e política em que o Brasil já vem incorrendo".
Enquanto os parlamentares se esforçam para criminalizar protestos, o relatório As Ruas Sob Ataque, da ONG Artigo 19, aponta que quem viola direitos em manifestações não costumam ser seus participantes. O documento analisou 740 manifestações de janeiro de 2014 a julho de 2015 - contra a Copa do Mundo, por moradia, de professores entre outros -, e contabilizou 849 detenções arbitrárias e diversas violações dos direitos humanos cometidas pelo Estado. No total, sete pessoas morreram em atos realizados no período. A falta de identificação da tropa - que contraria o próprio Regulamento de Uniformes da Polícia -, a detenção preventiva, que é ilegal, e o uso indiscriminado de balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo são apenas algumas violações cometidas pela PM. A Polícia Militar de São Paulo afirmou em nota que “não existe, no ordenamento jurídico brasileiro, a prisão para averiguação”, e que atos ilegais ou “fundada suspeita” levaram a tropa a conduzir suspeitos para delegacias. Mas o documento pinta um retrato diferente.
Não são apenas com balas de borracha e bombas de gás que o Estado age de forma antidemocrática contra protestos de rua. O texto fala também sobre a ofensiva do Legislativo para restringir a ação dos manifestantes - e cita o projeto de Nunes como sendo o mais nocivo para a liberdade de expressão. Os juízes também têm sua parcela de culpa, segundo o relatório. “O poder Judiciário chancelou a postura criminalizadora dos poderes Executivo e Legislativo em relação ao direito de protesto, optando pela via da condenação criminal de manifestantes”, diz o texto. Camila Marques, coordenadora do centro de referência legal da Artigo 19, afirma que o estudo buscou analisar “não somente as violações que aconteciam na rua”, mas também a maneira “como o Estado como um todo agiu no sentido de criminalizar os manifestantes”.
“A lógica de segurança dos protestos não se voltou para a proteção e bem estar dos manifestantes e comunicadores presentes nas ruas”, diz o texto. Muito pelo contrário, “as forças de segurança se comportaram de maneira agressiva frente aos protestos, demonstrando despreparo do Estado em lidar com essa legítima forma de expressão dos sistemas democráticos”.
Se por um lado nenhuma destas denúncias contra as polícias é nova, o relatório aponta que, se as forças públicas haviam sido pegas de surpresa durante os protestos de 2013, a partir de 2014 já poderiam ter se preparado de forma adequada para lidar com as manifestações. “Houve o tempo necessário para entender o fenômeno (…) e agir no sentido de garantir os direitos de liberdade de expressão e manifestação”, afirma o relatório. Mas a resposta foi uma modernização do aparato repressivo, com o uso de armadura (apelidada de Robocop), veículos blindados municiados com canhões de água e o kettling (envelopamento) de manifestantes e jornalistas pela tropa. No envelopamento os policiais cercam toda a manifestação - especialistas afirmam que o método coloca as pessoas em risco ao confiná-las.
Em nota, a PM afirmou que é “instituição garantidora da democracia e dos direitos fundamentais”, e que sempre atua “para garantir a segurança dos próprios manifestantes”. Segundo a corporação, a técnica de envelopamento “é utilizada internacionalmente”, e foi responsável pela redução no uso de outras técnicas “potencialmente mais violentas, embora legais, como o uso de munição química e de elastômeros [bala de borracha]”.
O Ministério Público também é acusado no documento por ter encaminhado “diversos inquéritos repletos de inconsistências e ilegalidades, sem provas efetivas”. Um exemplo claro desta prática foi o caso do estudante Fábio Hideki Hirano, detido em junho de 2014 durante ato na avenida Paulista, em São Paulo, e acusado de incitação ao crime, associação criminosa, resistência, desobediência e porte de coquetel molotov. Ele ficou 45 dias preso até que um laudo pericial comprovou que ele não tinha explosivo algum: teria sido detido apenas por estar de capacete no meio do protesto.
Ponto fora da curva
Para Camila Marques, da Artigo 19, os protestos contra o Governo da presidenta Dilma Rousseff realizados este ano são um ponto fora da curva no comportamento das Polícias Militares do país. Os atos, que reuniram mais de um milhão de pessoas em dezenas de cidades, terminaram sem repressão policial. “São um tipo de manifestação distinta, que provoca reações distintas do Estado”, diz ela. A advogada afirma que estes atos tiveram um apoio institucional da Segurança Pública, “algo que não vimos, por exemplo, nos atos do Movimento Passe Livre”. De acordo com Marques, “em um caso o Estado garante a segurança dos manifestantes, no outro ele provoca as violações”.
Em São Paulo, onde houve o maior público nos atos contra a mandatária, o governador tucano Geraldo Alckmin foi acusado de incentivar os protestos e garantir sua realização. Segundo a coordenadora da ONG, as polícias militares devem sempre agir no sentido de garantir a segurança do protesto “para que ele tenha começo, meio e fim, e alcance seu objetivo político e social”. A atuação nos atos contra Dilma mostram que a tropa “tem algum conhecimento no sentido de garantir estes direitos”, mas ressalta que “a proteção dos atos não pode ser decisão política, mas sim institucional e constitucional”.
Antes e depois de junho de 2013
As chamadas 'jornadas de junho', ocorridas em 2013 e convocadas pelo Movimento Passe Livre, fizeram com que o brasileiro voltasse a conhecer o significado de manifestações de massa. Se inicialmente os protestos contra o aumento da passagem dos transportes reuniam poucos milhares de pessoas, após uma violenta repressão da Polícia Militar em 13 de junho os atos ganharam outra dimensão. Após décadas de ditadura militar - durante as quais não havia direito a protesto -, o país voltava a ter grandes atos. O que se seguiu em 2014 e 2015 foram centenas de protestos - anti-Copa, anti-Dilma, anti-chacinas na periferia -, convocados tanto pela esquerda quanto pela direita.
Depois dos anos de chumbo, a população retomou a ação política nas ruas. A dúvida é como o Estado democrático de direito irá lidar com esse novo momento.

O povo na rua como terrorismo

"Faz parte da 'novilíngua' atual usar uma noção completamente vaga de "terrorismo" para justificar um Estado de exceção permanente no interior do qual podemos flexibilizar leis que garantem liberdade individual, fichar manifestantes de toda ordem e exigir que as pessoas não tirem fotos de carros de polícia estacionados em lugar proibido. Pois há algo que as democracias oligárquicas atuais têm mais medo do que de terroristas reais: manifestantes nas ruas", escreve Vladimir Safatle, professor livre-docente do Departamento de filosofia da USP (Universidade de São Paulo), em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 30-10-2015.
Eis o artigo.
Depois de grandes manifestações contra o governo, a crise econômica e a classe política que sacudiram a Espanhanos últimos anos, os poderes instituídos resolveram enfim responder. Não, eles nada fizeram para tentar dar alguma realidade institucional a demandas de democracia direta e de autonomia do poder em relação aos interesses do sistema financeiro. A toque de caixa, o governo espanhol aprovou leis que criminalizavam, entre outras coisas, "perturbações graves" junto ao Congresso e "uso indevido" de imagens de policiais. Por exemplo, graças a essa lei, uma espanhola que fotografou um carro da polícia estacionado em área proibida foi multada. Esta é a forma que, atualmente, os "Estados democráticos" respondem quando se sentem ameaçados pela revolta popular: eles procuram todos os meios para transformar a revolta política em crime.
Como nenhuma ideia ruim vem à existência sem alguém que tenha a crença de devermos aplicá-la por nossas bandas, o Senado brasileiro acaba de aprovar uma lei que, no fundo, visa simplesmente impor medo aos cidadãos que ousem ir novamente às ruas para manifestar contra a casta política que os governa e seus interesses. Ela vem com o nome de "lei antiterrorista", mesmo que, no Brasil, até segunda ordem, ninguém tenha ouvido falar da existência de "grupos terroristas", a não ser pela boca de políticos do PSDB, que, na era de FHC, o sábio, gostavam de chamar o MST de "terrorista", ou de revistas humorísticas travestidas de semanários de notícia que chamavam manifestantes com a mesma alcunha.
Duas interpretações então se impõem. Ou a lei é um caso absolutamente único de legislação constituída antes do fato que a legitime ou ela tem um fato, mas ele não é aquele que alguns procuram nos fazer acreditar. Vejamos, por exemplo, como a lei tipifica "terrorismo": "Provocar ou infundir medo ou terror generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade, à saúde ou à privação da liberdade da pessoa".
Provocar terror generalizado mediante tentativa de ofensa à saúde: como todos podem perceber, trata-se de uma definição quase cômica que nem com a maior boa vontade permitiria individualizar com clareza aquelas condutas que deveriam ser tipificadas como terrorismo. Pela definição, a clássica emissão radiofônica de Orson Welles sobre um ataque de marcianos cujo realismo era tamanho que provocou pânico na população seria tipificada de terrorismo pelos parlamentares brasileiros. No entanto, por alguma razão singular, nenhum parlamentar lembrou de tipificar como terrorismo o ato de provocar terror generalizado por meio da corrupção ao bem público.
De toda forma, como nossa polícia é eivada de admiradores confessos da ditadura de 64 ou de especialistas em inteligência militar capazes de transformar embalagem de Nescau e de vinagre em artefato bélico, dá para imaginar como será interpretado o ato de "provocar terror generalizado".
Afinal, sempre se é o terrorista de alguém. Neste ponto, o sempre alerta senador Aloysio Nunes conseguiu o feito inacreditável de piorar uma lei já medonha ao retirar o parágrafo que afirmava que a nova legislação não se aplica a: "conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou categoria profissional". É que a política brasileira já dispensou a fase dos disfarces.
É claro que, ao menos neste ponto, o Brasil não inova. Faz parte da 'novilíngua' atual usar uma noção completamente vaga de "terrorismo" para justificar um Estado de exceção permanente no interior do qual podemos flexibilizar leis que garantem liberdade individual, fichar manifestantes de toda ordem e exigir que as pessoas não tirem fotos de carros de polícia estacionados em lugar proibido. Pois há algo que as democracias oligárquicas atuais têm mais medo do que de terroristas reais: manifestantes nas ruas.
No entanto, há um ponto no qual a lei brasileira abre novos caminhos para o mundo, a saber, na tipificação de "terrorismo contra coisas". Sim, é possível ser terrorista contra coisas, desde que tais coisas sejam "meio de transporte coletivo" de propriedade de empresas cujos donos costumam ter contas na Suíça, "instituições do sistema financeiro nacional e sua rede de atendimento", entre tantos outros. Uma lei contra depredação de patrimônio não basta. Quebrar vidraça de banco só podia mesmo ser terrorismo.

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