segunda-feira, 10 de agosto de 2009

As bases Americanas

As bases americanas na Colômbia têm um
alvo: o Brasil


O Conselho Sul-americano de Defesa da Unasul, uma inspiração brasileira, mostrou-se um tigre asiático. Num dos primeiros testes reais, as polêmicas bases estadunidenses na Colômbia não serão alvo de debate no Conselho, isso porque os EUA fizeram forte lobby para que o tema não seja discutido. Ainda mais: as bases americanas na Colômbia têm um alvo: o Brasil e não a Venezuela.

O artigo é de Juan Gabriel Tokatlian, professor de Relações Internacionais da Universidade Di Tella e membro do Clube Político Argentino em artigo publicado no jornal Página/12, 07-08-2009. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.

Tudo indica que os Estados Unidos poderá utilizar várias bases militares na Colômbia. O acordo, a ser confirmado brevemente, foi apresentado em Bogotá como continuação e complemento da luta contra o narcotráfico e o terrorismo, e em Washington como substituição da base de Manta, no Equador – que os EUA deve abandonar neste ano –, como localizações para levar a cabo “operações contingentes, logística e treinamento”, de acordo com a linguagem do Pentágono.

Visto a partir da situação concreta da Colômbia, não existe nenhum interesse nacional em jogo nesse tema: os avanços do Estado frente aos diferentes atores armados foram relevantes; os vizinhos ideologicamente antagônicos não ameaçam usar força militar contra o país; os vizinhos mais próximos com a situação interna não agridem a Colômbia, nem insinuam fazê-lo; as nações da América do sul não mostraram condutas oportunistas contra Bogotá nem antes, nem agora; e o hemisfério em seu conjunto está procurando deixar para trás a dinâmica custosa e agressiva da Guerra Fria.

Entretanto, o novo compromisso bilateral pode ser analisado e avaliado a partir de outra perspectiva. Uma delas é desde a ótica dos Estados Unidos e desde o prisma da geopolítica global e regional. Nesse sentido, há um conjunto de pressupostos básicos que não foram alterados com a chegada ao governo do presidente Barack Obama.

Nas últimas décadas – e em particular depois do 11-S – produziu-se um desequilíbrio notável entre o componente militar e o componente diplomático na política externa dos Estados Unidos. A militarização da estratégia internacional de Washington implicou num desproporcional gasto na defesa – em relação com qualquer potencial adversário ou individual ou hipotética coalizão, em comparação ao destinado a diplomacia convencional -, uma desmesurada e perigosa preponderância burocrática no processo de tomada de decisões, e uma ascendente autonomia frente aos civis na política pública do país.

Nesse contexto, desde meados dos anos noventa, o Comando do Sul foi se transformando na etnarca militar dos Estados Unidos para o Caribe e América Latina. Estacionado na Flórida, o Comando Sul tende a comportar-se como o principal interlocutor dos governos da área e o articulador decisivo da política exterior e de defesa estadunidense na região. O perfil pro - consular do Comando Sul se observa e comprova mediante a análise empírica do vasto conjunto de iniciativas, ações, desembolsos, exercícios, dados e manifestações que planeja e executa em torno das relações continentais. O restabelecimento da IV Frota é apenas um dos últimos indicadores de uma ambiciosa expansão militar na região que não contou com nenhum questionamento do Departamento de Estado, nem da Casa Branca.

Nesse sentido, o uso de várias instalações militares na Colômbia facilita ao Comando Sul conseguir parte do seu projeto pro - consular: ir facilitando – naturalizando – a aceitação na área de um potencial Estado gendarme no centro da América do Sul. A mensagem principal é para o Brasil e não para a Venezuela. Para além das coincidências políticas e de negócios entre Brasília e Washington, os Estados Unidos buscará restringir ao máximo a capacidade do Brasil no terreno militar e buscará acrescentar sua própria projeção de poder na Amazônia.

Agora, com uma simples manobra diplomática, os Estados Unidos demonstrou que o recente criado Conselho Sul-americano de Defesa (CSD) de inspiração brasileira, é até agora, um tigre de papel. América do Sul, uma região onde não existem ameaças letais para a segurança estadunidense, não há países que proliferem nuclearmente, não se encontram terroristas transnacionais de alcance global que operam contra interesses de Washington, é uma das regiões mais pacificas do mundo, tem regimes democráticos em todos os países e possui, conjuntamente, um baixo nível de anti-americanismo, não poderá discutir porque o Estados Unidos necessita usar bases militares da Colômbia. Nem Bogotá aceita debater o tema – e dali o desdobramento da diplomacia presidencial bilateral desses dias do presidente Alvaro Uribe – nem Washington necessita explicar sua política na região. Em todo caso, o conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, o general James Jones, já visitou Brasília e informou ao governo do presidente Lula a decisão de seu governo.

Na medida em que a América do Sul continue criando instituições que não podem abordar os temas centrais da região, resultará evidente o seu nível de fragmentação e sua incapacidade de assumir os principais desafios da área. Caracas e ainda Brasília podem viver com ele; para Argentina é ruim. Uma vez que Buenos Aires não é um interlocutor chave (seja por amizade ou oposição) de Washington, carece de uma visão estratégica faz anos, e tem perdido influencia na América do Sul e não aporta uma melhor institucionalização regional. A situação do país é todavia mais delicada: o falido nascimento da CSD é muito custoso para a Argentina.



Com presença na Colômbia, EUA visam rotas do petróleo


"Aumento da presença militar no país aliado segue roteiro gestado há pelo menos cinco anos, ainda sob Bush; estratégia altera cenário de segurança na Amazônia", escreve Luiz Alberto Moniz Bandeira, cientista político, professor titular (aposentado) da Universidade de Brasília, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 09-08-2009.

Eis o artigo.

O projeto de instalar e ampliar as instalações militares dos EUA no território da Colômbia foi elaborado durante o governo do presidente George W. Bush, diante da perspectiva de fechamento da Forward Operating Location (FOL), isto é, da base militar instalada em Manta, no Equador, previsto para 2009.
Desde que o presidente Rafael Correa anunciou que não renovaria o acordo com os EUA, o Comando Sul das Forças Armadas americanas passou a excogitar a transferência da FOL, instalada em Manta, para a base aérea de Palanquero, em Puerto Salgar, cerca de 190 km ao norte de Bogotá.

Essa base aérea pode albergar mais de 2.000 homens e possui uma série de radares, além de cassinos, restaurantes, supermercados, hospital e teatro. E a pista do aeroporto, a mais longa da Colômbia, tem 3.500 metros de longitude, 600 metros maior que a de Manta, e permite a partida simultânea de até três aviões.

Os EUA terão assim um ponto de apoio, no centro da Colômbia, ainda melhor que o de Manta, com o Forward Operating Location, com a instalação de três bases militares nas localidades de Malambo, na costa do Caribe, Palanquero, próxima a Bogotá, e de Apiay, na Amazônia, na região fronteiriça com o Brasil e conhecida como Cabeça de Cachorro.

Novo componente

Em 2004, com a Iniciativa Andina Antidrogas, Bush já havia expandido o Plano Colômbia como um dos aspectos da estratégia dos EUA para assegurar sua presença militar na América do Sul e, em particular, na Amazônia. E o Congresso americano aprovou a duplicação do número de soldados estacionados na Colômbia, que subiu de 400 para 800; o de mercenários (ex-militares) empregados pelas companhias militares, mediante as quais o Pentágono terceiriza as funções militares, aumentou de 400 para 600.

Esses militares e mercenários americanos adestram e apoiam os cerca de 17 mil soldados que executaram o Plano Patriota, ampla ofensiva de contrainsurgência nas selvas no sul da Colômbia. Com razão, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, em sua obra "Desafios Brasileiros na Era dos Gigantes", apontou "a crescente presença de assessores militares americanos e a venda de equipamentos sofisticados às Forças Armadas colombianas, pretensamente para apoiar os programas de erradicação das drogas, mas que podem ser, fácil e eventualmente, utilizados no combate às Farc e ao ELN", como um componente relativamente novo na questão de segurança da Amazônia.

Embora o governo dos EUA apresente o combate ao narcotráfico e ao terrorismo para justificar a concessão anual de US$ 700 milhões à Colômbia, a maior parte como assistência militar, um dos seus principais objetivos é proteger os oleodutos, sobretudo o de Caño Limón, já explodido cerca de 79 vezes, a fim de assegurar os suprimentos futuros de petróleo e inspirar confiança aos investidores estrangeiros.
É nessa região, a do oleoduto de Caño Limón, operado pela Occidental Petroleum e pela Royal Dutch/Shell, em Arauca, onde se concentra a maior parte dos assessores militares dos EUA e ocorrem as maiores violações de direitos humanos.

Militarização

Em 2009, a ajuda militar concedida à Colômbia, desde 2004, deve alcançar os US$ 3,3 bilhões. E assim, com os recursos dos EUA, o Exército da Colômbia se tornou o maior e o mais bem equipado, relativamente, da América do Sul. Com população de 44 milhões de habitantes, a Colômbia possui um contingente militar de cerca de 208,6 mil efetivos, enquanto o Brasil, com 8,5 milhões de quilômetros quadrados e mais de 190 milhões de habitantes, tem um contingente de somente 287.870, e a Argentina, com 40 milhões de habitantes e um território de 2,7 milhões de quilômetros quadrados, tem um efetivo de apenas 71.655.

A Colômbia, com um PIB de US$ 320,4 bilhões (2007 est.), de acordo com a paridade do poder de compra, destina 3,8% aos gastos militares, enquanto o Brasil, cujo PIB é de US$ 1,838 trilhões (2007 est.), gasta apenas 1,5%, e a Argentina, com um PIB de US$ 523,7 bilhões (2007 est.), gasta apenas 1,1%.

Em 2005, o Congresso estipulou para a região uma ajuda econômica de US$ 9,2 milhões e cerca de US$ 859,6 milhões para assistência militar. Entretanto, desde o lançamento do Plano Colômbia, no ano 2000, o Exército colombiano recebeu US$ 4,35 bilhões para combater as guerrilhas, e os soldados e policiais cometeram crescente número de assassinatos e abusos de direitos humanos -durante um período de cinco anos, que terminou em junho de 2006, o número de execuções extrajudiciais aumentou em mais de 50% em relação ao período anterior.


Brasil promove diálogo entre Chávez e EUA


O governo brasileiro está servindo de intermediário para um contato direto entre o presidente venezuelano Hugo Chávez e autoridades americanas, na tentativa de desarmar a crise surgida em decorrência do novo acordo entre a Colômbia e os Estados Unidos para o uso de bases colombianas por militares americanos.
O acordo levou Chávez a congelar as relações com a Colômbia pela quinta vez em seus dez anos de governo. O Brasil entrou como bombeiro, durante a visita que Marco Aurélio Garcia, o assessor diplomático do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, fez a Chávez na última segunda-feira.

A reportagem é de Clóvis Rossi e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 09-08-2009.

Marco Aurélio encontrou Chávez "muito incomodado" com a situação. Na verdade, deu a impressão de estar menos incomodado com as bases e mais com o que considera retórica agressiva contra a Venezuela por parte de autoridades colombianas e americanas.

Foi a brecha para que Marco Aurélio sugerisse um contato direto com Washington. Chávez resmungou, resmungou, disse que ele não tomaria a iniciativa, mas que, se o Brasil tomasse, ele aceitaria.

Marco Aurélio transmitiu a proposta a Jim Jones, o assessor de Segurança Nacional do presidente Barack Obama, com quem o brasileiro tem mantido contatos frequentes e bastante francos.

Jones limitou-se a dizer que achava "muito interessante" a proposta, mas deixou claro que precisava, antes de aceitá-la, conversar com seus superiores hierárquicos na Casa Branca e no Departamento de Estado.

Queixas

As conversas de Jim Jones com autoridades brasileiras (além de Marco Aurélio, ele esteve também com os ministros Celso Amorim, das Relações Exteriores, e Nelson Jobim, da Defesa) serviram para que os brasileiros se queixassem, em primeiro lugar, da maneira como fora conduzida a informação sobre o novo acordo com a Colômbia.

Mas serviram também para expor um ponto de vista que foi muito pouco explorado no noticiário após os encontros: a grande preocupação do Brasil é com a Amazônia, "uma questão delicada para o Brasil, ainda mais ante as frequentes conversas sobre a internacionalização da floresta", como disse Marco Aurélio Garcia.

A Amazônia se estende também pelo território colombiano e, portanto, fica diretamente ao alcance das bases que militares americanos utilizarão.

Numa evidência adicional de quanto o Brasil busca preservar o bom relacionamento com os Estados Unidos, especialmente agora com Obama na Presidência, Marco Aurélio fez questão de dizer que não dá para pensar apenas em termos dos atuais governos, em Washington e Bogotá, mas dos futuros, que poderiam ter planos mais agressivos.

Jones aceitou que houvera um falha de comunicação. Ainda assim, defendeu o acordo com toda a firmeza.
No dia seguinte (a última quinta-feira), foi a vez de ouvir de Álvaro Uribe, o presidente colombiano, o mesmo ressentimento, em relação tanto a Chávez como ao equatoriano Rafael Correa, que Chávez transmitira dias antes ao enviado especial de Lula.

Resposta do lado brasileiro: "Não estamos aqui como advogados de Correa ou de Chávez, mas você precisa entender que foi criada, para o Brasil, uma situação muito ruim".

Como já foi informado, Uribe não atendeu ao apelo de Lula para comparecer à reunião da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), marcada para amanhã em Quito.

O governo brasileiro entendeu. "É complicado comparecer a uma reunião na capital de um país com o qual a Colômbia não mantém relações diplomáticas", diz Marco Aurélio.

O Equador rompeu relações com a Colômbia depois que foi bombardeada em território equatoriano uma base das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).

Consequência da recusa de Uribe: a reunião da Unasul ficou bastante esvaziada, pelo menos se vingar o sentimento do governo brasileiro, eterno bombeiro em todas as questões regionais. Serviria apenas para a transmissão formal da presidência de turno do Chile para o Equador.

Como fica, então, a crise das bases? No que depender do governo brasileiro, é esperar baixar a poeira para depois retomar iniciativas bilaterais e/ou multilaterais em busca de acordos. A primeira conversa bilateral com um dos atores da crise, o venezuelano Chávez, só se dará no fim do mês (no próximo dia 28, exatamente), o que indica que há um excesso de poeira no ar e, por extensão, se necessita um certo tempo para que ela assente.










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