sexta-feira, 20 de março de 2009

Carta Capital

Carta Capital, 14.03.2009, coluna Andante Mosso



Veto divino

“Que o Deus da Justiça ilumine o nosso país e o livre de juízes como Gilmar Mendes!”



Goiânia, 6 de março de 2009.



Dom Xavier Gilles de Maupeou d’Ableiges, presidente da Comissão Pastoral da terra.



Gilmar não entra no céu.







Jornal do Brasil
JB, 15.03.2009, Artigo



A desigualdade como regra :

Iriny Lopes

DEPUTADA FEDERAL PELO PT-ES



A luta pelo direito à terra, contra a concentração fundiária e a exploração decorrente dessas desigualdades não foi inaugurada pelo Movimento de Trabalhadores Sem Terra (MST), que surgiu oficialmente há 25 anos. Não é nova também a reação das elites, sejam os latifundiários de ontem e hoje e as transnacionais dos tempos atuais àqueles que se contrapõem a esse modelo econômico que propicia o enriquecimento de poucos à custa do sofrimento de muitos. Não é igualmente recente o emprego da violência destes restritos beneficiários contra milhares de trabalhadores, do campo ou das cidades, que questionam o desequilíbrio econômico, social e político imposto como verdade absoluta.



Também não é original a tentativa de criminalização de movimentos sociais que se opõem à concentração econômica. Qualquer semelhança não é mera coincidência, mas constatação que criminalização de movimentos sociais e assassinatos no campo fazem parte da formação violenta das elites.



O antropólogo Kant de Lima, ao analisar o sistema jurídico brasileiro, adiciona outro aspecto que ajuda a entender um instrumento que serve a essas antigas formas de opressão: "É a desigualdade um princípio organizador oriundo da sociedade tradicional brasileira, dos tempos coloniais que, entranhada no tecido social, contamina as relações nas instituições sociais, sendo o sistema judicial criminal apenas uma das suas dimensões institucionais...".



As declarações do ministro Gilmar Mendes (ele e seu duplo, seja como presidente do STF, ou do Conselho Nacional de Justiça – e aí uma curiosidade: quem preside um órgão fiscalizador da Justiça é o mesmo que supostamente seria fiscalizado por ele) não causam estranheza. Apenas indignação de quem vê a história se repetir indefinidamente como vício e farsa.



Todo esse recente ataque ao MST começa com os homicídios de quatro pistoleiros, recentemente, em Pernambuco. Ninguém concorda com as mortes (e o próprio MST é o primeiro a repudiar a violência), mas há que se recontar esse episódio com lealdade. As 100 famílias que ocupavam essas duas áreas esperavam, há oito anos, que a Justiça parasse de ceder às artimanhas jurídicas dos fazendeiros, que tentam reverter a desapropriação.



A omissão e a morosidade do Judiciário permitiram que a situação chegasse a um nível de tensionamento, com agressões de seguranças de fazendeiros a lideranças do movimento, situação que foi relatada a autoridades policiais semanas antes, sem que essas fizessem qualquer ato para diminuir o conflito e evitar as mortes. Nada justifica assassinatos de um lado ou de outro, mas há que se constatar que a inércia de autoridades e do Judiciário concorre para a ocorrência desse tipo de tragédia.



Segundo levantamento da Comissão Pastoral da terra (CPT), 1,5 mil trabalhadores rurais foram mortos entre 1985 e 2007. Chacinas como a de Eldorado de Carajás, em 1986, o massacre de Corumbiara (RO), em 1995; ou ainda o ocorrido em Felisburgo (MG), em 2004, assim como a morte da irmã Dorothy Stang, em 2005, são casos marcados pela impunidade facilitada por uma Justiça dissimuladamente lenta para os mais pobres e célere quando se trata de proteger a elite. Das 1.117 ocorrências no campo neste período, só 85 foram julgadas até hoje, tendo sido condenados 71 executores e absolvidos 49. Do total, somente 19 mandantes foram condenados e nenhum deles se encontra preso.



Sobre o Pontal do Paranapanema, que Mendes usa para atacar as cooperativas que prestam assistência aos assentamentos, os quatro movimentos sem-terra questionaram com o protesto de fevereiro a ocupação indevida de 400 mil hectares de terras públicas estaduais por fazendeiros-grileiros há 40 anos.



A Justiça tornou indisponíveis os bens da Anca, que presta assessoria a assentamentos. A pergunta que não quer calar é porque também não foram bloqueados os bens da Confederação Nacional de Agricultura (CNA), ligada aos ruralistas, investigada pelo TCU, dentre outras denúncias, por bancar ilegalmente despesas da campanha da senadora Kátia Abreu (DEM/TO) ao Senado nas eleições de 2006? Segundo documentação, a CNA pagou R$ 650 mil a uma empresa que prestava serviços de publicidade à campanha da senadora. Vale lembrar que a CNA administra dinheiro público repassado, em parte, pelo chamado Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar).



O Atlas da Exclusão Social (2004) apontava que apenas 5 mil famílias detêm riqueza equivalente a 40% do PIB. Tal concentração de renda contrasta com as 130 mil famílias acampadas e outras quatro milhões de sem-terra. Não há omissão jurídica que evite os conflitos. Só a reforma agrária.



Folha de S. Paulo
Folha, 16.03.2009, Artigo



Plínio Arruda Sampaio: Nova ofensiva contra o MST

Neste momento, o MST se debate contra um tipo de ataque intermitente: uma ofensiva patrocinada por inimigos visíveis e invisíveis



O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) é sujeito a dois tipos de ataque: os permanentes e os intermitentes.



O primeiro tipo é desferido cotidianamente pela UDR (União Democrática Ruralista) e pela "bancada ruralista". Já a segunda forma de ataque acontece de vez em quando. Neste momento, o movimento se debate contra esse segundo tipo: uma grande ofensiva patrocinada por inimigos visíveis e invisíveis. Um dos inimigos visíveis é o atual presidente do Supremo Tribunal Federal. Extrapolando claramente suas funções, esse magistrado está exigindo providências judiciais para averiguar supostas irregularidades no repasse de verbas federais a entidades ligadas ao MST. No afã de agredir os sem- terra, sobrou para o Ministério Público, acusado de tolerância com o crime -o que provocou irada reação do procurador-geral, o honrado dr. Antonio Fernando de Souza.



Toda ofensiva -como explicam os tratados militares- deve ter um objetivo central bem claro. A ofensiva atualmente em curso contra o MST visa "limpar" a área fundiária de uma organização autêntica, que pode ser o sério obstáculo à implantação do novo modelo agrícola adotado pelo governo -o modelo do grande agronegócio. A ordem, portanto, é enterrar de uma vez a reforma agrária.



As desapropriações de imóveis estão paralisadas e os assentamentos não recebem o apoio necessário para que possam sair adiante. Explico: diante da resistência dos proprietários rurais, do poderio da bancada ruralista e da esperada demanda externa por produtos agrícolas, o governo resolveu desistir da reforma agrária e abraçar a fantasia mirabolante de montar, na Amazônia, uma enorme agricultura de exportação de carne, soja e álcool de cana-de-açúcar. A crise mundial demonstrará a inconsequência dessa política.



O MST é um estorvo para o projeto de transformar a Amazônia em polo exportador de grandes dimensões, pois a instalação de imensas fazendas nas terras públicas da região depende de investidores que não costumam colocar seus milhões em terras litigiosas. Exigem, primeiro, que sejam legalizadas. Aí então eles as compram dos grileiros. Trata-se de um processo semelhante ao da lavagem de dinheiro. No caso, trocam-se títulos contestáveis por títulos garantidos pelo governo. Pois, apesar da norma constitucional que determina a destinação de terras públicas à reforma agrária ou a projetos de colonização, o governo está decidido a entregar essas terras a grandes produtores.



Se o MST desaparecer ou ficar desmoralizado, sua influência sobre a opinião pública se reduzirá substancialmente e a pressão pela reforma agrária cairá a zero, deixando o governo com as mãos livres para regalar 67 milhões de hectares de terras públicas a grileiros que as venderão ao "honrado" agronegócio. Para ter uma ideia do tamanho desse "Panamá", basta lembrar que essa superfície é maior do que toda a terra arável da Alemanha somada à da Itália.



Não por acaso, além de investir contra as ocupações, a atual ofensiva lança suspeitas sobre a legalidade dos repasses de dinheiro a entidades que prestam serviços aos assentados.

Acusações de corrupção constituem, como se sabe, elementos devastadores da reputação de pessoas e de entidades. No entanto, o que corre solto, em Brasília, são os mais venenosos boatos a respeito das maracutaias que estão por trás não do repasse de verbas ao MST, mas da regularização do grilo amazônico.



Não é para menos: ao arrepio da Constituição, as medidas provisórias permitirão aos grileiros regularizar posses ilegais de até 1.500 hectares e ter preferência para adquirir outros 1.500 hectares que serão licitados.

O açodamento do governo para aprovar essas normas por meio de medidas provisórias, sem um debate maior com a sociedade, e a disputa entre o Ministério do Planejamento Estratégico, o do Meio Ambiente e o do Desenvolvimento Agrário não ajudam a desfazer a situação nem a deixar de ver, na mudança do modelo agrícola, a causa real da nova tentativa de arrebentar o movimento dos sem-terra.



A cidadania precisa repudiar esse ataque, pois uma coisa é certa: a esperança que o MST sustenta entre a população rural é a única coisa que está impedindo a reprodução no Brasil da tragédia que ensanguenta a Colômbia há mais de 50 anos.



PLÍNIO ARRUDA SAMPAIO, 78, advogado, é presidente da Abra (Associação Brasileira de Reforma Agrária) e diretor do "Correio da Cidadania". Foi deputado federal pelo PT-SP (1985-1991) e consultor da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação).



Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


Folha, 15.03.2009, Artigo



Aprendendo com o Brasil



O MST seria um bom exemplo a ser seguido pela esquerda americana, se os EUA tivessem qualquer coisa comparável a ele em termos de movimento social forte



IMMANUEL WALLERSTEIN



Parece-me que há duas situações que requerem dois planos para a esquerda mundial, em especial para a esquerda dos Estados Unidos. A primeira situação é o curto prazo. O mundo se encontra numa depressão profunda, que, pelo menos nos próximos um ou dois anos, só vai se agravar. O curto prazo imediato é o que preocupa a maioria das pessoas que agora se confrontam com o desemprego, a redução grave de sua renda e, em muitos casos, a perda da moradia. Se os movimentos de esquerda não tiverem um plano para fazer frente a esse curto prazo, eles não poderão se conectar com a maioria das pessoas de qualquer maneira que tenha significado.



A segunda situação é a crise estrutural do capitalismo como sistema mundial, que, em minha opinião, enfrenta sua extinção certa nos próximos 20 a 40 anos. Esse é o médio prazo. E, se a esquerda não tiver um plano para esse médio prazo, aquilo que vier a substituir o capitalismo como sistema mundial será algo pior, provavelmente muito pior, que o sistema terrível com o qual convivemos há cinco séculos.



As duas ocasiões requerem táticas diferentes, mas combinadas. Qual é nossa situação no curto prazo? Os Estados Unidos elegeram um presidente centrista cujas inclinações são um tanto quanto à esquerda do centro. A esquerda, ou a maior parte dela, votou nele por duas razões. A alternativa seria pior -de fato, muito pior. Logo, votamos pelo mal menor. A segunda razão foi que pensamos que a eleição de Obama abriria espaço para movimentos sociais de esquerda.



O problema com que a esquerda se defronta não é novo. Situações como essas são comuns. Roosevelt em 1933, Attlee em 1945, Mitterrand em 1981, Mandela em 1994, Lula em 2002, todos foram os Obamas de seu lugar e seu tempo. E a lista poderia ser prolongada ao infinito. O que faz a esquerda quando essas figuras "decepcionam", como todas não podem deixar de fazer, já que são todas centristas, mesmo que à esquerda do centro?



Em minha opinião, a única atitude sensata é aquela adotada pelo grande, forte e militante MST (Movimento dos Sem-Terra) no Brasil. O MST apoiou Lula em 2002, e, apesar de todas as promessas que ele deixou de cumprir, apoiou sua reeleição em 2006. O fez com plena consciência das limitações do governo de Lula, porque a alternativa seria evidentemente pior. Mas o que o MST também fez foi manter pressão constante sobre o governo de Lula -reunindo-se com ele, denunciando-o publicamente quando o governo o merecia e organizando-se em campo para combater suas falhas.



O MST seria um bom exemplo a ser seguido pela esquerda americana, se tivéssemos qualquer coisa comparável a ele em termos de movimento social forte. Não temos, mas isso não deveria nos impedir de tentarmos formar um da melhor maneira possível e fazer como faz o MST o tempo todo -pressionar Obama abertamente, publicamente e com força-, além de, é claro, aplaudi-lo quando ele faz a coisa certa.



O que queremos de Obama não é transformação social. Ele não deseja nem é capaz de nos oferecer isso. Queremos dele medidas que minimizem a dor e o sofrimento da maioria das pessoas neste momento. Isso ele pode fazer, e é com relação a isso que a aplicação de pressões sobre ele pode fazer uma diferença.



O médio prazo é outra coisa inteiramente. E nesse tocante Obama é irrelevante, como o são os outros governos à esquerda do centro. O que está acontecendo é uma desintegração do capitalismo como sistema mundial, não porque ele não pode garantir o bem-estar da grande maioria da população (isso é algo que o sistema nunca pôde fazer), mas porque não consegue mais garantir que os capitalistas terão o acúmulo interminável de capital que é sua razão de ser. Chegamos a um momento em que nem os capitalistas prescientes, nem seus adversários (nós), estamos tentando preservar o sistema. Estamos ambos tentando estabelecer um sistema novo, mas é claro que temos ideias muito diferentes -na verdade, radicalmente opostas- quanto à natureza de tal sistema.



Pelo fato de o sistema ter se afastado muito do equilíbrio, ele se tornou caótico. Estamos vendo flutuações malucas em todos os indicadores econômicos usuais -os preços das commodities, os valores relativos das moedas, os níveis reais de tributação, a quantidade de itens produzidos e comerciados. Como ninguém sabe realmente quais serão as flutuações desses indicadores, que mudam praticamente diariamente, ninguém pode fazer um planejamento sensato de nada.



Em tal situação, ninguém, seja qual for sua posição política, sabe ao certo quais medidas serão melhores. Essa confusão intelectual prática se presta à demagogia frenética de todos os tipos. O sistema está se bifurcando, o que significa que dentro de 20 a 40 anos haverá algum sistema novo, que criará ordem a partir do caos. Mas não sabemos qual será esse sistema.



O que podemos fazer? Para começar, precisamos ter clareza sobre de que trata essa batalha. É a batalha entre o espírito de Davos (em favor de um sistema novo que não seja o capitalismo, mas que mesmo assim seja hierárquico, explorador e polarizador) e o espírito de Porto Alegre (um sistema novo que seja relativamente democrático e relativamente igualitário). Não existe mal menor aqui. É uma coisa ou a outra.



O que a esquerda deve fazer? Promover a clareza intelectual em relação à escolha fundamental. Então organizar-se em mil níveis e de mil maneiras para empurrar as coisas na direção certa. A primeira coisa a fazer é incentivar a descomoditização, no maior grau que conseguirmos. A segunda é fazer experimentos com toda espécie de novas estruturas que façam mais sentido, em termos de justiça global e sanidade ecológica. E a terceira coisa que precisamos fazer é incentivar o otimismo realista. A vitória está muito longe de ser certa. Mas é possível.



Resumindo, então: trabalhar no curto prazo para minimizar o sofrimento, e no médio prazo para assegurar que o novo sistema que vai emergir seja um sistema melhor, e não pior. Mas fazer este último sem triunfalismo e com a consciência de que a luta será tremendamente difícil.



IMMANUEL WALLERSTEIN, 78, pesquisador sênior na Universidade Yale, é autor de "O Moderno Sistema Mundial", sobre a globalização do capitalismo, e "O Declínio do Poder Americano".



REVISTA EPOCA 15 de março,

Entrevista com Joao Pedro Stedile



Entrevista que foi feita por escrito, mas publicada apenas na pagina da internet da revista

e no final a "editada" que o editor fez na revista impressa.



1- O presidente do STF, Gilmar Mendes, afirmou na semana passada que o governo federal não pode repassar dinheiro público ao MST. Mas o dinheiro a que ele se refere é repassado a ONGs e cooperativas. Afinal, o MST recebe ou não dinheiro de entidades como Anca, Concrab, Iterra, etc?

As entidades citadas estão devidamente habilitadas nos órgãos públicos e são fiscalizadas com rigor. Desenvolvem projetos de assistência técnica, alfabetização de adultos, capacitação, educação e saúde em assentamentos rurais. Isso é feito por centenas de entidades em todo o país, sendo que algumas delas recebem verbas polpudas. Isso acontece por culpa do governo neoliberal do FHC, que implementou a substuição do Estado por ONGs. O MST sempre defendeu que direitos como educação, saúde e assistência técnica rural têm que ser implementado pelo Estado para garantir a sua universalização. O engraçado é que os neoliberais como sr. Gilmar Mendes desmontaram o Estado e agora reclamam das Ongs. Até ele montou sua própria Ong para dar aulas de direito. Não seria melhor multiplicar faculdades públicas?

2- Gilmar Mendes afirma que o dinheiro público é aplicado pelo MST para financiar suas ações. Isso é real? Como o MST paga os custos quando faz ações, como protestos ou invasões?

As lutas dos trabalhadores só acontecem porque há problemas sociais e direitos negados. Então, parcelas mais conscientes se organizam, mobilizam suas forças e lutam. Nossa luta é fruto dessa consciência e, evidentemente, recebemos solidariedade dos trabalhadores, dos estudantes e professores, das igrejas e da sociedade brasileira. Existimos há 25 anos graças ao apoio político da sociedade brasileira e internacional e somos gratos pelas muitas homenagens recebidas. Nunca usamos um centavo de dinheiro público para fazer ocupações. Seria o fim de qualquer movimento. Isso é um absurso e fere a inteligência do povo. Imagine que amanhã vão dizer que os sindicatos são financiados pelo dinheiro público para fazer greves.

3- Caso os repasses do governo sejam encerrados, como afirma o presidente do STF, em que medida isso poderia afetar o MST?

Em nada afetaria o MST. Apenas achamos engraçado como eles se preocupam com ongs que atuam na reforma ágraria. Essa é a questão. Na verdade, o sr. Mendes está defendendo seus interesses como latifundiario e os interesses da sua classe. Não quer reforma agrária nem quer ver a terra dividida. Muito menos lá no Mato Grosso, onde proibiu até pescaria em sua fazenda. Ele faz pose de moralista e não explica porque sua ONG recebe dinheiro público. Por quê? Por que não investiga SENAR, administrado pelos fazendeiros, que recebeu um bilhão de reais de verba pública? Há processos no TCU de dinheiro do SENAR apropriado para enriquecimento pessoal de fazendeiros. Por que não pede investigação da ONG Alfabetização Solidária, que recebeu 330 milhões de reais para fazer alfabetizaçao de adultos? Quantos parlamentares respondem por processos de improbidade? Mais uma pergunta: algum militante do MST ficou rico com dinheiro público? A Policia Federal sabe muito bem quem desvia dinheiro público no Brasil.
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4- Em sua fala, o presidente do Supremo questiona a legalidade das invasões de terra. Em que medida as invasões podem ser consideradas legítimas?

Há juristas, como o ex-ministro do STJ Luiz Vicente Cernicchiaro, que expôs em acórdão do tribunal que ocupação massiva para pressionar pela reforma agrária não só não é crime, mas um direito do povo de lutar. Portanto, não é questao de lei, mas questão de classe. As ocupações de terra são uma forma do povo organizado pressionar o governo a fazer reforma agraria. A solução é simples: basta aplicar a Constituição e acelerar a reforma agrária, que acabariam as ocupações. Agora, todas as milhares de famílias já assentadas pela reforma agraria no Brasil tiveram que ocupar terra para conquistá-las. A culpa não é nossa, mas da omissão do Estado brasileiro. Claro que o sr. Gilmar Mendes deve também ser contra as greves, quilombolas, povos indigenas, ou seja, pobres em geral. No entanto, é a favor dos militares que implantaram uma ditadura militar, de banqueiros corruptos. Cada um defende a classe que pertence.

5- A Advocacia Geral da União pediu ao STF que dê prioridade ao julgamento de uma ação que questiona uma Medida Provisória do governo FHC. A MP veta por dois anos a ddesapropriação, para fins de reforma agrária, de terras invadidas. Se essa MP voltar a ser aplicada, o que o MST pretende fazer? Quais as consequências disso para a reforma agrária?

As ocupações de terra são uma forma histórica dos pobres do campo brasileiro lutarem - não foi o MST que inventou. Elas existem desde que em 1850, quando a Lei de Terras institucionalizou o latifúndio e a concentração da propriedade. A luta pela reforma agrária vai existir enquanto tivermos na sociedade brasileira a contradição entre 30 mil fazendeiros e 4 milhões de famílias sem terra e 11 milhões de familias que estão em programas assistenciais do governo. Menos de 1% dos proprietarios controlam 46% de todas as terras no Brasil. As nossas mobilizações e ocupações vão continuar.

A sociedade brasileira precisa discutir como enfrentar a crise econômica que esta aí. Precisamos discutir como produzir alimentos sem agrotóxicos, como ter uma agricultura sustentável, como preservar a terra, a água e a biodiversidade, que são bens da natureza, repartidas entre todos os brasileiros, e não apenas entre fazendeiros e empresários. Esse é o debate. O Sr. Gilmar Mendes assumiu convictamente o papel de líder da direita no Brasil e, por isso, o chamamos de Berlusconi verde-amarelo, embora ele seja mais parecido com o Mussolini.


AGORA E ENTREVISTA E EDITADA pelo jornalist a e publicada na revista EPOCA, de 15 de março de 2009

Líder afirma que as entidades são fiscalizadas pelo governo e não repassam recursos ao MST



ÉPOCA – A Justiça bloqueou repasses de verbas públicas à Anca, apontada como entidade ligada ao MST. O MST recebe dinheiro público por meio de ONGs como a Anca?



João Pedro Stedile – Entidades como a Anca estão habilitadas nos órgãos públicos e são fiscalizadas com rigor. Desenvolvem projetos de assistência técnica, alfabetização de adultos, capacitação, educação e saúde em assentamentos rurais. Isso é feito por centenas de entidades em todo o país. Isso acontece por culpa do governo neoliberal do Fernando Henrique, que implementou a substituição do Estado por ONGs. O MST sempre defendeu que direitos como educação, saúde e assistência técnica rural têm de ser implementados pelo Estado para garantir a sua universalização.



ÉPOCA – Como o MST banca os custos de suas ações, como invasões de terra e protestos?



Stedile – As parcelas mais conscientes se organizam, mobilizam suas forças e lutam. Nossa luta é fruto dessa consciência e recebemos solidariedade dos trabalhadores, dos estudantes e professores, das igrejas e da sociedade brasileira. Existimos há 25 anos graças ao apoio político da sociedade brasileira e internacional. Nunca usamos um centavo de dinheiro público para fazer ocupações. Seria o fim de qualquer movimento. Isso é um absurdo e fere a inteligência do povo.



ÉPOCA – O MST será afetado caso o governo não repasse mais dinheiro a ONGs apontadas como ligadas ao movimento?



Stedile – Não. Apenas achamos engraçado como eles se preocupam com ONGs que atuam na reforma agrária.



Folha, 16.03.2009



Ocupar terra de Dantas é "dever do povo brasileiro", afirma Protógenes em ato

LAURA CAPRIGLIONE

DA REPORTAGEM LOCAL



O delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz defendeu ontem em São Paulo que "ocupar fazenda de banqueiro bandido é dever do povo brasileiro". Manifestou assim seu apoio à invasão da fazenda Espírito Santo, de propriedade do banqueiro Daniel Dantas, por 280 militantes do Movimento dos Sem-Terra (MST), no último dia 28.



Protógenes foi o coordenador da Operação Satiagraha, que apurou possíveis ilegalidades cometidas por Daniel Dantas à frente do Grupo Opportunity. No dia 1º de abril, o delegado deve comparecer à CPI dos Grampos da Câmara para explicar supostos abusos que teriam ocorrido durante as investigações. Protógenes foi afastado do caso.



Segundo o delegado, que ontem discursou diante de 70 militantes do Movimento terra, Trabalho e Liberdade, ligado ao PSOL, "no dia 1º, o povo brasileiro vai ver em que condições essas terras [as da fazenda Espírito Santo] foram adquiridas", além de saber "quais os interesses escusos por trás disso aí".

O encontro contou com a participação da presidente nacional do PSOL e hoje vereadora de Maceió, Heloísa Helena, que tratou o delegado todo o tempo por "herói". Alguns ativistas vestiam camiseta amarela com inscrição em verde "Protógenes contra a corrupção".



Foi nesse cenário que o delegado convocou os presentes a organizarem caravanas para, no dia 1º, em Brasília, "exigir a punição daqueles que saquearam os cofres do nosso país. E para impedir a punição daquele servidor público federal que cumpriu o seu dever." Falava de si mesmo.



Interrompido por aplausos, prometeu explicar como se deu a participação no que chamou de "quadrilha" de cada personagem "que tem relação espúria, corrupta, criminosa com o banqueiro bandido Daniel Dantas".



Em pelo menos sete vezes, o delegado referiu-se a Daniel Dantas como o "banqueiro bandido". E disse que, no Brasil, "falta punição". Mencionou Bernard Madoff, preso na semana passada depois de se declarar culpado em um dos maiores escândalos financeiros dos EUA.



"E o nosso banqueiro aqui? É homenageado e cortejado", disse Protógenes. A defesa de Daniel Dantas alega que houve irregularidades e atos persecutórios na investigação conduzida pelo delegado da PF. Fazendas do banqueiro no Pará são o alvo declarado do MST na região.

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