Patrimônio das 15 famílias mais ricas do País é quase o dobro do investido em 11 anos de Bolsa Família
A revista Forbes divulgou, no último dia 13, um ranking composto pelas 15 famílias mais ricas do país. De acordo com a publicação, elas detêm um patrimônio equivalente a R$ 270 bilhões. O valor representa quase o dobro do montante de recursos destinados, nos últimos 11 anos, a 50 milhões de pessoas atendidas pelo programa Bolsa Família, do governo federal. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), o programa contou com investimento de R$ 137,3 bilhões, neste período.
A reportagem é de Victoria Almeida, publicada pela Agência PT de Notícias, 25-05-2014.
A família Marinho, detentora das Organizações Globo, está no topo do ranking divulgado pela revista. A fortuna do núcleo formado pelo trio de bilionários Roberto Irineu Marinho, João Roberto Marinho e José Roberto Marinho, é estimada em US$ 28,3 bilhões, o que equivale a aproximadamente R$ 62,6 bilhões.
Com fortuna calculada em US$ 3,3 bilhões (cerca de R$ 7,3 bilhões), os Civita, donos do Grupo Abril, que edita a revista Veja, ocupam a 11ª posição entre as famílias mais ricas do país. O grupo é formado por Giancarlo Francesco Civita, Anamaria Roberta Civita e Victor Civita Neto.
O setor bancário também está presente no páreo. Participam do ranking as famílias Safra (Banco Safra), Moreira Salles (Itaú/Unibanco), Vilela (Holding Itaúsa), Aguiar (Bradesco) e Setúbal (Itaú). Somados, os patrimônios destas famílias equivalem a US$ 45,3 bilhões ou, R$ 100,3 bilhões.
Embora a concentração de renda continue alta no Brasil, o país tem desenvolvido, na última década, programas que contribuem para a redução das desigualdades sociais. Um deles é o Bolsa Família, criado em 2003 pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e promovido, desde 2011, pela gestão da presidenta Dilma Rousseff.
Os impactos positivos causados pelo programa são comprovados. Segundo o estudo “A Década Inclusiva”, publicado em 2012 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o programa é o terceiro fator que mais influenciou na redução das desigualdades sociais no país, ficando atrás apenas da renda adquirida pelos brasileiros por meio do trabalho e da Previdência Social.
Desde a sua criação, o Bolsa Família já atingiu um quarto da população brasileira, beneficiando 50 milhões de pessoas. Resultados como esse, tornaram o Bolsa Família o maior programa de transferência condicionada de renda no Brasil e uma referência de sucesso para o mundo.
Mito x fato
Desde sua criação, o Bolsa Família é alvo de diversas críticas. Muitos acreditavam que o programa acomodaria a população de baixa renda ou, ainda, consideravam o benefício oferecido como uma “esmola” aos mais pobres.
Afirmações como essas se mostram cada vez mais equivocadas, quando observadas as ações do programa.
Para participar da iniciativa, os beneficiários devem assumir compromissos ligados à saúde. Manter o calendário de vacinas dos filhos em dia e fazer visitas médicas para acompanhar o crescimento das crianças abaixo dos sete anos, são algumas delas. As gestantes assistidas pelo programa devem realizar o pré-natal e contam com tratamento médico para recém-nascidos.
Para participar da iniciativa, os beneficiários devem assumir compromissos ligados à saúde. Manter o calendário de vacinas dos filhos em dia e fazer visitas médicas para acompanhar o crescimento das crianças abaixo dos sete anos, são algumas delas. As gestantes assistidas pelo programa devem realizar o pré-natal e contam com tratamento médico para recém-nascidos.
De acordo com o MDS, o auxílio do programa Bolsa Família às populações de baixa renda possibilitou a redução de 19,4% do índice de mortalidade de infantil de crianças de até cinco anos. Ainda no âmbito de saúde, houve redução de 46,3% de mortes infantis por diarreia e 58,2% por desnutrição.
Manter os filhos na escola também é um compromisso assumido pelos beneficiários. Os resultados têm sido cada vez melhores. No último bimestre de 2013, por exemplo, a média de aprovação de estudantes inclusos no programa foi de 96%.
Para permanecer ligados ao programa, estudantes de 6 a 15 anos devem ter, no mínimo, 85% de frequência escolar. Ao mesmo tempo, jovens de 16 e 17 anos precisam ter, minimamente, a frequência de 75%, nas aulas.
O mito de que os beneficiários do Bolsa Família se acomodariam, cai por terra cada vez mais. Segundo o Planalto, 75,4% dos assistidos pelo programa estão empregados. Além disso, eles representam 10% dos 3,8 milhões deMicroempreendedores Individuais (MEI), espalhados pelo Brasil.
Emancipação feminina
Por meio da iniciativa, as mulheres brasileiras estão ganhando maior autonomia em seus lares. De acordo com o MDS, elas representam 93% das pessoas titulares dos cartões do programa. Com o auxílio da iniciativa, elas podem contribuir no sustento da casa e garantir um futuro melhor para si mesmas. Um exemplo disso é que elas ocupam 66% das matrículas do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec).
Os recursos recebidos pelos beneficiários do programa Bolsa Família também são aplicados de forma consciente. Ao todo, 87% dos beneficiários destinam o dinheiro recebido para alimentação, 46% em material escolar e 37% em vestuário.
Para o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, o Bolsa Família é um modelo de sucesso e pode servir como exemplo a outros países, no combate à pobreza. Atualmente, países como Bangladesh, Paquistão, Turquia eEquador já adotam estratégias inspiradas na iniciativa brasileira. A ação de transferência condicionada de renda do Brasil também está inspirando a criação de programas nas cidades de Washington e Nova York, nos Estados Unidos.
Antonio Delfim Netto, economista, a partir do livro de Thomas Piketty, analisa o índice de desigualdade de Gini, em artigo publicado pelo jornal Valor, 27-05-2014.
Eis o artigo.
O novo livro de Thomas Piketty, "O Capital no Século XXI", é uma extraordinária pesquisa histórica organizada em torno de sólidos conhecimentos econômicos. Sua tese, entretanto, pode terminar numa simplificação empobrecedora: a desigualdade entre a taxa real de crescimento do PIB (o famoso "g") e a taxa de retorno do capital (o famoso "r"), que obviamente não são constantes (e cuja extrapolação é duvidosa), controla ao longo do tempo a distribuição da renda entre o trabalho e o capital e a acumulação dos patrimônios.
Piketty recolocou, com grande vigor, o velho problema da desigualdade com uma solução que está longe de atrair unanimidade, mas o livro só teve a merecida repercussão quando traduzido para o inglês. Numa entrevista à "Folha de São Paulo", o ilustre autor desculpou-se por não ter incluído o Brasil na sua pesquisa: não conseguiu as informações necessárias. De fato não são conhecidos estudos sobre a distribuição do patrimônio no Brasil (o mesmo ocorre na maioria dos países), mas os dados de distribuição de renda, cuja cobertura tem crescido de forma exponencial, estão disponíveis desde sempre.
Nos últimos 60 anos, o problema da desigualdade tem sido intensamente discutido no Brasil. Na disputa partidária dos anos 70 do século passado, criticava-se a política econômica porque ela proporia "primeiro crescer para depois distribuir", uma tolice só viável numa sociedade centralizada como na URSS ou na China que, aliás, eram os "modelos" de alguns dos críticos. No Brasil, a produção crescia a 10% ao ano. Então, quem consumia o que era produzido? O que se afirmava, como agora, é uma verdade física elementar: não se pode distribuir o que ainda não foi produzido, a não ser ganhando de presente ou tomando emprestado no exterior como acontece em Cuba e há 20 anos no Brasil!
Piketty recolocou, com vigor, o problema da desigualdade
Ainda hoje há entre nós uma grande dificuldade de entender que o índice de desigualdade de Gini não mede "bem-estar". Mede "a distância média entre a renda dos agentes". Podemos ter uma ideia concreta dessa medida, supondo uma sociedade, com dois agentes, que recebem salários cuja soma é igual a 300. O quadro nº 1 mostra que como a soma dos salários é 300, a maior desigualdade possível consiste em um agente receber 300 e o outro nada. Como essa é a maior diferença possível, ela é tomada como base para as demais comparações. Por exemplo, na situação (2) da tabela, a diferença entre os salários é de 200 e o índice de Gini é: 200/300 = 0,67.
Uma propriedade interessante da tabela é que a maior diferença entre os salários (300) é, por construção, o dobro do salário médio, que é mantida para qualquer número de agentes. Foi isso que deu a Corrado Gini (1884-1965) a ideia de construir um índice de desigualdade dividindo a diferença média das rendas pelo dobro do salário médio. O quadro n º 2 mostra isso quando há três agentes. Vemos que a soma das diferenças de salários é 400 (100 + 200 + 100) e, portanto, a média das diferenças é igual a 400/3 = 133 e o índice de Gini é 0,33. Qualquer que seja o número de agentes, o índice de desigualdade de Gini é calculado pela fórmula: G = diferença média de salários/ 2 vezes o salário médio.
É importante observar que no quadro n º1 comparamos os índices de Gini para uma situação estática: a soma dos salários é constante (300). O que se estuda é o efeito de sua redistribuição. Neste caso talvez seja razoável aceitar que um índice menor sugere uma situação mais "justa". Sem precisar aceitar uma filosofia igualitária, parece que a situação (4), onde um agente ganha 100 e o outro 200 é "socialmente mais justa" do que a situação (2) onde um ganha 50 e o outro 250. É claro que o "mais justo" aqui - como em todas as circunstâncias - ignora restrições importantes e implica uma valoração ética.
O índice de Gini tem um significado razoavelmente claro quando comparamos a distribuição num mesmo instante no tempo. Mas o que acontece quando tentamos comparar duas situações diferentes no tempo, com um aumento desigual na remuneração dos agentes produzido por um diferencial de produtividade, por exemplo? Tomemos a situação (4) do quadro n º1, onde um agente ganha 100 e o outro 200 e suponhamos que depois de alguns anos o primeiro tivesse seu salário multiplicado por 2, passando a 200 e o segundo (porque se qualificou mais), tivesse o seu multiplicado por 3, passando a 600. Obviamente, trata-se de aumento físico e não de efeito inflacionário. Aplicando a fórmula de Gini verificamos que o índice de concentração teria aumentado de 0,33 para 0,50, o que parece indicar uma deterioração lamentável do "bem-estar". O problema é que os dois melhoraram sua possibilidade de consumo, de forma que é absurdo afirmar que a situação de "bem-estar" piorou!
É evidente, por outro lado, que quando a renda global cresce e diminui o índice de Gini, como também aconteceu no Brasil na última década, reforça-se a sensação de melhoria do "bem-estar" da sociedade, o que tem efeito nas urnas como as pesquisas eleitorais estão mostrando.
O combate à desigualdade social e à pobreza nos últimos vinte anos foi marcado pela melhoria dos gastos públicos, mas, no mesmo período, se avançou muito pouco na construção de um sistema tributário mais justo, afirmaRicardo Paes de Barros, um dos idealizadores do programa Bolsa Família e atual secretário de Ações Estratégicas do governo federal.
A entrevista é de Mariana Schreiber, publicada pelo portal da BBC Brasil, 27-05-2014.
Ou seja, o país continua taxando proporcionalmente mais a população de menor renda do que a parcela mais rica.
Apesar de reconhecer que seria importante mudar essa realidade, Paes de Barros diz que é possível continuar diminuindo a concentração de renda mesmo sem um sistema tributário mais distributivo.
Em entrevista à BBC Brasil, ele afirma que "ninguém estaria contra fazer mais" pela redução da desigualdade, mas ressalta que é difícil politicamente realizar uma reforma tributária de grande porte no país.
O uso dos tributos como ferramenta de distribuição de renda ganhou destaque mundial com o sucesso do livro O Capital no Século XXI, do francês Thomas Piketty, que revela o avanço recente da concentração de renda em vários países e propõe a elevação dos impostos sobre os mais ricos.
Apesar de reconhecer que a queda da desigualdade perdeu fôlego recentemente no país, Paes de Barros, que é referência no assunto, diz que no médio prazo a tendência ainda é de redução da concentração de renda, principalmente por causa do aumento da escolaridade da população.
"Para os próximos cinco anos, eu não vejo porque temos que seguir essa receita (de taxar mais os ricos) para continuar reduzindo a desigualdade", afirmou ele.
Eis a entrevista.
O francês Thomas Piketty diz que há aumento da concentração de renda sempre que o rendimento do capital (imóveis, empresas, aplicações financeiras) é maior que o crescimento da economia como um todo. Considerando que o PIB brasileiro tem crescido mais lentamente, isso pode estar acontecendo no Brasil?
O livro do Piketty é certamente fantástico para um problema central nos países ricos. O Brasil vive outro momento, nossas preocupações internas são um pouco diferentes. Os países ricos veem uma desigualdade crescente, a gente vê uma desigualdade declinante. Ele está preocupado com a distribuição funcional da renda entre capital e trabalho, e a gente está ainda preocupado com questão mais básicas como a desigualdade de renda entre os trabalhadores. Por que negros e brancos ganham diferente? Por que mulheres e homens ganham diferente? Qual o impacto do salário mínimo mais alto? Qual a consequência da informalidade?
A minha percepção é que a participação do trabalho na renda ainda está subindo no Brasil. A gente está numa perspectiva temporal diferente. Pode ser que numa perspectiva de mais longo prazo, a preocupação de que a renda vai se concentrar dramaticamente na mão de quem tem o capital seja central para todo o mundo que optou por um desenvolvimento capitalista. Mas isso não parece ser o grande desafio para o Brasil nos próximos cinco, dez anos.
Qual é o desafio?
O grande desafio parece ser como eu educo melhor a minha força de trabalho. No Brasil, o que está definindo a desigualdade é o retorno ao capital humano (remuneração paga de acordo com a qualificação do trabalhador). Todos os estudos mostram uma queda grande no retorno ao capital humano e isso que está reduzindo a desigualdade de renda no Brasil.
Acho que se fizer um plebiscito no Brasil todo mundo vai ser a favor do que o Piketty está propondo (uma taxa global sobre a riqueza e impostos maiores sobre os mais ricos nacionalmente), que é uma maneira de distribuir a renda do capital para os trabalhadores. Mas para os próximos cinco anos, eu não vejo porque temos que seguir essa receita para continuar reduzindo a desigualdade no Brasil.
Mas é sabido que no Brasil os pobres pagam proporcionalmente mais impostos que os ricos. Uma mudança no sistema tributário não aceleraria a queda da desigualdade?
Certamente, ninguém estaria contra fazer mais. Evidentemente que, na medida em que o rico está pagando proporcionalmente menos imposto que o pobre, isso está aumentando a desigualdade. Mas o problema maior do Brasil não é tanto o nível da carga tributária, mas arrumar a carga tributaria.
Parece não haver essa discussão dentro do governo, mesmo sendo um governo que tem a bandeira da redução da desigualdade.
Você tem "n" maneiras de reduzir a desigualdade, mas se você quiser reduzir a desigualdade via uma espécie de transferência que passe pelo governo, você vai ter que taxar as pessoas mais ricas e gastar com pessoas mais pobres. Acho que o governo tem, nos últimos 20 anos, uma política toda preocupada com gastar bem, no sentido de gastar com quem mais precisa. Você pode identificar em várias políticas um viés pró-pobre.
Todo mundo gostaria de fazer uma reforma tributária e ter um sistema não só mais redistributivo, mas também mais racional. Mas essa agenda não parece estar caminhando.
Eu tenho trabalhado muito mais em como discutir o gasto e saber se ele está sendo bem gasto. Não importa quem pagou - se você não gastar com aqueles que mais precisam, você não vai reduzir desigualdade. Certamente a gente precisa fazer o outro lado da história - cobrar de quem tem mais condição de pagar e de uma maneira mais racional. Talvez aí a gente tenha tido muito menos avanço nos últimos dez, vinte anos.
Por que não se avançou?
Do jeito que está (o sistema tributário) é irracional. Não atende ao interesse de ninguém - nem de trabalhadores, nem de empresários, nem do governo. A questão é que qualquer mexida não é neutra: alguns setores da economia vão ganhar e outros vão perder. Dificilmente você vai conseguir ter um consenso.
Acho que todos os países que tentaram fazer uma reforma tributária da magnitude que o Brasil precisa, encontraram dramática dificuldade. Então, não é questão de se eu quero ou não. É mais uma questão de ciência política.
O senhor disse que no Brasil o que preocupa mais hoje é a desigualdade de renda entre os trabalhadores, mas não há bons dados sobre os ganhos com capital físico e financeiro nas pesquisas domiciliares do IBGE. Dados da Receita Federal - que hoje não estão disponíveis publicamente - não poderiam mostrar melhor um outro lado dessa desigualdade?
Certamente os dados da
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