quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

O Capitalismo


‘O capitalismo sustentável é uma contradição em seus termos’ diz Eduardo Viveiros de Castro
Publicado na pagina da Unisinos, em dezembro 17, 2013.

Crítico feroz do neoliberalismo, de seus ícones e verdades, de suas políticas de “crescimento” que destroem a natureza, do consumo que empobrece as vidas, do Estado que as administra (não sem constrangimentos) e da esquerda (conservadora e antropocêntrica). “A felicidade, diz, tem muitos outros caminhos”.
Enquanto esperamos que a Tinta Limón Ediciones termine a edição (mais ou menos alterada) do livro de entrevistas com Eduardo Viveiros de Castro, o sítio Lobo Suelto! convida  à leitura da última – muito transcendental – conversa com o antropólogo brasileiro.
A entrevista é de Julia Magalhães, publicada por Lobo Suelto!, 04-12-2013. A tradução é do Cepat.
Eis a entrevista.
Qual é a sua percepção acerca da participação política da sociedade brasileira?
Prefiro começar com uma “des-generalização”: vejo a sociedade brasileira profundamente dividida em relação à visão sobre o país e seu futuro. A ideia de que existe “um” Brasil – no sentido de que as ideias de “unidade” e “brasilidade” não são triviais – parece uma ilusão politicamente conveniente (para os setores dominantes), mas antropologicamente equivocada. Há, pelo menos, dois ou muito mais “Brasis”.
O conceito geopolítico de estado-nação unificado não é descritivo, mas normativo. Há rachaduras profundas na sociedade brasileira. Há setores da população com uma vocação conservadora enorme, que não necessariamente compreendem uma classe específica, apesar de que as chamadas “classes médias”, ascendentes ou descendentes, estão bem representadas aqui. Grande parte da chamada “sociedade brasileira” – temo que seja a maioria – se sentiria muito satisfeita com um regime autoritário, especialmente se conduzido midiaticamente por uma autoridade paternal de personalidade forte. Mas, esta é uma das coisas que a minoria liberal que existe no país – e, inclusive, é uma certa minoria “progressista” – prefere manter-se envolta em um silêncio constrangedor. Repete-se o tempo todo, e para qualquer propósito, que o povo brasileiro é democrático, “cordial” e amante da liberdade e da fraternidade, o que é uma ilusão muito perigosa.
É assim que vejo a “participação política do povo brasileiro”: como a de um povo fragmentado, dividido, polarizado. Uma polarização que não necessariamente condiz com as divisões políticas (partidos oficiais etc.). O Brasil segue como uma sociedade visceralmente escravocrata, obstinadamente racista e moralmente covarde. Enquanto não nos darmos conta deste inconsciente, não iremos “em frente”.
Em outras ocasiões, fui claro: insurreições esporádicas e uma certa indiferença pragmática em relação aos poderes constituídos, é o que se evidência entre os mais pobres – ou os mais alheios ao drama montado pelos setores de cima, na escala social – que inspiram modestas utopias e moderado otimismo por parte daqueles que a história situou na confortável posição de “pensar o Brasil”. Nós, em suma.
O que é necessário para mudar isto?
Falar, resistir, insistir, olhar além do imediato. E, obviamente, educar. Mas, não “educar o povo” (como se a elite fosse muito educada e devesse – ou pudesse – conduzir o povo até um nível intelectual superior), mas criar as condições para que as pessoas se eduquem e acabem educando a elite – e, quem sabe, inclusive, se livrem dela.
O panorama da educação do Brasil é, hoje, o de um deserto. Um deserto! E não vejo nenhuma iniciativa consistente para tentar cultivar neste deserto. Pelo contrário, tenho pesadelos de conspirações, em que sonho que os projetos de poder não se interessam realmente em modificar o panorama da educação do Brasil: domesticar a força de trabalho – se é isto que está se tentando (ou planejando) – não é, de nenhuma maneira, o mesmo que educar.
Isto é apenas um pesadelo, obviamente: não é assim, não pode ser assim… Espero que não seja assim. Mas o fato é que não se vê uma iniciativa para mudar a situação. Considerando a espetacular abertura de dezenas de universidades sem a mínima infraestrutura física (para não falar de boas bibliotecas, um luxo quase impensável no Brasil), enquanto a escola secundária segue muito deficitária, com professores que ganham uma miséria, com as greves dos professores universitários reprimidas, como se fossem ladrões. A “falta” de educação – que é uma forma de instrução muito particular e perversa, imposta de cima para baixo – é talvez o principal fator responsável pelo conservadorismo reacionário de grande parte da sociedade brasileira. Por fim, é urgente uma reforma radical da educação brasileira.
Em “A floresta e a escola”, Oswald de Andrade sonhava. Infelizmente, parece que já deixamos de ter uma e ainda não temos a outra. Pois sem escola, já não cresce a floresta.
Por onde se começa a reforma da educação?
Começa-se de baixo, é claro, a partir da escola primária. A educação pública deveria ter uma política unificada, orientada a partir de uma – com perdão da expressão – “revolução cultural”. Ela não será alcançada através da redistribuição da renda (ou melhor, com o aumento da quantidade de migalhas que caem da mesa dos ricos) apenas para comprar um televisor e para assistir ao BBB, e ver a mesma merda. Não é assim que se redistribui a cultura, a educação, a ciência e a sabedoria. Deve-se oferecer ao povo as condições de fazer cultura ao invés de consumir aquela produzida “para” eles.
Está havendo uma melhora nos níveis de vida dos mais pobres, e talvez também nos da velha classe média. Uma melhora que vai durar todo o tempo em que a China continuar comprando do Brasil ao invés de comprar da África. Mas, apesar da melhora no chamado “nível de vida”, não vejo nenhuma melhora real na qualidade de vida, na vida cultural ou espiritual, se me permite usar essa palavra arcaica. Pelo contrário. Será que é necessário destruir as forças vivas, naturais e culturais das pessoas, do povo brasileiro de instrução, para construir uma sociedade economicamente mais justa? Duvido.
Neste cenário, atualmente, quais são os temas capazes de mobilizar a sociedade brasileira?
Vejo a “sociedade brasileira” magnetizada – ao menos em termos de sua autorrepresentação normativa, por parte dos meios de comunicação – por um patriotismo oco, uma espécie de besta orgulhosa, deslumbrados pela certeza de que, de uma vez por todas, o mundo se inclinou frente ao Brasil. Copa do MundoJogos Olímpicos… Não vejo mobilização acerca de temas urgentíssimos, como poderiam ser o da educação e da redefinição da nossa relação com a terra, quer dizer, com o que há debaixo do território. Natureza e cultura, enfim, que agora se encontram, não apenas, mediadas, midiatizadas, pelo mercado, mas mediocrizadas por ele. O Estado se uniu ao Mercado contra a natureza e a cultura.
E estas questões não mobilizam?
Existe certa preocupação da opinião pública por questões ambientais, um pouco mais do que em relação às questões da educação, o que não deixa de ser algo para se lamentar, pois as duas vão juntas. Contudo, tudo me parece “too little, too late”: muito pouco e muito tarde. Está se demorando tempo demais para difundir a consciência ambiental. Uma conscientização que o planeta requer, com absoluta urgência, de todos nós. E esta inércia se traduz na escassa pressão sobre os governos, corporações e empresas que apenas investem nesse conto chinês do “capitalismo verde”. Em particular, evidencia-se muito pouca pressão sobre as grandes empresas, sempre distraídas e incompetentes quando se trata do problema da mudança climática.
Não se vê a sociedade realmente mobilizada, por exemplo, por Belo Monte, uma monstruosidade provada e comprovada, mas que conta com o apoio desinformado (é o que se deduz) de uma parte significativa da população do sul e do sudeste, para onde irá a maior parte da energia que não for vendida – a um preço extremamente barato – para multinacionais de alumínio fazerem latas de saquê – no baixo Amazonas – para o mercado asiático.
Necessitamos de um discurso político mais agressivo em relação às questões ambientais. É necessário, sobretudo, falar com as pessoas, chamar a atenção a respeito de que o saneamento básico é um problema ambiental, de que a dengue é um problema ambiental.  Não se pode separar a dengue do desmatamento e do saneamento. Temos que convencer aos mais pobres de que melhorar as condições ambientais é assegurar as condições de existência das pessoas.
No entanto, a esquerda tradicional, como está sendo demonstrado, apresenta-se completamente inútil para articular um discurso sobre os temas ambientais. Quando suas cabeças mais pensantes falam, parece haver a sensação de estar “indo para trás”, tratando desastradamente de capturar e de reduzir um tema novo ao já conhecido, um problema muito real que não está em seu DNA ideológico e filosófico. Mesmo quando a esquerda não se alinha com o insustentável projeto “ecocida” do capitalismo, revela sua origem comum a este, com as névoas e obscuridades da metafísica antropocêntrica do cristianismo.
Enquanto continuarmos sustentando que melhorar a vida das pessoas é lhes dar mais dinheiro para comprar uma televisão, ao invés de melhorar o saneamento, abastecimento de água, saúde e educação primária, nada mudará. Escuta-se o governo dizer que a solução é consumir mais, mas não se percebe a menor ênfase para abordar estes aspectos literalmente fundamentais da vida humana nas condições do presente século.
Isto não significa, obviamente, que os mais favorecidos pensem melhor e que possam ver além dos mais pobres. Não há nada mais estúpido que estas Land Rovers que vemos em São Paulo ou no Rio de Janeiro, andando com adesivos do Greenpeace, de slogans ecológicos, coladas no para-brisa. As pessoas vão às ruas nestes 4×4 e bebem um diesel venenoso… Gente que pensa que o contato com a natureza é fazer um Rally no Pantanal
É uma questão difícil: falta educação básica, falta o compromisso dos meios de comunicação, falta agressividade política no tratamento da questão do meio ambiente.
E sempre que se pensa que existe um problema ambiental, algo que está longe de ser o caso dos governantes atuais, estes mostram, ao contrário, e, por exemplo, a preocupação em formar jovens que possam manobrar com segurança e, ao mesmo tempo, mantém firme sua aposta no transporte individual, em carros, em uma cidade como São Paulo, em que já não cabe nem uma agulha. Um governo que não se cansa de se orgulhar pela quantidade de carros produzidos por ano. É absurdo utilizar os números da produção de veículos como um indicador de prosperidade econômica. Essa é uma proposta podre, uma visão estreita e uma proposta muito empobrecedora para o país.
Você está dizendo que os apelos ao consumo vêm do próprio governo, mas também há um apelo muito forte procedente do mercado. Como avalia isto?
O Brasil é um país capitalista periférico. O capitalismo industrial-financeiro é visto por quase todo o mundo como uma evidência palpável, o modo inevitável em que se vive no mundo atual. Diferentemente de alguns companheiros de caminhada, eu entendo que o capitalismo sustentável é uma contradição em seus termos. E que nossa atual forma de vida econômica é realmente evitável. Então, simplesmente, nossa forma de vida biológica (quer dizer, a espécie humana) não será mais necessária e a Terra irá favorecer outras alternativas.
As ideias de crescimento negativo, ou de objeção ao crescimento, ou a ética da suficiência são incompatíveis com a lógica do capital. O capitalismo depende do crescimento contínuo. A ideia de manter certo nível de equilíbrio em relação ao intercâmbio de energia com a natureza não se ajusta na matriz econômica do capitalismo.
Este impasse, gostemos ou não, será “resolvido” pelas condições termodinâmicas do planeta em um período muito mais curto do que pensávamos. As pessoas fingem não saber o que está se passando, preferem não pensar nisso, mas o fato é que temos que nos preparar para o pior. E o Brasil, pelo contrário, sempre se prepara para o melhor. Este otimismo nacional frente a uma situação planetária é extremamente preocupante, assim como perigoso… E a aposta de que vamos bem dentro do capitalismo é um tanto ingênua, se não desesperada…
O Brasil segue como um país periférico, uma plantação “high tech” que abastece com matérias-primas o capitalismo central. Vivemos de exportar nossa terra e nossa água em forma de soja, açúcar, carne bovina, para os países industrializados: são estes quem têm a última palavra, os que controlam o mercado. Estamos bem neste momento, mas de modo nenhum em condições de controlar a economia mundial. Se a coisa muda um pouco para um lado ou para o outro, o Brasil simplesmente pode perder esse lugar no qual se encontra hoje. Para não mencionar, claro, o fato de que estamos vivendo uma crise econômica mundial que se tornou explosiva em 2008, que está longe de terminar e que ninguém sabe aonde irá parar. O Brasil, neste momento de crise, é uma espécie de contracorrente do tsunami, mas quando a onda quebrar vai molhar muita gente. Deve-se falar sobre estas coisas.
E como você avalia a macropolítica em relação a esta realidade, as políticas macroeconômicas, com as realidades rurais do Brasil, os indígenas ribeirinhos?
O projeto de Brasil, que tem a atual coalizão do governo sob o mando do Partido dos Trabalhadores (PT), considera os ribeirinhos, os indígenas, os campesinos, os quilombolas como pessoas com atraso, um atraso sociocultural, e que devem ser conduzida para outro estado. Esta é uma concepção tragicamente equivocada. O PT é visceralmente paulista, o projeto é uma “paulistização” do Brasil. Transformar o interior do país em um país de fantasia: muita festa de peão de vaqueiro, caminhonetes 4×4, muita música country, botas, chapéus, rodeios, touros, eucaliptos, gaúchos. E do outro lado, cidades gigantescas e impossíveis como São Paulo.
PT vê a Amazônia brasileira como um lugar para civilizar, para domar, para obter benefícios econômicos, para capitalizar. Em uma lamentável continuidade entre a geopolítica da ditadura e a do governo atual, este é o velho “bandeirantismo” que hoje faz parte do projeto nacional. Mudaram as condições políticas formais, mas a imagem do que é ou deveria ser a civilização brasileira, daquilo que é uma vida digna de ser vivida, do que é uma sociedade que está em sintonia consigo mesmo, é muito, muito similar.
Estamos vendo hoje uma ironia muito dialética: o governo, liderado por uma pessoa perseguida e torturada pela ditadura, realizando um projeto de sociedade que foi adotado e implementado por esta mesma ditadura: a destruição da Amazônia, a mecanização, a “transgenização” e a “agrotoxicação” da agricultura, migração induzida pelas cidades.
E por detrás de tudo isso, certa ideia de Brasil que se vê, no início do século XXI, como se devesse ser, ou como se fosse, o que os Estados Unidos eram no século XX. A imagem que o Brasil tem de si mesmo é, em vários aspectos, aquela projetada pelos Estados Unidos nos filmes de Hollywood nos anos 50: muitos carros, muitas autopistas, muitas geladeiras, muitas televisões, todo mundo feliz. Quem pagou por tudo isso? Entre outros, nós. Quem irá nos pagar agora? A África, outra vez? Haiti?Bolívia? Para não falar da massa de infelicidade bruta gerada por esta forma de vida (e de quem se enriquece com isto).
Isto é o que vejo com tristeza: cinco séculos de maldade continuam aí. Sarney é um capitão hereditário, como os que vieram de Portugal para saquear e devastar a terra dos índios. Nosso governo “de esquerda” governa com a permissão da oligarquia e necessita destes capangas para governar. Pode-se fazer várias coisas, desde que a melhor parte fique com ela. Toda vez que o governo ensaia uma medida que a ameaça, o Congresso – que sabemos como é eleito –, a imprensa bombardeia, o PMDB sabota.
Há uma série de becos para os quais eu não vejo saída ou que não têm saída no jogo da política tradicional, com suas regras. Vejo um caminho possível pelo lado do movimento social – que hoje está desmobilizado. Mas, se não for pelo lado do movimento social, seguiremos vivendo neste paraíso subjetivo de que um dia tudo vai ficar bem. O Brasil é um país dominado politicamente pelos grandes proprietários de terra e grandes empreiteiros que jamais sofreram uma reforma agrária e ainda dizem que atualmente não é mais necessário fazê-la.
Acredita que as coisas começarão a mudar quando chegarmos a um limite?
É provável que a crise econômica mundial afete ao Brasil em algum momento próximo. Contudo, o que vai ocorrer, com certeza, é que o mundo vai passar por uma transição ecológica, climática e demográfica muito intensa durante os próximos 50 anos, com epidemias, fome, secas, catástrofes, guerras, invasões. Estamos vendo como as condições climáticas mudaram muito mais rápido do que pensávamos. E há grandes possibilidades de desastres, de perdas de colheitas, de crises alimentares. Neste meio tempo, hoje em dia, o Brasil até se beneficia, mas um dia a fatura irá chegar. Climatologistas, geofísicos, biólogos e ecologistas são profundamente pessimistas sobre o ritmo, as causas e consequências da transformação das condições ambientais em que se desenvolve a vida atual da espécie. Por que deveríamos ser otimistas?
Acredito que se deve insistir que é possível ser feliz sem ficar hipnotizado por este frenesi de consumo que os meios de comunicação impõem. Não sou contrário ao crescimento econômico no Brasil, não sou tão estúpido para pensar que tudo se resolveria mediante a distribuição do dinheiro de Eike Batista entre os agricultores do nordeste semiárido ou cortando os subsídios à classe política-mafiosa que governa o país. Não que não seja uma boa ideia. Sou contrário, isto sim, ao crescimento da “economia” do mundo, e sou a favor de uma redistribuição das taxas de crescimento. E também sou, obviamente, a favor de que todos possam comprar uma geladeira e, por que não, uma televisão. Sou a favor de uma maior utilização das tecnologias solar e eólica. E estaria encantado em deixar de dirigir o carro, se pudéssemos trocar este meio de transporte absurdo por soluções mais inteligentes.
E como vê os jovens neste contexto?
É muito difícil falar de uma geração a qual não se pertence. Nos anos 1960, tínhamos ideias confusas, mas ideais claros: pensávamos que poderíamos mudar o mundo e imaginávamos que tipo de mundo queríamos. Acredito que, em geral, os horizontes utópicos têm retrocedido enormemente.
Algum movimento recente no Brasil ou no mundo chamou a sua atenção?
No Brasil, a aceleração difusa do que poderíamos chamar de uma cultura “agro-sulista”, tanto da direita quanto da esquerda, pelo interior do país. Vejo isto como a consumação do projeto de branqueamento da nacionalidade, deste modo muito peculiar da elite governante no poder acertar as contas com seu próprio passado (passado?) escravista.
Outra mudança importante é a consolidação de uma cultura popular vinculada ao movimento evangélico popular. O evangelismo da Igreja Universal do Reino de Deus associa, por certo, a religião ao consumo.
O como você vê o surgimento das redes sociais, nesse contexto?
Essa é uma das poucas coisas a respeito das quais sou muito otimista: o relativo e progressivo enfraquecimento do controle total dos meios de comunicação de cinco ou seis conglomerados midiáticos. Esse enfraquecimento está muito vinculado à proliferação das redes sociais, que são grande novidade na sociedade brasileira e que estão contribuindo para que circule um tipo de informação que não tinha lugar na imprensa oficial. E estão habilitando formas, antes impossíveis, de mobilização. Há movimentos inteiramente produzidos pelas redes sociais, como a marcha contra a homofobia, o churrasco da “gente diferenciada”, os diversos movimentos contra Belo Monte, a mobilização pelas florestas.
As redes são nossa saída de emergência frente à aliança mortal entre o governo e os meios de comunicação. São um fator de desestabilização – no melhor sentido da palavra – do poder dominante. Se puder ocorrer alguma mudança importante na cena política, acredito que será através da mobilização pelas redes sociais.
E por isso se intensificam as tentativas de controlar estas redes, em todo o mundo, por parte do poder constituído. Contudo, controlar o acesso é um instrumento vergonhoso, como o caso do “projeto” da banda larga brasileira, que parte do reconhecimento de que o serviço será de baixa qualidade. Uma decisão tecnológica e política antidemocrática e antipopular, equivalente ao que se faz com a educação: impedir que a população tenha acesso pleno à circulação das produções culturais.
Parece, às vezes, que haveria uma conspiração para evitar que os brasileiros tenham uma boa educação e um acesso à Internet de qualidade. Essas duas coisas andam de mãos dadas e têm o mesmo efeito, que é o aumento da inteligência social que, diga-se de passagem, é necessário vigiar com muito cuidado.
Você imagina um novo modelo político?
Um amigo que trabalhava no Ministério do Meio Ambiente, na época de Marina Silva, criticava-me dizendo que meu discurso, feito à distância do Estado, era romântico e absurdo, que tínhamos que tomar o poder. Eu respondia que, se tomássemos o poder, tínhamos que, sobretudo, saber como mantê-lo depois, pois aí é que a coisa se complica. Não tenho um desenho, um projeto político para o Brasil, eu não pretendo saber o que é melhor para o povo brasileiro em geral, e em seu conjunto. Só posso expressar minhas preocupações e indignações, apenas aí é que me sinto seguro.
Penso, de qualquer forma, que se deve insistir na ideia de que o Brasil tem – ou a esta altura tinha – as condições geográficas, ecológicas, culturais para desenvolver um novo estilo de civilização, que não seja uma cópia empobrecida do modelo da América do Norte e da Europa. Poderíamos começar a experimentar, timidamente, algum tipo de alternativa aos paradigmas tecno-econômicos desenvolvidos na Europa moderna.
Todavia, imagino que se algum país do mundo irá fazer isso, esse país é a China. É certo que os chineses têm 5.000 anos de história cultural praticamente contínua e o que nós temos para oferecer são apenas 500 anos de dominação europeia e uma triste história de etnocídio, deliberado ou não. Ainda assim, é imperdoável a falta de inventividade da sociedade brasileira – ao menos de sua elite política e intelectual – que já perdeu várias ocasiões de gerar soluções socioculturais – tal como o povo brasileiro historicamente ofereceu – e articular, assim, uma civilização brasileira minimamente diferente da que propõem os comerciais de televisão.
Temos que mudar completamente e, primeiramente, a relação secularmente depredadora da sociedade nacional com a natureza, com a base físico-biológica de sua própria nacionalidade. Já é hora de começar uma nova relação com o consumo, menos ansioso e mais realista frente à situação de crise atual. A felicidade tem muitos outros caminhos.
(EcoDebate, 17/12/2013) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

Fórum Social Mundial

[Anexos de =?UTF-8?Q?Jos=C3=A9_Antonio_dos_Santos_da_Silva?= incluídos abaixo]
Prezados(as).
As inscrições para atividades para o Fórum Social Temático: Crise Capitalista, Democracia, Justiça Social e ambiental, continuam abertas através do Site - www.forumsocialportoalegre.org.br e os que tiverem interesse de realizar sua atividade no Espaço Ubuntu, coloquem na sua inscrição que daremos retorno.
Já estamos recebendo confirmações de importantes Companheiros(as) de Entidades Nacionais, que estão inscrevendo suas atividades e logo logo estaremos divulgando em nosso blog - http://www.mnegrofsmtpoa.blogspot.com.br/ para que todos(as) possam acompanhar a grade de atividades que esta sendo proposta.
Precisamos consolidar uma força e união para que em 2015, possamos estar trazendo de volta a sua origem o “Fórum Social Mundial”, nascido aqui na cidade de Porto Alegre/RS/Brasil.
Vamos mobilizar e convidar pessoas para estarem em Porto Alegre, em janeiro de 2014, para fortalecer o retorno do Fórum Social Mundial para Porto Alegre em 2015.
Forte Abraço.
Asè.

José Antonio dos Santos da Silva
Skype: jass_rs
__._,_.___
Anexo(s) de =?UTF-8?Q?Jos=C3=A9_Antonio_dos_Santos_da_Silva?=
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Caçamba de Entulhos Público

Várias grandes cidades e médias possuem o tele-entulho as caçambas públicas de retirada de entulhos. Aqui em Vacaria a "iluminada" Prefeitura de Vacaria resolveu não prestar mais esse serviço e privilegiar empresas privadas para fazer esse serviço tendo custo que as pessoas não querem pagar e outras não podem pagar os valores. A cidade está suja devido a isso, é sofá, geladeira e outros entulhos nas esquinas sem o recolhimento. Aliás essa empresa que está prestando serviço de recolhimento de lixo, o serviço lamentável. O Prefeito turista que mora na cidade da fantasia e só dá entrevistas nas rádios que falam fantasia, aliás vivem de ilusão, montando uma cidade dos sonhos que não existe.

Prefeitura de Bom Jesus RS

Boa tarde!
Segue matéria e foto desta semana da Prefeitura Municipal de Bom Jesus.
Dar um OK de recebimento

Um feliz ano novo. Muita paz, amor e prosperidade.

Att;
Fabiana Soares
Assessora de Imprensa da Prefeitura Municipal de Bom Jesus

Brasil de Fato



BrasildeFato-SP EDIÇÃO 16- 27 dezembro de 2013  a 9 janeiro 2014
Leia e baixe o novo número do Brasil de Fato SP

Nesta semana:
- Retrospectiva Nacional » 4 » Destaques foram a “cura gay”, Mensalão,
cartel no metrô e ainda se pergunta: “Cadê o amarildo?”
- Jornada de Junho » 3 » Os protestos que marcaram 2013
- Retrospectiva Mundo » 9 » Mortes de líderes políticos, espionagem e
conflitos; mas o Uruguai traz boas notícias
- Zodíaco » 11 » Dicas e superstições para uma virada de ano em alto astral
- ENTREVISTA » 6 » Ivan Valente: “Manifestações de junho conseguiram
destravar a luta popular”

http://issuu.com/brasildefatosp/docs/bdf-sp_16

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ENTREVISTA: IVAN VALENTE
“Manifestações de junho conseguiram destravar a luta popular”
por Vivian Fernandes, do Brasil de Fato SP
Ivan Valente é deputado federal pelo estado de São Paulo, além de ser engenheiro e professor. Foi eleito com mais de 189 mil votos. No histórico político desse paulistano, estão ainda a militância estudantil nos anos de 1960 e a luta contra a ditadura militar. Membro do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) desde 2005, Valente integrou o Partido dos Trabalhadores (PT) até 2005.
Em entrevista ao Brasil de Fato SP, o deputado avalia o ano de 2013, que considera “atípico” e importante devido à dimensão que ganharam as lutas sociais. “O movimento social de junho conseguiu destravar as lutas e a participação popular”, afirma.
Como você avalia a discussão sobre a Reforma Política no Congresso?
Todo o descontentamento popular que surgiu ao longo do ano poderia ter desembocado numa pressão popular direta pela Reforma Política. Os pontos principais são financiamento público exclusivo de campanha, fim do financiamento privado, fortalecimento dos partidos políticos e o protagonismo popular, com referendo, plebiscito e projetos de iniciativa popular. Mas isso não aconteceu. A Constituinte exclusiva e o plebiscito rigorosamente não avançaram. Faz dois anos que tem uma comissão especial discutindo Reforma Política no Congresso. E não avançou.
Por que essa pauta não avança?
Não sairá do Congresso uma verdadeira reforma política de interesse popular. As manifestações de junho deram um salto, no sentido da consciência da necessidade de uma profunda reformulação política. O avanço do Congresso foi pífio. Fechamos uma minirreforma eleitoral, que é uma conveniência partidária. Na reforma política, a gente não avançou. Até retrocedeu. Se não houver uma nova mobilização pesada, podemos ter retrocessos. Os projetos da OAB, do movimento contra a corrupção e de alguns partidos políticos pela reforma política por iniciativa popular são o único caminho.
E a discussão da democratização dos meios de comunicação?
Houve avanços importantes e está para ocorrer um salto de qualidade no Congresso. Os grandes meios televisivos trataram o movimento de junho, inicialmente, como de vandalismo e baderna. Foram obrigados a reconhecer depois que o movimento era absolutamente legítimo. Um setor importante dos movimentos de junho identificou nos meios de comunicação os aliados do sistema. Estamos votando também o Marco Civil da Internet. O relatório do deputado Alessandro Molon (PT-RJ) tem avanços importantes em matéria de liberdade de expressão, de defesa da privacidade e de neutralidade da rede. Há uma elevação de consciência em torno da necessidade radical de democratização dos meios de comunicação.
Houve mudanças em outros países da América Latina.
Estamos muito atrasados nisso. É só ver a Lei de Meios da Argentina, que arrebentou com o principal grupo de mídia de lá, que é o Clarín, através da lei aprovada no Congresso, por iniciativa do governo Kirchner. No Brasil, o governo é covarde em relação aos meios de comunicação. Começa pelo Ministério das Comunicações, que não luta contra o poder da mídia e permite que a dominação se perpetue. É interessante desconcentrar os meios de comunicação e dar poder às mídias alternativas, sindicais, populares e às ninjas.
Como você avalia as denúncias em torno do cartel das obras do Metrô do governo do estado?
Há seis anos o nosso mandato parlamentar e outros, como os do PT, fazem denúncias do Metrô e do caso Alstom [uma das empresas que fazem as obras]. Há um conluio geral dos meios de comunicação, que protegem os tucanos, com o Ministério Público de São Paulo, que é omisso em relação à investigação. É um escândalo monumental esse da Siemens, que apareceu como delação premiada, e voltou ao debate da Alstom. Todo o sistema de concessões de São Paulo – de eletricidade, do Metrô e da CPTM – está contaminado, com prejuízos monumentais. Isso é responsabilidade dos governos tucanos do Mário Covas, do Alckmin e do Serra.
Por que essas denúncias não ganham força na mídia?
Há um sistema de blindagem que a grande mídia patrocinou e foi tão escancarado que veio à tona. Tentamos criar uma CPI no Congresso. O PT se adiantou, mas não tocou adiante. A construção do Metrô de São Paulo é corrupção misturada com falta de planejamento e incompetência. São vinte anos de governo para fazer 20 quilômetros de metrô com todos esses escândalos. É um caso inédito. Vai ter um impacto na campanha eleitoral.
Como o senhor avalia o ano que passou?
Tivemos um ano atípico. Uma explosão de participação social e popular ocorreu depois de muitos anos. Não que não tenha havido lutas em anos anteriores. Há lutas permanentes dos movimentos sociais, populares, estudantis e da juventude. Mas a importância está na dimensão que ganharam as lutas da questão urbana. O movimento social de junho conseguiu destravar as lutas e a participação popular. Provou que é possível obter vitórias. E isso foi demonstrado na conquista da redução da passagem do transporte público.
Como essas lutas impactaram o Congresso Nacional?
Essas lutas tiveram alguma incidência no Congresso. Em matéria da agilidade da votação de projetos, tivemos uma aceleração importante. O ano de 2013 vinha sendo marcado por uma ofensiva conservadora, que não foi abolida. Por exemplo, em relação às questões colocadas pela bancada do agronegócio, particularmente, sobre a invasão das terras indígenas, a retirada de direitos e a não demarcação. Ainda tem muito conservadorismo nesse processo, mas o que tornou o ano atípico foi que a sensibilidade social chegou ao Congresso.
Qual foi a postura do Congresso durante o mês de junho?
A postura do Congresso, em um primeiro momento, foi de surpresa com as manifestações, acompanhando a grande mídia. Os setores mais conservadores acharam que era muito bom a juventude ir para as ruas e que era preciso ouvir as manifestações. No entanto, quando as manifestações atingiram a Copa das Confederações - com movimentações maiores fora dos estádios do que o público dentro - voltou o discurso da baderna e de que era preciso conter a violência.
Houve um questionamento da legitimidade dos protestos.
As manifestações seriam legítimas, mas o enfrentamento e o conflito não seriam. A legitimidade das reivindicações está dada pela capacidade do povo de impor as suas reivindicações. Ele encontra barreiras para isso, como a Polícia Militar e os meios de comunicação. Havia uma consciência de que a cobertura dos meios de comunicação era parcial. Mas a mídia se sentiu ameaçada quando os jornalistas não puderam mais cobrir as manifestações de perto. Isso tem impacto no Congresso, que é reflexo da divisão de classes na sociedade.
Como o senhor avalia as críticas à participação dos partidos nas mobilizações?
Há um imenso desgaste da representação político-partidária. Os partidos da ordem foram duramente rechaçados. Vários partidos de tradição conservadora tentaram se aproveitar, inclusive retirando todas as bandeiras de partidos. Tem partidos que tinham tradição de esquerda, que com seu governismo empedernido não representam mais os anseios populares.
Por quê?
Isso é um rechaço natural aos partidos. A maioria das matérias que vão à votação no Congresso, em particular de política econômica, privilegia os grandes grupos econômicos, como privatizações e isenções fiscais. Enquanto se gasta metade do orçamento público pagando juros e amortizações da dívida pública para os banqueiros nacionais e internacionais, não tem dinheiro para saúde, educação, meio ambiente e saneamento básico. E isso se traduziu em uma palavra de ordem que era: “nós queremos o padrão Fifa para a saúde e a educação”.
Quais foram as diferenças dessas manifestações antipartido?
Tem um sentimento que são de dois lados. Um de direita que acha que não devem existir partidos políticos. E outro autonomista ou anarquista que acha que os partidos atrapalham. Os dois estão errados, porque os partidos fazem parte da democracia. As bandeiras fazem parte das manifestações, sejam do movimento popular, social ou partidário. Esse rechaço ocorreu em um primeiro momento, tanto que as bandeiras depois reapareceram.
Como você diferencia direita e esquerda nos tempos atuais?
O sentimento mais frequente é daquele filósofo italiano [referência a Norberto Bobbio] que diz o seguinte: se você quiser identificar a esquerda, você coloca aqueles que de alguma forma estão do lado dos de baixo, dos oprimidos e injustiçados, e que querem igualdade social. E os conservadores, os de direita, são aqueles que estão do lado da propriedade privada, do lado da concentração da riqueza, de valores tradicionalistas. Essa ideia de que não existe mais direita e esquerda serve à direita. Essa despolitização de que não precisa de programa nem de ideologia é uma ideologia de direita. Continuam existindo valores, ideias e ideologias que caracterizam uma posição de esquerda.•


    Brasil de Fato


    BrasildeFato-SP EDIÇÃO 16- 27 dezembro de 2013  a 9 janeiro 2014
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    Nesta semana:
    - Retrospectiva Nacional » 4 » Destaques foram a “cura gay”, Mensalão,
    cartel no metrô e ainda se pergunta: “Cadê o amarildo?”
    - Jornada de Junho » 3 » Os protestos que marcaram 2013
    - Retrospectiva Mundo » 9 » Mortes de líderes políticos, espionagem e
    conflitos; mas o Uruguai traz boas notícias
    - Zodíaco » 11 » Dicas e superstições para uma virada de ano em alto astral
    - ENTREVISTA » 6 » Ivan Valente: “Manifestações de junho conseguiram
    destravar a luta popular”

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    ENTREVISTA: IVAN VALENTE
    “Manifestações de junho conseguiram destravar a luta popular”
    por Vivian Fernandes, do Brasil de Fato SP
    Ivan Valente é deputado federal pelo estado de São Paulo, além de ser engenheiro e professor. Foi eleito com mais de 189 mil votos. No histórico político desse paulistano, estão ainda a militância estudantil nos anos de 1960 e a luta contra a ditadura militar. Membro do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) desde 2005, Valente integrou o Partido dos Trabalhadores (PT) até 2005.
    Em entrevista ao Brasil de Fato SP, o deputado avalia o ano de 2013, que considera “atípico” e importante devido à dimensão que ganharam as lutas sociais. “O movimento social de junho conseguiu destravar as lutas e a participação popular”, afirma.
    Como você avalia a discussão sobre a Reforma Política no Congresso?
    Todo o descontentamento popular que surgiu ao longo do ano poderia ter desembocado numa pressão popular direta pela Reforma Política. Os pontos principais são financiamento público exclusivo de campanha, fim do financiamento privado, fortalecimento dos partidos políticos e o protagonismo popular, com referendo, plebiscito e projetos de iniciativa popular. Mas isso não aconteceu. A Constituinte exclusiva e o plebiscito rigorosamente não avançaram. Faz dois anos que tem uma comissão especial discutindo Reforma Política no Congresso. E não avançou.
    Por que essa pauta não avança?
    Não sairá do Congresso uma verdadeira reforma política de interesse popular. As manifestações de junho deram um salto, no sentido da consciência da necessidade de uma profunda reformulação política. O avanço do Congresso foi pífio. Fechamos uma minirreforma eleitoral, que é uma conveniência partidária. Na reforma política, a gente não avançou. Até retrocedeu. Se não houver uma nova mobilização pesada, podemos ter retrocessos. Os projetos da OAB, do movimento contra a corrupção e de alguns partidos políticos pela reforma política por iniciativa popular são o único caminho.
    E a discussão da democratização dos meios de comunicação?
    Houve avanços importantes e está para ocorrer um salto de qualidade no Congresso. Os grandes meios televisivos trataram o movimento de junho, inicialmente, como de vandalismo e baderna. Foram obrigados a reconhecer depois que o movimento era absolutamente legítimo. Um setor importante dos movimentos de junho identificou nos meios de comunicação os aliados do sistema. Estamos votando também o Marco Civil da Internet. O relatório do deputado Alessandro Molon (PT-RJ) tem avanços importantes em matéria de liberdade de expressão, de defesa da privacidade e de neutralidade da rede. Há uma elevação de consciência em torno da necessidade radical de democratização dos meios de comunicação.
    Houve mudanças em outros países da América Latina.
    Estamos muito atrasados nisso. É só ver a Lei de Meios da Argentina, que arrebentou com o principal grupo de mídia de lá, que é o Clarín, através da lei aprovada no Congresso, por iniciativa do governo Kirchner. No Brasil, o governo é covarde em relação aos meios de comunicação. Começa pelo Ministério das Comunicações, que não luta contra o poder da mídia e permite que a dominação se perpetue. É interessante desconcentrar os meios de comunicação e dar poder às mídias alternativas, sindicais, populares e às ninjas.
    Como você avalia as denúncias em torno do cartel das obras do Metrô do governo do estado?
    Há seis anos o nosso mandato parlamentar e outros, como os do PT, fazem denúncias do Metrô e do caso Alstom [uma das empresas que fazem as obras]. Há um conluio geral dos meios de comunicação, que protegem os tucanos, com o Ministério Público de São Paulo, que é omisso em relação à investigação. É um escândalo monumental esse da Siemens, que apareceu como delação premiada, e voltou ao debate da Alstom. Todo o sistema de concessões de São Paulo – de eletricidade, do Metrô e da CPTM – está contaminado, com prejuízos monumentais. Isso é responsabilidade dos governos tucanos do Mário Covas, do Alckmin e do Serra.
    Por que essas denúncias não ganham força na mídia?
    Há um sistema de blindagem que a grande mídia patrocinou e foi tão escancarado que veio à tona. Tentamos criar uma CPI no Congresso. O PT se adiantou, mas não tocou adiante. A construção do Metrô de São Paulo é corrupção misturada com falta de planejamento e incompetência. São vinte anos de governo para fazer 20 quilômetros de metrô com todos esses escândalos. É um caso inédito. Vai ter um impacto na campanha eleitoral.
    Como o senhor avalia o ano que passou?
    Tivemos um ano atípico. Uma explosão de participação social e popular ocorreu depois de muitos anos. Não que não tenha havido lutas em anos anteriores. Há lutas permanentes dos movimentos sociais, populares, estudantis e da juventude. Mas a importância está na dimensão que ganharam as lutas da questão urbana. O movimento social de junho conseguiu destravar as lutas e a participação popular. Provou que é possível obter vitórias. E isso foi demonstrado na conquista da redução da passagem do transporte público.
    Como essas lutas impactaram o Congresso Nacional?
    Essas lutas tiveram alguma incidência no Congresso. Em matéria da agilidade da votação de projetos, tivemos uma aceleração importante. O ano de 2013 vinha sendo marcado por uma ofensiva conservadora, que não foi abolida. Por exemplo, em relação às questões colocadas pela bancada do agronegócio, particularmente, sobre a invasão das terras indígenas, a retirada de direitos e a não demarcação. Ainda tem muito conservadorismo nesse processo, mas o que tornou o ano atípico foi que a sensibilidade social chegou ao Congresso.
    Qual foi a postura do Congresso durante o mês de junho?
    A postura do Congresso, em um primeiro momento, foi de surpresa com as manifestações, acompanhando a grande mídia. Os setores mais conservadores acharam que era muito bom a juventude ir para as ruas e que era preciso ouvir as manifestações. No entanto, quando as manifestações atingiram a Copa das Confederações - com movimentações maiores fora dos estádios do que o público dentro - voltou o discurso da baderna e de que era preciso conter a violência.
    Houve um questionamento da legitimidade dos protestos.
    As manifestações seriam legítimas, mas o enfrentamento e o conflito não seriam. A legitimidade das reivindicações está dada pela capacidade do povo de impor as suas reivindicações. Ele encontra barreiras para isso, como a Polícia Militar e os meios de comunicação. Havia uma consciência de que a cobertura dos meios de comunicação era parcial. Mas a mídia se sentiu ameaçada quando os jornalistas não puderam mais cobrir as manifestações de perto. Isso tem impacto no Congresso, que é reflexo da divisão de classes na sociedade.
    Como o senhor avalia as críticas à participação dos partidos nas mobilizações?
    Há um imenso desgaste da representação político-partidária. Os partidos da ordem foram duramente rechaçados. Vários partidos de tradição conservadora tentaram se aproveitar, inclusive retirando todas as bandeiras de partidos. Tem partidos que tinham tradição de esquerda, que com seu governismo empedernido não representam mais os anseios populares.
    Por quê?
    Isso é um rechaço natural aos partidos. A maioria das matérias que vão à votação no Congresso, em particular de política econômica, privilegia os grandes grupos econômicos, como privatizações e isenções fiscais. Enquanto se gasta metade do orçamento público pagando juros e amortizações da dívida pública para os banqueiros nacionais e internacionais, não tem dinheiro para saúde, educação, meio ambiente e saneamento básico. E isso se traduziu em uma palavra de ordem que era: “nós queremos o padrão Fifa para a saúde e a educação”.
    Quais foram as diferenças dessas manifestações antipartido?
    Tem um sentimento que são de dois lados. Um de direita que acha que não devem existir partidos políticos. E outro autonomista ou anarquista que acha que os partidos atrapalham. Os dois estão errados, porque os partidos fazem parte da democracia. As bandeiras fazem parte das manifestações, sejam do movimento popular, social ou partidário. Esse rechaço ocorreu em um primeiro momento, tanto que as bandeiras depois reapareceram.
    Como você diferencia direita e esquerda nos tempos atuais?
    O sentimento mais frequente é daquele filósofo italiano [referência a Norberto Bobbio] que diz o seguinte: se você quiser identificar a esquerda, você coloca aqueles que de alguma forma estão do lado dos de baixo, dos oprimidos e injustiçados, e que querem igualdade social. E os conservadores, os de direita, são aqueles que estão do lado da propriedade privada, do lado da concentração da riqueza, de valores tradicionalistas. Essa ideia de que não existe mais direita e esquerda serve à direita. Essa despolitização de que não precisa de programa nem de ideologia é uma ideologia de direita. Continuam existindo valores, ideias e ideologias que caracterizam uma posição de esquerda.•

    2014

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    José Antonio dos Santos da Silva
    Skype: jass_rs

    A Classe Trabalhadora

    ‘A classe trabalhadora precarizada e super explorada vai decidir a eleição’

    30.dezembro.2013 | 1:00 estadão
    Jessé de Souza (Foto: Marcelo Carnaval/Agência O Globo)
    Após revelar a ‘ralé e os batalhadores’ brasileiros, o sociólogo Jessé de Souza prepara imersão nos ‘endinheirados’. “A busca é a interpretação crítica da sociedade contemporânea.”
    Ele estuda as classes sociais há vinte anos. Mas foi em meados de 2009, já no final do governo Lula, que mergulhou em uma pesquisa sociológica – empírica e teórica, por todo o Brasil – para confrontar a tese de que havia surgido uma “nova classe média” no País. O resultado? O livro Os Batalhadores Brasileiros.
    Nele, Jessé de Souza, doutor em Sociologia pela Universidade de Heidelberg, na Alemanha, e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, defende que a tão reverenciada nova classe média é, na verdade, uma “classe trabalhadora precarizada, super explorada e, em grande parte, informal. É aquela que trabalha muito e ganha pouco”.
    Em conversa com a coluna, por e-mail, diz que tal classe – “que chamo de batalhadores” – “funcionará como o fiel da balança” na disputa eleitoral de 2014. “Ela oscila entre apoiar a classe abaixo dela e assumir um discurso atrelado aos interesses dos privilegiados. Quem conseguir conquistá-la, provavelmente ganha a eleição.”
    A seguir, os melhores momentos.
    Como a questão de classes estará nas eleições de 2014?
    A eleição será, sem dúvida, dominada pela luta e pela aliança entre as classes. O Brasil, como outras sociedades modernas desiguais, é dividido entre classes sociais que reproduzem privilégios injustos. De um lado, os endinheirados e a classe média, que ocupam todos os empregos de prestígio. De outro, as classes condenadas a reproduzir sua exclusão e humilhação cotidianas, como a classe trabalhadora precária, chamada erroneamente de nova classe média; e os excluídos, que chamo provocativamente de ralé. O problema é que as relações entre as classes nunca são percebidas.
    Como assim?
    Se as relações fossem notadas, estariam arruinadas as chances de os privilégios se reproduzirem. Para parecer legítimo, o privilégio tem de ser mascarado como de interesse geral. E é justamente por isso que a ideologia de grande parte da classe média brasileira mais conservadora é o combate à corrupção no Estado – como se não houvesse corrupção no mercado – onde, cotidianamente, a classe média explora o trabalho barato da ralé e a condena à humilhação eterna.
    Eduardo Campos tem falado de sua preocupação em conquistar a classe média de Lula e Dilma. É o caminho?
    Do ponto de vista do pragmatismo político, ele está mais do que certo. O Brasil é hoje dividido entre uma classe de excluídos – que chega a 30% da população e foi alvo dos programas assistenciais do lulismo (que reduzem o sofrimento, mas que não resgatam essa classe da exclusão) – e uma classe média verdadeira, que é cativa da mensagem moralista dos partidos mais conservadores. A recente classe trabalhadora precária – super explorada, que trabalha muito e ganha pouco, mas que ascendeu socialmente comparativamente com o padrão de vida anterior – funcionará como fiel da balança.
    Para qual lado?
    Essa classe – que chamo de batalhadores – oscila entre apoiar e se solidarizar com a classe abaixo dela, os excluídos da ralé, e assumir um discurso mais mercantil e atrelado aos interesses das classes privilegiadas. Quem conseguir conquistar essa classe provavelmente ganha a eleição.
    E qual é o olhar para compreender as diferentes realidades?
    Somos formados por estímulos afetivos, emocionais, morais e cognitivos. Cada classe forma pessoas com disposições e capacidades distintas para a competição social – e não só na busca pelos bens materiais, mas também pelos simbólicos, como prestígio e reconhecimento.
    De que maneira?
    São as capacidades emocional e cognitiva de autocontrole e concentração que fazem com que, por exemplo, os filhos da classe média cheguem à escola como vencedores aos cinco anos de idade. E com que os filhos dos excluídos, pela carência dos mesmos estímulos, chegam à escola e depois no mercado de trabalho como perdedores. Acabam em trabalhos domésticos, pesados e mal pagos.
    Quais são as classes no Brasil?
    Vislumbramos quatro classes sociais, com suas subdivisões internas. No topo da hierarquia, temos as pessoas com muito dinheiro e um estilo de vida e compreensão de mundo marcado pelo consumo material. São aqueles que chamamos de endinheirados. Eles somam menos de 1% da população, mas controlam mais de 50% do PIB nacional, sob a forma de juros, lucros e renda de terras. Logo em seguida, vem outra classe privilegiada: a média. Caracterizada por se apropriar de outro capital decisivo na competição social: o cultural.
    E do outro lado da balança?
    Na parte de baixo da hierarquia social – onde está a maioria da população brasileira – temos uma grande classe trabalhadora. Hoje, em sua maioria, precária, super explorada e, em grande parte, informal. Sem a segurança e estabilidade da antiga classe trabalhadora tradicional. Ainda mais embaixo, estão os excluídos.
    Como elas se relacionam?
    Os endinheirados dominam a economia, a mídia, o poder judiciário, financiam a política e controlam os recursos naturais. É um capitalismo selvagem, desumano e altamente concentrador em proveito de meia dúzia de pessoas. Quase 70% do PIB brasileiro está com os poucos privilegiados. Ou seja, o que sobra é distribuído entre os outros milhões de brasileiros. Este é o retrato da nossa verdadeira miséria e iniquidade. É por isso que a existência da corrupção estatal é tão boa para os interesses dessa minoria privilegiada.
    Em qual sentido?
    É uma maneira de desviar a atenção da tão absurda concentração de riquezas e enfraquecer o Estado. Demonizá-lo como ineficiente e corrupto faz com que apenas o mercado – e quem o domina – apareça como materialização de todas as virtudes. Enquanto a ralé está condenada à humilhação eterna, a classe média poupa seu tempo e consegue se dedicar ao estudo e à qualificação. É um privilégio social poder estudar sem ter de trabalhar ao mesmo tempo.
    Já que o tempo é um recurso valioso, é possível afirmar que as manifestações foram protagonizadas pela classe média?
    Sem dúvida. As manifestações começaram com reivindicações tipicamente populares por melhores serviços públicos. Lá estavam os filhos da classe trabalhadora, que passaram a estudar em universidades e a acreditar que são mesmo de classe média. Exigiam, portanto, serviços de classe média. Mas, pouco tempo depois, o movimento foi apropriado pela fração da classe média mais conservadora e tradicional, com suas bandeiras típicas do moralismo – que reduz a política ao nível das telenovelas, entre o bem e o mal.
    Como cada classe se relaciona com a religião?
    Como existe grande quantidade de excluídos, abre-se espaço para a mensagem religiosa. É ela que tenta transformar a humilhação cotidiana em autoconfiança. Pela promessa de que ninguém menos do que Jesus está do seu lado. Mas o lado sombrio deste fenômeno é o conservadorismo cultural e a homofobia absurda.
    Os batalhadores estarão nos jogos da Copa?
    Certamente não. O futebol está produzindo um fenômeno estranho e o povo está sendo obrigado a ver de fora sua maior paixão. A Copa é um retrato do Brasil: quem ganha são os endinheirados. Quem paga a festa é a classe média explorada por serviços de preço exorbitante. E o povo apenas assiste de fora a festa alheia. /THAIS ARBEX