quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Assassinato em São Gabriel


O assassinato do
SEM TERRA em São Gabriel e suas consequências políticas





 


 Bruno
Lima Rocha
, cientista político, comenta o assassinato de
Eltom Brum da Silva, agricultor sem terra.



Bruno
Lima Rocha
, cientista político com doutorado e mestrado pela
UFRGS, jornalista formado na UFRJ; docente de comunicação e pesquisador 1
da Unisinos; membro do Grupo Cepos e editor do portar Estratégia &
Análise


Eis o artigo.
 
São
Gabriel
, por volta de 10 horas da manhã. Fazenda
Southall
, um complexo latifundiário totalizando 14.000 hectares,
alvo de disputa entre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST
) e o ex-proprietário, Alfredo
Southall
. O cenário é o de batalha campal à vista. São 230
brigadianos de distintas unidades contra cerca de 270 colonos ocupantes, a
metade deles mulheres e crianças.
 
O desfecho político para o
governo que desse ato é responsável, até o momento é este. O
sub-comandante geral da Brigada Militar (BM), coronel
Lauro Binsfeld, após sair-se muito mal com os veículos de
comunicação foi responsabilizado pela tragédia e afastado. Em seu lugar, o
coronel João Carlos Trindade Lopes, comandante-geral da
BM, indica o ex-comandante do Comando de Policiamento da Capital, coronel
Jones Calixtrato. Acima deles paira o secretário da
Segurança Pública, o general do Exército Brasileiro, Edson
Gourlarte
. Assim, disputas da caserna policial refletem uma
interna mal digerida na forma de reposição de peças. O detalhe é que a
política não é tão simples e menos ainda as formas de se fazer política
para assegurar um direito constitucional. O assassinato de
Eltom é o começo de outra escala de lutas
reivindicativas.
 
Na cidade da Fronteira Oeste do Rio Grande
onde em 1756 caíra peleando o Corregedor do Cabildo da redução de São
Miguel, o Estado assassina um colono sem terra. Sepé
Tiaraju
faleceu de lança em riste perto do Arroio
Caiboaté
. Peleou, viveu, morreu e voltou defendendo sua terra e
povo a quem servia como uma liderança obediente da vontade popular.
Eltom Brum da Silva era um agricultor do interior de
Canguçu e que peleava por um pedaço de terra. Sua morte foi com chumbo e
pelas costas. Os balins da escopeta calibre 12 que assassinaram Eltom
deram um exemplo de como o aparato repressivo recorda suas origens e
funções quando o tema é a propriedade.
 
O colono não caiu por
acaso e menos ainda “mal súbito” como foi a versão da BM noticiada pelos
meios de sempre com a cobertura horrorosa de todos os dias. Ele caiu
porque era parte de uma medida de luta direta, a forma de exercício de
direitos constitucionais que jamais são garantidos a não ser que as
parcelas de povo organizado consigam exercer a sua vontade independente de
intermediários profissionais. Desta forma, ao mesmo tempo em que os
partidos de tipo burguês (de “esquerda” ou não) perdem seu sentido, os
órgãos de Estado se vêem na obrigação de ao menos se posicionar. O mesmo
se dá no quesito veículos de comunicação social.
 
As
versões da mídia comunitária e do maior conglomerado da
Província

 
De tudo o que li, a versão mais correta da
circunstância da morte de Eltom foi dada pelo movimento de rádios
comunitárias. Peço um pouco de paciência para quem lê o artigo para postar
na íntegra a versão da Associação Brasileira de Radiodifusão
Comunitária – estadual do RS
(Abraço-RS
):
 
Agressão verbal teria motivado
PM a matar sem terra no RS, 21/08/2009

 
A tarde de
sexta-feira (21) culminou com a morte do agricultor sem terra Elton Brum
da Silva em uma ação da Brigada Militar do Rio Grande do Sul durante a
desocupação de uma área no município de São Gabriel. Fotos mostram que o
agricultor foi atingido por uma arma calibre 12. A suspeita recai sobre o
comandante do 2º RPMon de Livramento, Ten. Coronel Flávio da Silva Lopes,
que respondeu com o tiro a uma agressão verbal do agricultor. O ouvidor
agrário do Ministério de Desenvolvimento Agrário, Gercino José da Silva
Filho desembarcou no Estado no final da tarde e já se dirigiu para São
Gabriel com a promessa de buscar punição aos responsáveis. A Brigada
Militar deu a primeira versão afirmando que o agricultor teria morrido de
um “mau súbito”. Horas depois o hospital local desmentia.
 
O
MST responsabiliza a política de segurança do governo Estadual e a Justiça
por postergar o processo de assentamento das famílias.



A ocupação reivindicava a aplicação dos recursos para saúde, educação e
infra-estrutura nos assentamentos da região e desapropriação do restante
da Fazenda Southall e a liberação imediata, na Justiça, das fazendas
Antoniazzi e 33, em São Gabriel, para o assentamento das famílias
acampadas no Estado.
 
Link para a Abraço-RS / Jornal dos
Trabalhadores
 
Se compararmos a nota acima com a cobertura da
mídia corporativa veremos a diferença de fundo. Esta abordagem teve a
apuração detalhada resguardando o sigilo de fontes que se arriscaram para
passar esta informação. Não responsabiliza o protesto social pela
repressão sofrida e sim os repressores. Já a matéria de Zero Hora (Grupo
RBS), assinada por Humberto Trezzi, tem um título que fala por si
só:
 
“Campos conflagrados: MST ganha seu mártir” (para seguir
neste link:  – página 4 da edição de 22/08/2009)

 
O silêncio e a falta de imagens são a constante. O
ineditismo está na possibilidade de reagir na batalha da mídia e de furar
o bloqueio da produção de sentido que visa tornar sem sentido uma luta
milenar como a da posse da terra. Nesta frente, a possibilidade de
ofensiva pelos movimentos populares do RS está assegurada. Vejamos o que
antecede ao assassinato e como este gesto se localiza dentro da crise
política pela possível corrupção endêmica no governo neoliberal de Yeda
Crusius.
 
 
A repressão adiou sua sanha para a
Fronteira.
 
Um dos dilemas clássicos na política é a equação
entre a legitimidade de um governo com sua capacidade de reprimir. Não
estou discutindo necessariamente o poder de polícia, que é uma das
atribuições do Estado, não importando o nível de governo, seja a União,
estadual ou municipal. Mas sim, a relação de forças que vai além dos
formalismos institucionais. Por vezes, um gesto repressivo causa uma
comoção tamanha, que o respaldo de um mandato cambaleante pode se perder.
Em junho de 2008, mesmo bombardeada pela CPI do DETRAN-RS, com a gravação
de conversas privadas entre seu vice-governador rebelde Paulo
Afonso Feijó
(DEM) com o então chefe da Casa Civil, Cézar
Busatto
(PPS), a governadora do Rio Grande, Yeda
Crusius
(PSDB), não titubeou em mandar as forças da ordem se
impor a qualquer custo. Na semana passada, a aposta de boa parte da
esquerda gaúcha era essa. Que a repressão desenfreada fosse coibir uma
marcha aparentemente pacífica e assim aumentar a comoção interna na
Província. Não foi o que se sucedeu, não dessa vez.
 
A crise
política fratura lealdades políticas e sociais de há muito constituídas na
sociedade rio-grandense. Sendo ou não culpada, vindo a ser condenada pela
ação de improbidade administrativa ou inocentada, a governadora
Yeda Crusius e sua base aliada consolidaram nos últimos
anos algumas quebras de paradigma no Rio Grande do Sul. Uma delas diz
respeito à tolerância típica do estilo social-democrata, onde as ruas são
palcos de manifestações e há tolerância no quesito repressão para
assegurar a relação de legitimidade do governo constituído. Quando um
governo é acusado de corrupção e se vê na berlinda, em geral não se dá o
luxo de reprimir quem está organizado. No ano de 2008, em seu primeiro
semestre, diante do mesmo escândalo que agora enfrenta, Yeda Crusius,
Paulo Roberto Mendes e a mídia de sempre distribuíram repressão sem dó nem
piedade.
 
Se apostava que, durante os atos políticos contra
seu governo, a sanha repressiva se encontraria de novo com a parcela de
população organizada. Não ocorreu o pior como no ano anterior porque o
núcleo duro Palácio das Hortênsias preservara Porto Alegre para matar em
São Gabriel. Se fosse reprimir na capital, o palco ideal seria no dia 14
de agosto.
 
Duas colunas significativas se formaram. Uma
saíra da Escola Estadual Júlio de Castilhos, o Julinho,
lugar de romaria da esquerda desde os anos ’60. Outra coluna se dirigiu de
ônibus até a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul
(FIERGS), retornando para o Centro rumo à Praça da Matriz, onde a
Província concentra seus poderes oficiais.
 
Na última
sexta-feira dia 14 de agosto a cidade de Porto Alegre viveu uma manhã de
protestos. A data fazia parte da jornada nacional de lutas promovida por
diversas entidades, centrais sindicais e movimentos populares. A chamada
para todo o país se pautava na crítica a política econômica, a única pauta
que ainda unifica a fragmentada esquerda brasileira após quase sete anos
do governo de Luiz Inácio.
 
A marcha originalmente fora
convocada para atender essa agenda transformou-se no ato ecumênico das
esquerdas gaúchas, convocadas a partir da consigna de “Fora Yeda!”. E,
após alguns anos com certo vazio político na capital rio-grandense, neste
dia realmente o ato concentrou todos os matizes. O protesto se constituíra
desde a extrema-esquerda não eleitoral que se localizara no final da
coluna que saíra do Julinho, passando pelas bases
sindicais de servidores públicos até a bancada estadual do PT que
confortavelmente aguardava o cortejo chegar à Matriz.



Outra novidade ocorrera naquele dia, aguçando o cérebro dos marchantes.
Pela primeira vez, o núcleo duro de Yeda, resolvera
reagir e convocou aos CCs, estagiários, FGs e militantes tucanos a se
posicionar na Esplanada da Assembléia. Houve por tanto, dois atos, de
dimensões distintas, embora antagônicos.
 
Na ausência de
repressão ao longo do trecho, outra conjectura atravessava a todas as
agrupações e movimentos ali presentes. Haveria ou não conflito com a
centena de manifestantes a favor da governadora ali presentes? Com a
desproporção numérica de mais de 3.000 protestantes contra menos de duas
centenas pró-Yeda, a Brigada teria obrigação de intervir. O “duelo” não
houve, mas ficou o fato político e a possibilidade de repressão policial.
Na mesma sexta-feira, o protesto estadual ganhou relevância nacional ao
ser midiatizado pelo Jornal Nacional. Nesta semana, o dilema entre
protesto e repressão foi alimentado pelos meios de comunicação do estado.
Quem está na lida política sabe ler estes sinais. Nenhum tema dessa ordem
é pautado por acaso e a variável repressão não foi descartada pelo ainda
cambaleante governo da economista neoclássica. Aquilo que não passou de
xingamentos e alguns ovos atirados pelos marchantes, veio a se manifestar
no assassinato de Eltom Brum da
Silva
.
 
 
Concluindo. Opções na
política gaúcha na perspectiva dos movimentos populares após o assassinato
na Fazenda Southaal
.
    

 
Entendo que o assassinato do colono sem terra Eltom
Brum da Silva
, ocorrido no dia 21 de agosto de 2009, na cidade de
São Gabriel, fronteira oeste, obriga as forças vivas da esquerda gaúcha a
se colocarem de prontidão. Tudo indica ter sido o ato premeditado, uma
ação de força do aparelho repressivo do governo gaúcho abalado pelas
denúncias de corrupção. Como quase sempre ocorre, o Corpo Auxiliar de
Polícia Imperial, criado para combater a Revolução
Farroupilha
, depois batizada de Brigada Militar durante a
ditadura positivista, demonstrou sua eficiência na defesa de interesses
oligárquicos. Tampouco se trata do primeiro ato de brutalidade do governo
da economista neoliberal Yeda Crusius e não será o último. Nessas horas, é
preciso ter o mínimo de unidade tática entre o conjunto de movimentos
populares para frear o avanço repressivo. Matar um militante, de base ou
de coordenação, é algo que não deve ficar impune. Mesmo dentro da
democracia liberal burguesa existem limites que, uma vez cruzados, abrem
margem para outra escala de ações. Em não havendo resposta de mobilização,
a máquina reacionária por dentro do Estado abalado por eventos de
corrupção, não vai mais parar. 
 
Mas, ao contrário de
outros colegas analistas, em geral perfilados com o reformismo, tanto o
que está no governo Lula assim como o da oposição de
esquerda-parlamentar, não consigo recomendar algo que vejo como
falsificável. Vejo que não há saída política de longo prazo dentro da
democracia dos oligarcas, banqueiros e transnacionais. E, tampouco há
possibilidade de transformação da sociedade ao agir por dentro do aparelho
de Estado. Mas, isso não quer dizer que não exista momento tático de luta.
Este, por exemplo, é um momento. Na hora da crise política, o povo tem de
se aperceber da existência de alternativas por fora dos espaços viciados
de participação oficial. É preciso retirar poder simbólico e político dos
intermediários profissionais e recriar a relação direta com as entidades
de base e os movimentos com autonomia decisória. E, sabemos que isso não é
fácil.
 
Uma saída que me parece óbvia é a unificação de lutas
e pautas. Nas semanas após o ASSASSINATO DE ELTOM BRUM DA
SILVA
por parte da Brigada Militar sob comando de Yeda
Crusius
(PSDB), vejo como imprescindível a união das forças
populares em torno de um objetivo comum, mas fortalecendo a
auto-representação popular, através de instâncias de coordenação entre
movimentos e entidades de base. A unidade das pautas e lutas precisa
apontar para as reivindicações imediatas e o objetivo geral comum de
assegurar uma vitória contundente contra um governo estadual acusado de
corrupto e com postura repressora! Sinceramente, não resta mais o que
fazer além do óbvio. Do contrário, o custo político de um morto será baixo
demais, abrindo precedente para outros assassinatos, neste e nos governos
de turno que virão.
 
Para esta finalidade, agora já não basta
a luta reivindicativa. O momento é de derrubar Yeda Crusius e assegurar
que o vice também neoliberal nem chegue a ter as condições de legitimidade
para governar. Com esse acúmulo de forças, haverá condições de enfrentar o
acionar dos aparelhos de intermediação política profissional e o uso
errado que as siglas farão do martírio de mais um camponês. 

 
O momento é de assegurar a vitória tática, no desmonte do
governo baseado em relações patrimonialistas, sob suspeita de corrupção
estrutural e sendo repressor ao extremo. E, o momento também é o de
derrotar o projeto do neoliberalismo no Rio Grande, especificamente para
não permitir a conclusão do empréstimo entreguista vende pátria com o
Banco Mundial. 














Sem terra é executado com tiro nas costas pela
polícia gaúcha

 

agencia carta maior
 

O sem terra Elton Brum da Silva foi morto na manhã
desta sexta-feira (21) em São Gabriel, no Rio Grande do Sul, com um tiro
pelas costas, desferido por uma espingarda calibre 12 durante desocupação,
pela Brigada Militar (a Polícia Militar gaúcha), da Fazenda Southall. O
assassinato ocorreu por volta das 8 horas da manhã. Elton
deu entrada no hospital quase duas horas depois. O MST, em nota oficial,
lamentou com pesar o ocorrido e responsabilizou o governo Yeda
Crusius
(PSDB), o Ministério Público do RS e a Justiça. Não é a
primeira vez que a Brigada Militar usa de truculência durante
reintegrações de posse, aliás, a violência contra os movimentos sociais
instaurada desde o início do Governo Yeda denota opção
clara por tratar as questões sociais, como a Reforma Agrária, como caso de
polícia.



A reportagem é de Clarissa Pont e publicada pela Carta
Maior
, 21-08-2009.


“Eu não tava próximo tão próximo no momento dos tiros porque a gente se
dividiu em dois grupos. Quando Elton foi atingido, ele
estava na frente da trincheira e a cavalaria da Brigada entrou por trás,
eram cerca de 80 deles, com espadas. A ação foi muito violenta, tem
companheiro nosso com a perna cortada por espada. Quando eu ouvi os
disparos, a gente tentou ver o que tinha acontecido, mas foi formado um
cordão ao redor pelo batalhão. Nós não podíamos nem abrir os olhos, todos
no chão, e eles continuavam batendo. Isso durou uns vinte minutos. Bombas
de gás foram jogadas nas crianças, que estavam em grupo que tentávamos
proteger. Depois que tudo acalmou, deixaram que nós entrássemos de 10 em
10 pessoas para recolher colchões e coisas do gênero. Foi aí que vimos
que, onde aconteceram os tiros, havia uma lona preta, com muito sangue
embaixo”.


O relato é de  Rodrigo Escobar, militante do MST,
que esteve na ação em São Gabriel. Na conversa por telefone com Carta
Maior, Escobar contou que muitas crianças foram levadas
ao hospital e que os números de feridos divulgados pela imprensa durante o
dia não são nem uma pequena amostra do que aconteceu na Fazenda Southall.
Além disso, relatou que o comando da ação movida pela Brigada era confuso,
e que nem os próprios oficiais presentes se entendiam. “Enquanto uns
mandavam ir pra cima, outros diziam para recuar”, disse. Quase duas horas
depois, Brum chegou sem vida ao Hospital Santa Casa de
Caridade, por volta das 9h40min da manhã. Uma mulher e uma criança também
ficaram feridas no confronto, provavelmente com estilhaços do disparo que
atingiu o militante.



Nas primeiras horas da manhã, as informações repassadas à imprensa pela
Brigada Militar atribuíam a morte de Brum a um mal
súbito. O assassinato só foi confirmado na metade da manhã. O ex-ouvidor
agrário do Governo Yeda e também ex-ouvidor da Segurança
Pública, Adão Paiani, disse que o sem-terra Brum foi
morto pela Brigada Militar. Paiani relatou que foi procurado, na condição
de ex-ouvidor da segurança pública, por um oficial da BM que assistiu à
desocupação da fazenda. Esse oficial teria relatado que o manifestante foi
morto durante discussão com um oficial da BM que atua na região da
Fronteira. Brum teria dito alguns palavrões para o
oficial, que revidou com um tiro de espingarda. O próprio oficial e alguns
soldados teriam providenciado a remoção de Brum, ainda
vivo, para o hospital de São Gabriel, numa viatura da BM. Ele não portava
arma de fogo.


"Extremamente profissional"



Lisiane Vilagrande, promotora de São Gabriel,
acompanhou a ação da Brigada durante a desocupação desde as 5h da manhã
desta sexta-feira. Segundo ela, a ação “foi extremamente profissional. Em
momento nenhum eu senti alguma tensão ou nervosismo por parte dos policias
militares que executavam a ação. Foi tudo muito rápido”. No entanto, a
promotora não soube precisar a que distância acompanhou a ação. “Fiquei a
uma distância razoável, em um ponto mais alto. Nós tínhamos uma visão, mas
relativamente limitada. E, além disso, acho que para minha própria
segurança, o coronel me manteve a uma distância adequada. Eu estava mais
próxima do que a imprensa, mas eu estava bem distante do acampamento em
si”. A promotora apenas admitiu ter escutado tiros, e também testemunhou o
uso de bombas de efeito moral, de som e de gás lacrimogêneo.


O ouvidor agrário do Ministério Desenvolvimento Agrário (MDA),
Gercino Silva, saiu de Brasília no início da tarde rumo
ao Rio Grande do Sul. Gercino esteve diversas vezes no
Rio Grande do Sul, inclusive na época em que era discutida a
desapropriação da Fazenda Southall. A avaliação dele
ainda é aguardada. Para o presidente da Comissão de Cidadania e Direitos
Humanos (CCDH), da Assembléia Legislativa do RS, deputado Dionilso
Marcon
(PT) “é de conhecimento público a truculência usada pela
Brigada Militar nas ações de despejo. Mesmo assim, os poderes públicos
optam por tratar as questões sociais, como a reforma agrária, como caso de
polícia. Dias atrás a Brigada Militar já usou métodos de tortura física
para inibir manifestações dos trabalhadores rurais no município de São
Gabriel”.






 


 


 


 


 


 



 


 


 


 


 


 


 


 


 



 


No final da tarde, o MST divulgou fotos do corpo de
Elton Brum com perfurações nas costas, comprovando que
foi baleado por trás, com uma espingarda calibre 12.


 














O que fazia uma arma de
fogo carregada com chumbo lá em São Gabriel?
 

O que fazia uma arma de fogo carregada com chumbo na remoção de
pessoas que se recusavam a sair de uma área invadida?


A reportagem é do jornal Zero Hora,
22-08-2009.


A pergunta é chave para avaliar se o que ocorreu em São Gabriel
foi excesso ou legítima defesa. Um dos que questionam a ação da BM é
o desembargador Gercino José da Silva Filho,
ouvidor agrário do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Ele
desembarcou ontem no Estado para acompanhar as investigações sobre a
morte em São Gabriel.


Gercino preferiu não se manifestar
especificamente sobre o episódio, mas destacou que a Brigada não
aderiu ao Manual de Diretrizes Nacionais para
execução de mandados de reintegração de posse assinado em abril do
ano passado em reunião entre as forças policiais estaduais. De
acordo com o ouvidor, o manual restringe o uso de armas de fogo em
operações como a realizada em São Gabriel e conta com apoio de 11
Estados.



– O governo federal vem trabalhando para diminuir a violência no
campo. O homicídio de um integrante do MST durante uma operação de
desocupação é muito grave – disse.


Gercino afirmou que as informações que possui
são extraoficiais e que veio ao Estado para ouvir os envolvidos e
garantir a punição dos responsáveis. O ouvidor informou que ficará
no Estado até que o episódio seja esclarecido. A Brigada afirmou que
não comenta a informação do ouvidor sobre a não adesão da corporação
ao manual.


Subcomandante da BM diz que imprevistos
acontecem


O subcomandante da BM, coronel Lauro Binsfeld,
comandava a desocupação e não testemunhou o tiro que matou
Brum. Ele diz que a orientação era para que não
fossem utilizadas balas de chumbo nas armas de fogo, mas afirmou que
“imprevistos acontecem”.



O juiz militar e ex-comandante da BM Paulo
Roberto Mendes
afirma que a decisão de não aderir ao
Manual de Diretrizes Nacionais aconteceu quando ele
era subcomandante da BM. Isso foi feito porque, segundo ele, a
Brigada já tem um documento que atende aos pré-requisitos da
Organização das Nações Unidas
(ONU) para retirada de manifestantes de áreas
invadidas. É o Plano de Operações 08, que depois
virou Nota de Instrução 08, elaborado em 2001.


Conforme Mendes, o documento recomenda uso de
agentes químicos (bombas de gás) e balas de borracha contra os
invasores, em uso progressivo da força. Não é descartado o uso de
armas de fogo com balas de verdade, mas só em último caso, por força
especializada (como o Grupo de Ações Táticas
Especiais
, o Gate, que é uma tropa de
elite). Via de regra, o uso da arma de fogo deve ocorrer quando há
notícia de que os oponentes também têm armas letais.



– Não vou me pronunciar sobre o episódio de São Gabriel, porque
não sei o que aconteceu – avisa Mendes.


Chamou a atenção também de especialistas que a BM usou média de
um policial para cada militante do MST, quando o recomendado
internacionalmente é a proporção de três policiais para cada pessoa
a ser coagida, para evitar o ímpeto de reação.


Na Delegacia da Polícia Civil, o delegado Laurence de
Moraes Texeira
abriu inquérito para investigar o homicídio.
No início da noite, os depoimentos dos sem-terra ainda estavam sendo
tomados.


– Por enquanto, só temos o resultado extraoficial da necropsia,
que apontou que a morte do integrante do MST foi causada por um
ferimento por arma de fogo. Vamos tomar todos os depoimentos
necessários para apurar o fato – disse o delegado.



A DP ficou movimentada até a noite. Primeiro, pelos 18 líderes
dos sem-terra encaminhados pela Brigada, às 15h30min, para responder
por desobediência a ordem judicial. Mais tarde, cerca de 40
integrantes do MST foram até a delegacia para relatar casos de
agressões.


 















Mais um “mártir-pela-justiça” tomba em nossas
fileiras. Seu nome é Elton Brum da Silva

ARTIGO DE  IRMAO aNTONIO CECHIN  E dR. JACQUES
ALFOSIN
 

"Os Sem-Terra têm carradas de razão quando se
jogam contra o inimigo- latifúndio, em favor da reforma agrária,
particularmente em São Gabriel, cidade em que tombou nosso protomártir
São Sepé Tiaraju no dia 7 de fevereiro de 1756. Desde
aquele dia, a posse comunitária da terra em que vivia o povo guarani, foi
substituída pelo latifundismo por determinação dos impérios de Espanha e
Portugal. Hoje, 253 anos depois, ali, precisamente em São Gabriel, se
encontra o coração do latifúndio do Rio Grande do Sul.
Elton morre lutando por terra, dentro da Fazenda
Southall
de dez mil hectares, propriedade de um homem só",
escrevem Antônio
Cechin
e Jacques
Távora Alfonsin
.



Antonio
Cechin
é irmão marista, miltante dos movimentos sociais.
Jacques
Távora Alfonsin
é advogado do MST e procurador do Estado do
Rio Grande do Sul aposentado.


Eis o artigo.


“Não há maior prova de amor do que dar a vida por aqueles a quem se
ama” (Evangelho). Jesus, o Filho de Deus que é AMOR, não só
caracterizou o amor máximo, mas deu também o exemplo, entregando-se por
nós até à última gota de seu sangue.


Na Igreja das origens, a que vivia clandestina, nas catacumbas de Roma,
tão logo algum cristão fosse morto pelo imperador que se dizia deus, os
irmãos de fé, em geral à noite, recolhiam o cadáver, davam-lhe sepultura
condigna nos subterrâneos da cidade. Imediatamente todos o invocavam como
santo, pedindo-lhe proteção junto de Deus, e sobre as relíquias escondidas
no túmulo, celebravam o sacrifício da Santa Missa e os demais
sacramentos.



Até hoje, em nossa Igreja, provado que alguém morreu mártir, quer seja
por ódio à fé, quer seja por ter sido um lutador pela justiça, pode ser
imediatamente canonizado, sem necessitar de passar pelo processo canônico
que comprova ter praticado todas as virtudes cristãs em grau heróico, como
sói acontecer com quem morre de morte natural. Este último passa então a
ser, não um mártir, mas sim um confessor.


Temos ainda poucos detalhes sobre a personalidade do Elton Brum da
Silva. A notícia que nos veio pelo rádio e pela TV nos forneceu apenas o
nome e a idade de 44 anos.


Que a situação do campo é uma situação de injustiça institucionalizada,
não precisamos demonstrar. Os SEM-TERRA têm carradas de
razão quando se jogam contra o inimigo- latifúndio, em favor da reforma
agrária, particularmente em São Gabriel, cidade em que tombou nosso
protomártir São Sepé Tiaraju no dia 7 de fevereiro de
1756. Desde aquele dia, a posse comunitária da terra em que vivia o povo
guarani, foi substituída pelo latifundismo por determinação dos impérios
de Espanha e Portugal. Hoje, 253 anos depois, ali, precisamente em São
Gabriel, se encontra o coração do latifúndio do Rio Grande do Sul.
Elton morre lutando por terra, dentro da Fazenda
Southall
de dez mil hectares, propriedade de um homem só.



Foi por causa dessa situação das terras do Rio Grande do Sul que, no
ano de 1978, inventamos a Romaria
da Terra
. Até esse ano, a Igreja do Rio Grande do Sul era
igual à Igreja de todo o Brasil e mesmo às Igrejas do mundo inteiro.
Estava comprometida com as classes dominantes. Vivia submissa à oligarquia
rural. Mantinha aliança com o poder para garantir para si os privilégios
institucionais.


A primeira Romaria da Terra, propositalmente em
São Gabriel, nos lugares exatos em que tombaram
São Sepé Tiaraju e seus 1500 índios
mártires, fez a nossa Igreja mudar de lado. Passou a estar do lado de Deus
e de seu Filho Jesus Cristo que é o lado dos pobres, Sem-Terras e Pequenos
Agricultores.De então a esta parte, nossa Igreja se transformou em Igreja
de Mártires como era a Igreja dos primórdios.



Dom Hélder Câmara, no Concílio Vaticano
II,
foi com dezenas de outros bispos, encerrar o grande evento
nas catacumbas. Lá eles todos fizeram o “pacto das catacumbas”: um
compromisso de viverem junto aos pobres, como uma Igreja pobre.


Não é por nada que agora, depois da Assembléia de Aparecida, sob a
presidência do papa Bento XVI, nosso episcopado
brasileiro, ao formular as “Diretrizes gerais da Ação
Evangelizadora da Igreja no Brasil
” estabeleceu no artigo 23:


“Apesar de circunstâncias adversas, não estamos abandonados à nossa
própria sorte. O Senhor da   História caminha conosco e nos
acompanha com seu Espírito de Vida. Com olhos de fé, ainda que em meio a
ambigüidades, podemos vê-Lo nos movimentos sociais que se articulam em
favor de causas mais amplas que as da classe ou do interesse local. Assim,
a luta contra as discriminações, a promoção dos direitos da mulher, a
preservação do meio ambiente, a defesa dos direitos de culturas e etnias
específicas, como a indígena e a afro-brasileira, têm-se revelado como
causas capazes de mobilizar grande número de pessoas, muitas delas
motivadas pelo próprio Evangelho. A busca da justiça social e de um outro
mundo possível, a caminho do Reino definitivo, reúne uma extraordinária e
variada adesão de grupos e movimentos. Esse fenômeno manifesta uma
consciência planetária e a percepção de que fazemos parte de uma única
família universal.”  (Livro Diretrizes gerais da ação evangelizadora
da Igreja no Brasil – 2008-2010; documentos da CNBB nº 87).



São todos os bispos do Brasil a proclamar que “o Senhor da História
caminha conosco... Podemos vê-lo no MST!...” Oxalá nossos catequistas, em
sua catequese paroquial de hoje, ou em sua “aula de religião” de hoje,
estejam, a exemplo de nossos bispos, apontando o Senhor da História
caminhando conosco na pessoa do mártir Elton Brum da
Silva
!...


 












Marcha na
despedida
 


 Ao som de gaita, violão, canções revolucionárias e
discursos inflamados pedindo reforma agrária, o caixão do sem-terra
Eltom Brum da Silva, 44 anos, foi retirado da
capela mortuária 3, da Santa Casa de São Gabriel, e colocado no meio
da rua na manhã de ontem.


A notícia é de Carlos Wagner e publicada pelo jornal
Zero Hora, 23-08-2009.


Foi assim que os seguidores do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST
) iniciaram as
homenagens ao militante. Na manhã de sexta-feira, ele tombou com
tiro pela costas de espingarda calibre 12 disparado durante uma
desocupação efetuada pela Brigada Militar (BM) na Fazenda
Southall
, ocupada pelo movimento há 10 dias.



A solenidade durou pouco mais de meia hora. Depois, o caixão
seguiu por um túnel formado por bandeiras do MST até o carro
fúnebre. Dali o corpo seguiu para o cemitério na localidade de
Solidão, um lugarejo entre
Piratini e Canguçu, a 250
quilômetros de São Gabriel.


Uma comitiva acompanhou o caixão. O restante das pessoas ficaram
na cidade e se dirigiram para praça principal onde pretendia fazer
um um ato político.


– Estamos enterrado um trabalhador. Não a luta. Ela segue – disse
o irmão Antonio
Cechin
, 82 anos, um dos expoentes da teologia da
libertação.



Durante toda a noite a participação do militantes no MST foi
contada por seus companheiros, como José Carlos
Trindade
, 59 anos. Ele disse que estava do lado dele na
hora do tiro.


– Ele se abaixou para proteger as crianças na hora que foi
alvejado – comentou José Carlos.


O carro fúnebre seguiu viagem às 9h30min e a multidão iniciou a
caminhada rumo a praça de São Gabriel.


Segundo o jornal Folha de S. Paulo, 23-08-2009,
cerca de mil pessoas participaram ontem de uma marcha em São
Gabriel, segundo o MST (Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra), em protesto pela morte de Silva. O trânsito foi
interrompido. Policiais civis acompanharam a manifestação. A Brigada
Militar não apareceu no local.



No protesto uma camionete foi atacada com bandeiradas após quase
atropelar um grupo de sem-terra. Irritado, um fazendeiro hostilizou
os manifestantes. "Mataram um, tão matando pouco", gritava
Carlos Alberto Teixeira.


O funeral de Silva acabou se tornando um ato
político do MST contra a governadora Yeda Crusius
(PSDB) e o governo federal, pela demora em assentar
famílias.

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