sexta-feira, 17 de julho de 2009

Confusão na Frente da Casa da Governadora


CASA SITIADA
Um protesto para testar limites
Criticada por uns e defendida por outros, a cena protagonizada ontem pelo Cpers-Sindicato em frente à casa da governadora Yeda Crusius ganhou destaque porque rompeu com a tradição de protestos em lugares públicos. Esse fator alimenta o debate sobre os limites dos protestos políticos.

Dois protestos, dois ambientes, um mesmo alvo. Num intervalo de três horas e meia na manhã de ontem, duas manifestações contra a governadora Yeda Crusius colocaram à prova as fronteiras entre público e privado e lançaram um debate sobre os limites para atos políticos e para a reação a eles.

O primeiro começou por volta das 7h30min e surpreendeu a Brigada Militar. Dezenas de manifestantes organizados pelo Cpers-Sindicato se reuniram em frente à casa de Yeda, na Rua Araruama, no bairro Vila Jardim, na Capital. Por uma hora, gritaram em favor do impeachment dela. Plantaram uma réplica de uma escola de lata, em referência às salas que funcionam em módulos semelhantes a contêineres (leia mais na página ao lado). A ideia era comparar as escolas de lata com a casa da governadora, cuja compra é alvo de suspeitas. Sustentavam faixas com “Fora Yeda” e levantavam suspeitas sobre a compra do imóvel.

A segunda manifestação ocorreu no final da manhã, em frente ao Palácio Piratini. É uma cena que se repete com frequência, facilmente reconhecida como legítima. De acordo com o cientista político Paulo Moura, isso acontece porque a Praça da Matriz é um espaço público, ideal para manifestações nas democracias.

– A política se dá em espaço público e não em ambiente familiar, não em frente à casa da governadora. É preciso respeitar a civilidade – diz ele.

BM afastou manifestantes próximos a portão

Quando o ato é transferido para as proximidades da residência do governante, como aponta Moura, o cenário muda. Yeda estava num momento particular. Indignada com a situação, foi ao portão da calçada com os dois netos e a filha, Tarsila, levando um cartaz escrito à mão – “Vocês não são professores, torturam crianças. Abram alas que minhas crianças têm aula”. Soldados do Batalhão de Operações Especiais (BOE) da BM afastaram os manifestantes para que o carro que conduziria os netos ao colégio pudesse deixar a residência. Houve tumulto e detenções.

Na contramão de Moura, a cientista política Céli Pinto diz que a rua em frente à casa de Yeda é um espaço público. Para ela, uma manifestação pacífica é aceitável. Só faltou, na sua avaliação, um esquema de segurança planejado. O sociólogo Emil Sobottka e o cientista político Gustavo Grohmann têm uma visão diferente: a moradia do governante pertence a sua esfera particular. Ambos, porém, ressaltam que a casa de Yeda, por conta das denúncias, tem uma dimensão política.

– A casa é investigada. É razoável que ali se faça um protesto porque não se trata só da esfera privada, mas sim de uma disputa pública sobre um bem imóvel cuja origem é questionada – diz Sobottka.

Os especialistas concordam que manifestações têm limites. Grohmann ressalta que Yeda é a governante legítima e que nenhum órgão conseguiu provar irregularidades na conduta dela. Além disso, a governadora tem direito à privacidade. Sobottka observa que é errada a ideia de que a sociedade terá acesso ao governante durante as 24 horas do dia. Grohmann completa:

– Um protesto não pode perturbar a ordem mínima de convivência. Não dá para prejudicar os vizinhos. Um governante tem direito a dormir, só não tem o direito de ter contas obscuras – diz ele.

Sobottka afirma que, ao envolver os netos, a governadora feriu os limites da própria individualidade. A ida das crianças à escola, argumenta, não é justificativa contra um protesto político.

Já Moura afirma que a atitude de Yeda de ir ao portão com as crianças foi a de um ser humano ferido por uma violência. Para ele, protestos que alteram a rotina da população são na verdade um gol contra:

– Há várias formas de fazer atos criativos que ganham a simpatia da sociedade.

leandro.fontoura@zerohora.com.br

marciele.brum@zerohora.com.br


LEANDRO FONTOURA E MARCIELE BRUM

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