quarta-feira, 1 de abril de 2009

Serra Pelada

Brasil de Fato - 4 de 19 a 25 de fevereiro de 2009 –Edição 312 - Págs. 4 e 5




Empresas internacionais negociam irregularmente bilhões em ouro

de Serra Pelada




Dossiê acusa a mineradora estadunidense Phoenix Gems e a canadense Colossus Minerals de coordenarem um golpe bilionário na região de Serra Pelada (sudeste do Pará)







João Carvalho da Costa

enviado especial a Eldorado

dos Carajás (PA)







O SINDICATO dos Garimpeiros de Serra Pelada (Singasp) entregou ao jornal Brasil de Fato um dossiê-denúncia sobre a atual disputa pelo ouro de Serra Pelada. Segundo o documento, o que está em questão é uma série de irregularidades na parceria entre a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp) e a empresa de origem canadense Colossus Geologia e Participações Ltda.., pelo direito de “pesquisa, desenvolvimento e a lavra do minério primário (subterrâneo) de ouro e todos os outros metais e minerais associados que vierem a ser encontrados na área abrangida pelo Alvará de Pesquisa nº 1.485, Processo DNPM nº 850.425/1990”.

Uma área de 100 hectares, que pode conter, de acordo com as primeiras sondagens, entre outros minérios, cerca de 600 toneladas de ouro (avaliadas hoje em aproximadamente R$ 42 bilhões), cujo direito à exploração estaria sendo irregularmente repassado, por cerca de R$ 16 milhões (mais prêmios, proporcionalmente restritos), para grupos internacionais explorarem, de início, cerca de 75% e, consequentemente, especularem nos websites e bolsas do mundo. O jornal pôde averiguar que a empresa

canadense, de fato, já está anunciando as perspectivas de exploração em seu site (www.colossusminerals.com) . Constatou também que suas ações tiveram um grande salto após os anúncios da operação e a realização do IPO de suas ações antes mesmo de se consolidar totalmente o convênio (www.stockcharts.com).




“Eu sei muito mais...”

“Eu também ouvi falar que os garimpeiros de Serra Pelada estão insatisfeitos com a maneira pela qual o acordo com a Colossus Minerals foi a única proposta apresentada na assembleia, e que pelo menos 1, ou

talvez 2 outras propostas foram escondidas debaixo da mesa para dar à Colossus Minerals a única possibilidade de voto, sem mencionar as ligações que a empresa tem com a Vale (CVRD), que os garimpeiros

fi cariam muito revoltados ao saberem. (...) Pensem em tudo que será trazido à tona pelo que vocês estão prestes a fazer neste caso. Eu sei muito mais do que vocês podem imaginar”.

Este é um trecho de um dos e-mails que teria sido enviado, de acordo com o Singasp, no dia 31 de dezembro de 2008, por Brent E. Smith, executivo da mineradora estadunidense Phoenix Gems, a alguns executivos

da canadense Colossus Minerals. Smith estaria reivindicando junto aos executivos da Colossus a sua parte na negociação das toneladas de ouro de Serra Pelada – segundo ele, obtidas de maneira irregular pelos canadenses da Colossus, via seus representantes no Brasil, junto à Coomigasp. Smith teria alegado que os sócios da Phoenix Gems do Brasil Ltda.., Verônica Campos Lima e Artaxerxes Campos Carvalho Lima, não poderiam ter consumado o contrato sem a sua participação.

Ou seja, Verônica e Artaxerxes teriam feito um contrato irregular com a Colossus em junho de 2007, à sua revelia. Contatado pelo Brasil de Fato, Brent E. Smith confirmou o envio do e-mail e a irregularidade do contrato. Questionado sobre as alegadas “ligações que a Colossus Minerals tem com a Vale (CVRD)”, Brent

disse: “olhe, eu realmente não pretendo entrar nesse tipo de discussão nesse momento, eu não quero criar muitos problemas em jornais e na mídia (…). Eu ouvi algumas coisas, não tenho certeza das conexões (…) algumas pessoas que são empregadas da Colossus foram anteriormente empregadas pela CVRD”.

Consta do dossiê que o contrato entre as representantes no Brasil das empresas da América do Norte (EUA e Canadá) era imprescindível para que a canadense Colossus consumasse sua transação junto aos garimpeiros da Coomigasp, já que esta cooperativa tinha um convênio anterior com a Phoenix que conflitaria com a nova jogada. A Colossus teria firmado então um contrato paralelo com a Phoenix (dias antes de ser consumada sua parceria com a Coomigasp!), assegurando paralelamente o repasse de 15% do total dos negócios futuros advindos do convênio entre a mineradora canadense e a cooperativa brasileira. Em troca, a Phoenix Gems do Brasil teria passado uma procuração para a Colossus Geologia representá-la amplamente nos negócios afins com a Coomigasp.

“Verônica e Artaxerxes irão para a prisão e sem dinheiro nenhum desta operação. O contrato que vocês fizeram

com a Phoenix Gems Brasil Ltda.., bem como o acordo com a Coomigasp serão decretados nulos e sem efeito, trazendo a situação de volta para o mesmo cenário”, escreveu Brent, que confirmou por telefone as responsabilidades de Verônica e Artaxerxes pela operação. O jornal ainda não conseguiu falar com os dois para ouvir suas versões sobre os fatos.




Burlando a Constituição

O Movimento dos Trabalhadores da Mineração (MTM) afirma que tais convênios com a Coomigasp não estariam relacionados apenas à posse do “Alvará de Pesquisa nº 1.485”, mas também a uma maneira de aparentemente contemplar a Constituição Federal Brasileira, a qual assegura, em seus Artigo 17, 21 e 174, “que as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida

ao concessionário a propriedade do produto da lavra”; competindo à União “estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa”; além do que, “como agente

normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento”; bem como “favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas,

levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros”; tendo finalmente tais cooperativas “prioridade na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando”.

Numa das últimas mensagens de Brent, no final do ano passado, enviadas para os executivos da Colossus Minerals (agora incluindo Ari Sussman, chefe executivo; e Vic Wall, seu presidente), depois de se dizer

preocupado com “a maneira irregular como foi feita a negociação” e “sensibilizado” com relação ao “povo de Serra Pelada sofrendo por tanto tempo”, Brent estabeleceu um preço para os executivos da Colossus: “(...) saibam que eu não vou aceitar nada inferior a USD 10.000.000,00 e 1% líquido dos royalties. Isso tudo para eu permitir que continue a ser válido o contrato, assim que eu for reintegrado à Phoenix Gems Brasil Ltda..”. (A tradução dos e-mails foi providenciada pelo próprio sindicato e revisada pelo jornal – a íntegra em inglês pode ser conferida em nosso site).

Perguntado sobre a veracidade destas informações, Brent confirmou que teria pedido este valor e que os executivos da Colossus teriam sugerido que ele levasse adiante suas reivindicações entrando na justiça brasileira. Brent ainda disse ao jornal que, agora, pretende reivindicar 30% dos royalties da negociação e repassá-los integralmente para a cooperativa dos garimpeiros.

O jornal tentou localizar os executivos Eric Roblin, Ari Sussman e Vic Wall, mas estes não se encontravam nos seus contatos disponíveis na internet.

As mensagens de Brent para a Colossus, no entanto, trariam à tona muito mais coisas do que ele próprio também poderia imaginar...




Pós-privatização da Vale

As negociações sobre Serra Pelada remontam a 1990, quando o ex-deputado Sebastião Curió teve um encontro em Brasília com o então homem forte do presidente Fernando Collor de Mello, Paulo César Farias (PC). Naquele momento, já estavam em pauta negócios e parcerias muito semelhantes àqueles que hoje lemos no dossiê-denúncia. Ali Curió teria recusado, e Collor, em resposta, teria tombado Serra Pelada e a “devolvido” para a Vale.

Com a posterior privatização da Vale, nova proposta de parceria é consumada em 5 de junho de 2004. Sob influência do mesmo Curió – e de um de seus homens de confiança à época, Josimar Elizio Barbosa, então presidente da cooperativa –, a Coomigasp teria concretizado um convênio com a empresa de mineração Phoenix Gems do Brasil Ltda., representante da sua homônima estadunidense. Segundo reportagem

de Elvira Lobato publicada na Folha de S. Paulo (4/7/ 2004): “A Phoenix se comprometeu a entregar 40 milhões de dólares aos garimpeiros, a título de empréstimo, até 31 de julho, e a doar 200 milhões de

dólares assim que a cooperativa obtiver do DNPM (Departamento Nacional da Produção Mineral) a concessão dos direitos minerais na área. Se conseguir a concessão, a cooperativa ficará com o direito minerário sobre Serra Pelada, mas a exploração será feita, com o uso de máquinas, pela empresa americana. (...) Pelo acordo, válido por tempo indeterminado, a cooperativa terá 40% da produção que vier a ser obtida pela Phoenix dentro dos 100 hectares que foram definidos como área garimpeira pelo Congresso Nacional em 1984”.

A possibilidade de tal convênio, no fundo, só teria sido criada, de acordo com Raimundo Benigno, graças à conquistas políticas anteriores dos garimpeiros com a eleição do “presidente Lula, que em campanha prometeu devolver Serra Pelada para os garimpeiros (…)” e, sobretudo, “a contribuição do senador Edison Lobão nas questões de defesa dos garimpeiros de Serra Pelada (…) Foi ele, enquanto presidente do Senado,

que sancionou a Lei que devolve os 100 hectares para a Coomigasp”. O dossiê refere-se a um decreto legislativo de setembro de 2002, assinado pelo então presidente do Senado e presidente da República em exercício, Edison Lobão, relacionado a estes 100 hectares “devolvidos” da Vale do Rio Doce aos garimpeiros

pela União, sobre os quais recai grande parte dos interesses em jogo.

De acordo com Etevaldo Arantes (um dos coordenadores do MTM), tal “devolução” teria ocorrido também graças a uma das raras ações vitoriosas contra o processo de privatização da Vale do Rio Doce, que preservou importantes trechos de Serra Pelada nas mãos dos garimpeiros. Segundo moradores de Serra Pelada, a aliança entre Phoenix e Coomigasp, de 2004, previa uma quantia razoável em dinheiro, e um plano habitacional para os cerca de 5 mil moradores miseráveis da vila, até para garantir o remanejamento de seus barracos de cima de uma das áreas provavelmente repletas de ouro e de outros minerais. Até hoje esse plano

não foi cumprido. Assim como não teria prosperado esse convênio entre Phoenix e Coomigasp (2004), devido a uma série de entraves técnicos, políticos e jurídicos – em especial à resistência dos trabalhadores

da mineração, além de entraves junto ao Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM).

Para o Singasp, “(...) o apoio da equipe do prof. [Claudio] Scliar [do Ministério de Minas e Energia] foi fundamental para que as denúncias fossem acatadas e reconhecesse a ilegalidade do contrato”. Mas o

documento teria permanecido juridicamente em vigor, sobrevivendo, portanto o vínculo formal entre a cooperativa – detentora dos direitos do “Alvará de Pesquisa” – e a Phoenix Gems. É nesse momento que teria

entrado em campo, no lugar do antigo presidente Josimar Barbosa, a figura de Valdemar Pereira Falcão (Valder Falcão), que logo se acumpliciou com a Colossus Minerals e seus representantes no Brasil.

O dossiê afirma que “Valder Falcão assumiu a presidência da Coomigasp prometendo ficar na estória do garimpo de Serra Pelada, antes de ser eleito, garantia trabalhar em benefícios dos garimpeiros. No entanto,

fez exatamente o inverso. (…) Valder Falcão e o Dr. Jairo [Pereira Leite, advogado da Coomigasp] preferiram se aventurar na busca de empresa de mineração que viesse beneficiar a sua diretoria em detrimento aos milhares de associados. Quando o geólogo Persio Mandetta que trabalhou vários anos para a CVRD, apareceu em Serra Pelada, dizendo-se representante de várias empresas de mineração, imediatamente,

Valder Falcão e Dr. Jairo se afastam do sindicato [e] de outras cooperativas que não aceitaram as propostas

do senhor Persio Mandetta e iniciaram contatos entre a Colossus e a Proenix Gems”. Tanto Raimundo Benigno, do Singasp, como Etevaldo Arantes, do MTM, afirmam ter recusado propostas milionárias de suborno à época. Ambos afi rmam também estarem sendo ameaçados de morte por não terem compactuado com o

acordo. O sindicato ainda alega que a eleição de Valdemar Falcão também teve irregularidades estatutárias: entre outras, a ausência de voto secreto.

Paralelamente a isso, sempre segundo o relatório, o convênio entre Phoenix e Colossus teria sido firmado dias antes da assembleia da cooperativa. Uma Assembleia Geral Extraordinária (cuja ata está anexada ao dossiê) que deveria definir a escolha do conveniado, dentre as várias opções de possíveis parceiros. Entretanto o convênio

paralelo entre as duas empresas já previa em seu texto: “Considerando que a Colossus tem mantido entendimentos com a diretoria da Coomigasp (…) para a celebração de contrato que permita à Colossus realizar a exploração e possível explotação de minério de ouro e demais minérios, na área do Processo DNPM nº 850.425/1990 (…); Considerando as dificuldades enfrentadas pela Phoenix para o cumprimento de tal

contrato [com a Coomigasp, de junho de 2004] (…); resolvem as partes celebrar o presente Contrato de Parceria”. Este documento teria sido firmado no dia 28 de junho de 2007, enquanto a assembleia, que em

tese deveria decidir sobre o assunto, teria sido realizada apenas no dia 8 de julho.




Esquema Colossal

O dossiê concentra suas principais denúncias exatamente nesse processo de concepção, elaboração e, segundo ele, consumação fraudulenta do convênio entre a Colossus Geologia e Participações Ltda. e a Coomigasp. Segundo o Singasp, o senhor Valdemar Pereira Falcão, além de eleito irregularmente, teria coordenado a negociação do convênio. Ademais, teria havido substituição dos termos contratuais entre a proposta “apresentada” na Assembleia Geral Estatutária e o texto final do contrato jurídico assinado dias depois (16 de julho de 2007). Segundo Raimundo, o lobbista da Coomigasp, Pérsio Mandetta, com a conivência dos então diretores do Conselho Fiscal e Administrativo da Cooperativa, do presidente Valder Falcão e do advogado Jairo Pereira Leite, “concretizou no contrato a diluição do patrimônio dos associados

da Coomigasp”. Benigno apresenta como uma das provas uma mensagem que teria sido enviada por Pérsio aos executivos internacionais da Colossus, na qual ele afirma que “nossa proposta é diluir a participação da Coomigasp para 25% e aumentar a da Colossus para 75% no projeto (…) nossa opinião é de manter esta participação por algum tempo, e encontrar um caminho para diluir a participação no futuro, mas não logo agora após o primeiro investimento”.

De fato, o contrato apresentado pelo dossiê possibilita esse aumento da participação da empresa canadense a, no mínimo, 75% dos rendimentos da nova joint venture criada, sob poder majoritário da Colossus. Brasil de Fato ainda não localizou Valdemar Falcão, Jairo Leite nem Pérsio Mandetta para averiguar suas versões sobre todas essas denúncias.

Para o sindicato, porém, o esquema não teria se restringido a isso. Ao longo desses cerca de dois anos, para assegurar a “permanência do grupo de Valder Falcão no poder e a legitimidade das assembleias”, a Colossus teria montado “uma estrutura para desmoralizar e aniquilar todos os adversários que fossem contra o contrato de parceria entre a Coomigasp e a Colossus”. Como provas, o dossiê elenca uma série de e-mails trocados por funcionários da Colossus (pedindo o pagamento de propinas a garimpeiros) e por Toni Duarte,

presidente da Agasp Brasil, com executivos da Colossus, pedindo o depósito de pagamentos em sua conta pessoal; supostos balancetes da Colossus Engenharia (com previsões de pagamentos de propinas, entre outros, para Gessé Simão – que se transformaria no novo presidente da Coomigasp; [Raimundo] Xinguara,

que está sendo lançado candidato à presidência do Singasp contra Benigno; Toni Duarte, da Agasp Brasil, que alimenta o blog; uma série de vereadores e políticos de Curionópolis e região; e inclusive Hélio Ikeda, geólogo que participou da elaboração de um relatório de impacto ambiental para a Secretaria do Meio Ambiente do Pará; boleto de transferência bancária da Colossus para a viação Transbrasiliana, às vésperas

da chegada de uma comitiva de garimpeiros do Maranhão para Serra Pelada, com o intuito de dar suporte político ao grupo numa das novas assembleias; notas fiscais de intervenções publicitárias em redes da região, entre outros materiais que precisam ser averiguados pelo Poder Público.

O Brasil de Fato localizou Adelson Torido dos Reis, funcionário da Colossus, o qual negou qualquer pagamento da empresa para garimpeiros, ou para o jornalista Toni Duarte (como alega o dossiê). Heleno

Costa, executivo da Colossus, não foi localizado, e os funcionários da empresa alegaram que ele está viajando.

Os garimpeiros Gessé Simão, Raimundo Xinguara e o geólogo Hélio Ikeda também não foram encontrados ainda pela nossa reportagem.




Esclarecer assassinato

O sindicato, num documento intitulado “Serra Pelada: até quando o governo vai ficar alheio?”, ainda cobra explicações sobre “o assassinato de Josimar Elizio Barbosa, que através da justiça anulou a assembleia que elegeu Valdemar Pereira Falcão e ia assumir a direção da entidade quando foi assassinado”, no início de

maio de 2008, dias antes de sua nova posse.

Finalmente, o relatório critica também as decisões judiciais proferidas pela desembargadora do Estado do Pará, Maria Rita Lima Xavier, que acolheu o “mandado de segurança nº 2008.3.000000-5, impetrado

por Valdemar Pereira Falcão”, o qual teria pedido a intervenção na Coomigasp (em suas novas eleições) dias antes de nova assembleia, remarcada para dia 21 de setembro de 2008. A desembargadora teria acolhido o pedido no dia 19 de setembro e, como forma de resolver o impasse, teria criado uma “comissão interventora”,

indicando, da parte dos garimpeiros, para dar apoio à Comissão, apenas e tão exatamente os três cidadãos que estariam na lista de propinas da Colossus: “os srs. Raimundo Nonato Diniz, garimpeiro, indicado pela Abasp [conhecido como Xinguara]; Tony Duarte, presidente da Agasp Brasil, e Gessé Simão, presidente da Freddigasp”. Todos eles favoráveis ao convênio com a Colossus. Para presidência da comissão interventora,

“acolhendo indicação feita pelo exmo. sr. Ministro de Minas e Energia, sr. Edison Lobão”, a desembargadora

nomeou o coronel Guilherme Baptista Ventura.

Diz o relatório que todos os protestos oficiados pelo sindicato junto ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva; ao ministro de Minas e Energia, Edison Lobão; e à governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, denunciando “a ilegalidade da comissão interventora” e solicitando “a criação de um grupo de trabalho, em conformidade

com a Lei nº 7.559/87”, não foram acolhidos nem levados adiante.

Guilherme Ventura e a comissão interventora por ele encabeçada teriam continuado à frente do processo interventor até fins de janeiro de 2009, determinando a transferência da sede da Coomigasp de Serra Pelada para o centro de Curionópolis, e realizando uma nova assembleia de exceção (novamente contestada pelo relatório), segundo o dossiê para ratificar a eleição do grupo de Gessé Simão e companhia, vinculados à Colossus. Gessé e seu grupo não teriam tomado posse ainda, seguindo o conselho do ministro Lobão, para aguardar o devido registro em cartório da ata da comissão interventora, sob as responsabilidades do Coronel Ventura. Tais informações são do blog da Agasp Brasil. Um garimpeiro, entrevistado pelo Brasil de Fato – o qual no entanto preferiu não se identificar –, resume o sentimento de muita gente de Serra Pelada: “demoramos tanto tempo para tirar um coronel [Curió], aí eles vêm e já colocam outro [Ventura]”.




Amigo Ventura

Conhecido no Maranhão como “Coronel-Babaçu” (pela sua atuação linha-dura “contra a bandidagem”), Guilherme Ventura é historicamente ligado à família Sarney, e também um homem de confiança de Lobão no sul do Estado, tendo sido seu Secretário de Segurança Pública quando este foi governador. Brasil de Fato apurou que, entre outras denúncias, pesam no histórico de Ventura acusações de ter sido um dos principais perseguidores de camponeses no Maranhão (entre eles, Manoel da Conceição, histórico militante das Ligas Camponesas e fundador do PT), além de, segundo a revista Istoé (edição nº 1.628), ter ajudado Lobão a encobrir o assassinato de Ezir Junior, supostamente cometido por dois aliados políticos seus na região

de Imperatriz (MA), reduto de muitos garimpeiros oriundos de Serra Pelada e de muitos votos para Lobão: “‘Hassan só está livre por causa das amizades com políticos, como Lobão, e juízes, como o presidente do

TJ’, comenta Ezir de Souza Leite, pai de Ezir Júnior. ‘Existe uma rede de proteção a Hassan. Lobão é muito influente na Justiça do Maranhão’, afirma o deputado federal Sebastião Madeira (PSDB-MA). (...) Raimundo Cutrim começou a vazar informações confidenciais sobre o caso e seus envolvidos para o ex-secretário de Segurança Pública no governo Lobão, coronel Guilherme Ventura. Com muitos negócios em Imperatriz, onde preside o Sindicato Rural, Ventura passou a se empenhar para salvar a pele dos acusados, entre eles Francisco Machado Portela, o Dourado, apontado como agenciador dos sequestradores e braço direito de Hassan. Numa das conversas com Dourado, Ventura revelou seu trunfo: ‘Falei com o Lobão e a coisa está resolvida. Inclusive o Hassan estava junto. Não posso falar mais por telefone, mas pode ficar despreocupado’ ”, relata a revista.

As coincidências locais, suscitadas pelo caso de Serra Pelada, entretanto não parariam por aí. Nessa região maranhense e mesmo no vizinho Pará, muitas pessoas apelidaram de “Estado do Lobão” o projeto legislativo, de autoria do mesmo, para a criação de um novo Estado Federativo na região, o













Lobão & Lobão,

tal pai, tal filho







Um dos acusados neste escândalo de Serra Pelada, envolvendo negociatas internacionais, privatização da Vale do Rio Doce, fraude da Constituição brasileira, assassinato de dirigente sindical e outras “tenebrosas

transações”, é o jornalista Antonio Carvalho Duarte (Toni Duarte), presidente da Agasp Brasil, que alimenta o blog www.agaspbrasil.blogspot.com.

Duarte é um dos grandes articuladores do grupo político que teria passado a comandar a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp); é um dos responsáveis por aprofundar o convênio

com o grupo canadense Colossus, e mantém uma sala no Gabinete do senador Edison Lobão Filho.

No dossiê-denúncia, consta cópia da troca de e-mails entre Duarte e executivos de uma das empresas do grupo canadense Colossus, pedindo depósito de pagamentos em sua conta bancária pessoal. De acordo com as trocas de mensagens, Toni Duarte teria utilizado um email do Senado Federal para pedir ao executivo da Colossus, Heleno Costa, cerca de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para uma viagem com sua esposa no final do ano. No e-mail, datado de quarta-feira, 17 de dezembro de 2008, às 14h41, Toni solicita: “Caro amigo Heleno, estou saindo de cena na próxima semana. Vamos passar o Natal e Ano Novo fora de Brasília. Acho que merecemos isso depois de um ano inteiro de lutas. Para que isso ocorra, preciso urgentemente de 10 mil

reais. Peço o seu empenho neste pedido”.

Duarte já trabalhava com o então senador Edison Lobão, atual ministro de Minas e Energia – indicado para o

cargo pelo atual presidente do Senado, seu conterrâneo e aliado político José Sarney (PMDB-MA). Tentamos

contatar o ministro para dar seus esclarecimentos sobre o caso. Não tivemos sucesso.

Raimundo Benigno, presidente do Sindicato dos Garimpeiros de Serra Pelada (Singasp) e compilador do relatório-denúncia entregue ao Brasil de Fato reconhece “todo o esforço de Edison Lobão, desde quando

era Senador, junto à então Ministra Dilma, na luta pelos direitos dos garimpeiros”. Benigno diz acreditar

que “o ministro, pela sua trajetória junto aos garimpeiros, assim que souber das denúncias de irregularidades

reunidas por nós, do Singasp, certamente vai tomar providências e rever todo o processo fraudulento”, tomando as devidas atitudes contra todos os envolvidos, inclusive Toni Duarte.

Já Etevaldo Arantes, mais cético, não acredita em medidas vindas de Lobão. “O Toni Duarte e seu grupo

agem de dentro do gabinete do senador, com seu conhecimento e sob sua orientação”. Etevaldo, que é um dos fundadores do PT na região (partido ao qual continua filiado), acredita que “apenas a mobilização popular dos garimpeiros, junto a outros movimentos sociais, e a sensibilização de figuras como o Lula poderão garantir os direitos de nós, que sempre trabalhamos por aqui, mas nunca ficamos com as riquezas por nós produzidas”.

Ambos contestam o recente processo do convênio Coomigasp-Colossus. No entanto, o blog de Toni Duarte

revela que as suas notas e declarações muitas vezes se confundem (ou parecem se confundir) com as dadas por Lobão Pai e por Lobão Filho. Em duas dessas notas mais recentes, aparecem a confluência e afi nação dos

discursos de Lobão e Toni.




Discurso afinado

Em 8 de fevereiro de 2009, Duarte relata a reunião da nova diretoria “eleita” para a Coomigasp com o Ministro: “O presidente eleito da Coomigasp, Gessé Simão, no encontro que terminou ainda pouco no Ministério de Minas e Energia, conseguiu do Ministro Edison Lobão a garantia de liberar o tão sonhado

alvará de lavra em cinco minutos, desde de que a cooperativa conclua logo as pesquisas geológicas. Gessé também disse que a sua gestão fará de tudo para concluir o processo de sondagens que foi duramente interrompido por mais de sete meses. Ele pediu ajuda ao ministro para que seja retirado da área dos 100 hectares um grupo de sem-terra que vem causando problema para a cooperativa dos garimpeiros. Entendimento neste sentido será feito pelo ministro Lobão diretamente com o ministro da Secretaria-geral da Presidência da República, Luiz Dulci. A questão da conta paládio também foi debatida. O ministro disse que até agora não havia sido resolvida essa questão por indefinição jurídica da diretoria da cooperativa. Mas que agora tudo estava na legalidade e que a Caixa Econômica não tem nenhuma razão para não devolver aquilo que é dos garimpeiros. Ele falou que apenas tem que se tomar muito cuidado para que esse dinheiro não vá parar nas mãos de alguns que entraram na justiça com olho nessa quantia. O ministro parabenizou Gessé Simão pela grande vitória obtida nas ultima eleições”.

No dia seguinte, 9 de fevereiro, Toni Duarte posta um vídeo do próprio senador Edison Lobão declarando: “eu estou agora na esperança de que todas aquelas dificuldades que nós tivemos que enfrentar no passado tenham desaparecido com a eleição de Gessé e seus companheiros para a presidência da Cooperativa de Serra Pelada (...) Sobre a questão do paládio [conta na CEF, com recursos de sobras históricas do garimpo], até hoje não se resolveu por conta exatamente desta indefinição na direção da cooperativa da Serra Pelada, a indefinição que agora desaparece com a eleição da nova diretoria e a maneira como ela foi feita. Creio que a Caixa Econômica não terá mais razões para não liberar os recursos dos garimpeiros”.




No gabinete de Lobão

O jornalista Toni Duarte tem ainda hoje uma sala e telefone no gabinete do senador Lobão Filho, e lá trabalha desde o mandato do atual ministro Edison Lobão. Segundo uma das funcionárias do gabinete, Duarte “é a parte mais de jornalismo (…), ele é envolvido com o pessoal dos garimpeiros (…), ele é assessor, mas cuida mais dessa parte de televisão do senador”.

No início de 2009, Lobão Filho declarou seu apoio a Gessé Simão para a sucessão da Coomigasp: “ele tem

preparo intelectual e moral para conduzir a cooperativa, além de ser um grande líder”, afirmou ao blog da

Agasp. Nosso jornal ainda não conseguiu falar com o senador, e foi informado pelo gabinete que Toni Duarte

está viajando. (JCC)

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